O cardeal D. António Marto, bispo da diocese de Leiria-Fátima, em entrevista ao portal católico espanhol Religión Digital, referiu que, em tempos de pandemia, sente "muita falta do relacionamento direto com as pessoas. Pela Internet e pela televisão, sigo a vida do mundo e da Igreja".

Sobre o medo associado ao novo coronavírus, António Marto disse que é "uma coisa muito humana diante do perigo iminente e ameaçador, especialmente quando enfrentamos com tanta severidade o medo de uma morte inesperada, a nossa, a dos nossos entes queridos e a de tantas outras. A fé dá-nos a confiança de não sermos vencidos ou paralisados ​​pelo medo, de enfrentar o perigo com esperança".

A 25 de março, o cardeal presidiu em Fátima, à celebração da consagração de Portugal e de Espanha ao Sagrado Coração de Jesus e ao Imaculado Coração de Maria. Sobre este momento, D. António Marto frisou que todo o significado está expresso numa frase do Papa Francisco: "Queremos responder à pandemia do vírus com a universalidade da oração, compaixão e ternura".

"O objetivo da oração de consagração ao Coração de Jesus e Maria, sua mãe e nossa, era confiar à misericórdia divina, neste momento dramático, as nossas tristezas e gritos de dor do mundo", reforçou.

Questionado sobre o facto de alguns membros da Igreja considerarem o coronavírus como um "castigo de Deus", o bispo de Leiria-Fátima o comportamento como não sendo cristão.

"Felizmente não ouvimos esta expressão aqui entre nós, em Portugal, pelo menos publicamente. Isto não é cristão. Só o dizem aqueles que não têm nas suas mentes ou corações a verdadeira imagem de Deus Amor e Misericórdia revelada em Cristo, por ignorância, fanatismo sectário [que advém de uma seita] ou loucura", respondeu.

No que diz respeito à pandemia, o cardeal considerou que esta "mostra como um vírus invisível, silencioso e imprevisível sacudiu o mundo inteiro", apesar de "todas as certezas e a segurança de um mundo que se acreditava cada vez mais auto-suficiente, que depositava toda a sua confiança no poder da ciência, tecnologia e economia".

"A pandemia deixa clara a fragilidade e a vulnerabilidade da condição humana, consciencializou-nos de que somos vulneráveis e que somos chamados a apoiar mais, porque nesta crise ninguém se salva sozinho, como recordou o Papa Francisco. Colocou a nossa consciência à prova ao nível pessoal, quanto ao significado e estilo de vida, e ao nível social de uma sociedade mais justa, solidária e atenta à sociedade ecológica integral", referiu.

Sobre as adaptações que a Igreja Católica tem feito nestes tempos, nomeadamente quanto aos sacramentos, António Marto admitiu não ter "objeções à confissão por videoconferência". Contudo, diz que tal não é necessário. "O Papa já mencionou que o Catecismo da Igreja Católica prevê situações nas quais é possível 'confessar' diretamente a Deus com arrependimento e pedido de perdão e com o objetivo de celebrar a confissão sacramental, sempre que possível [num momento posterior]".

O cardeal falou ainda sobre as críticas de afastamento dos padres face aos fiéis. "Os padres devem respeitar o confinamento como cidadãos responsáveis, para não contagiar outras pessoas ou ser infectados", reforçou. Contudo, foi isto que "deu origem a que muitos padres tivessem um novo desejo de evangelização, preocupação e proximidade pastoral por meio de redes sociais e comunicação digital", oferecendo "uma rica variedade de mensagens, orações e meditações familiares", sendo esta uma forma "de exercer o ministério pastoral e de estar próximo das pessoas nesta jornada pelo deserto".

Por fim, D. António considerou que a situação de pandemia mundial é uma "oportunidade" para a "conversão pastoral", ou seja, uma forma de a Igreja ser vista "como um hospital de campanha samaritano misericordioso", uma Igreja "do diálogo, do encontro entre todos, da fraternidade universal e da paz".

"Será uma Igreja que continuará a dar sentido à vida, algo tão necessário para este período de desorientação, falta de referências consistentes e credíveis em vários níveis", rematou.

Portugal regista 599 mortos associados à covid-19 em 18.091 casos confirmados de infeção, segundo o boletim diário da Direção-Geral da Saúde (DGS) sobre a pandemia.

A nível global, a pandemia de covid-19 já provocou quase 127 mil mortos e infetou mais de dois milhões de pessoas em 193 países e territórios. Mais de 428 mil doentes foram considerados curados.