Quarta-feira, 14 horas e 40 minutos no centro de Londres, capital do Reino Unido. À porta do parlamento britânico, enquanto lá dentro os deputados discutiam alterações à lei das pensões, um homem atropela dezenas de pessoas na ponte de Westminster, sobre o rio Tamisa, deixa o carro e esfaqueia um polícia à entrada do parlamento inglês, antes de ser morto pelas autoridades.
Adrian Russell Ajao, é esse o nome do alegado autor dos ataques na passada quarta-feira (22/03) em Londres. Depois de ter sido identificado como Khalid Masood, as autoridades britânicas revelaram esta sexta-feira em comunicado o nome de nascimento do homem de 52 anos, que se terá convertido ao Islão em data incerta.
A agência noticiosa do Estado Islâmico (ISIS), Amaq, chamou a si alguma responsabilidade pelo ataque. Todavia, nenhuma prova da ligação do grupo a Adrian Russell Ajao foi apresentada. Ao contrário da prática comum dos atacantes fiéis ao Estado Islâmico, não surgiu ainda nenhum vídeo que mostre Adrian a assumir lealdade ao grupo do Médio Oriente.
Para além disso, Khalid Masood, nascido Adrian Russell Ajao em Dartford, condado de Kent, no sudeste de Inglaterra, diverge do perfil habitual: Adrian Russell Ajao tinha 52 anos - nasceu no dia de natal de 1964 -, quase o dobro de outros autores de ataques recentes, como explica o ‘The Guardian’.
Em Paris, há dois anos, sete dos oito atacantes conhecidos estavam na casa dos 20 anos. Apenas um tinha 31 anos. Em Nice, o condutor do camião tinha 31 anos. O de Berlim, tinha 24 anos.
A primeira-ministra britânica e a polícia do Reino Unido acreditam que o autor do ataque agiu sozinho e que foi “inspirado pelo terrorismo internacional”.
A secretária de Estado para os Assuntos Internos, Amber Rudd, tem dúvidas sobre a responsabilidade do ISIS. “Todos conhecemos o Daesh [ISIS], todos sabemos que eles querem levar a cabo um ataque terrorista no Reino Unido. Sabemos que o Daesh tentou reivindicar alguma responsabilidade. Ainda não sabemos se é isso, mas aquilo que já sabemos é que eles querem explorar [o ataque], amedrontando as pessoas e dizendo que foi tudo obra deles. Vamos ver”, disse à emissora pública britânica BBC, citada pelo ‘The Times’.
O canal americano NBC falou com Charlie Winter, investigador do Centro Internacional para o Estudo da Radicalização e Violência Política, com sede em Londres, que diz haver uma “distinção muito importante” nos termos usados na reivindicação: a agência enquadra o ataque como tendo sido inspirado, não comandado, pelo ISIS.
O que é que já se sabe sobre Adrian?
Há poucas certezas, mas um enorme rol de suposições tem vindo a ser dado pela imprensa internacional, que se baseia em currículos e testemunhos de vizinhos e ex-colegas de alegados pseudónimos de Adrian Russell Ajao. Khalid Masood é um desses pseudónimos.
Theresa May, primeira-ministra do Reino Unido, disse que o atacante fora investigado, há alguns anos, pelos serviços secretos britânicos, em suspeitas relacionadas com violência extremista.
O que a polícia londrina já revelou em comunicado, ontem à tarde, foi que Adrian nasceu no condado de Kent. Os investigadores, pode ler-se no comunicado, acreditam que o suspeito vivia nos últimos tempos na região das Midlands ocidentais.
Russell/Masood “não era alvo de nenhuma investigação ativa e não havia informações anteriores das suas intenções de montar um ataque terrorista”, diz a Scotland Yard. “Todavia”, prossegue o documento, “[Adrian] era conhecido pela polícia e tinha um leque de condenações anteriores por agressões, incluindo GBH [grievous bodily harm, termo da lei britânica que significa ferir com intenção], posse de armas ofensivas e distúrbios à ordem pública.”
A primeira vez que Masood foi condenado tinha 18 anos, em novembro de 1983, por danos criminais; a última foi aos 39 anos, em 2003, por posse de uma arma branca. No entanto, sublinha o comunicado das autoridades britânicas, “não foi condenado por quaisquer crimes de terrorismo.”
O canal de informação britânico Sky News diz ter falado com uma fonte que conheceu Khalid Masood profissionalmente. “A fonte descreveu Masood como ‘um tipo grande’, acrescentando: ‘ele parecia ser um bodybuilder, não te querias meter com ele”’.
Já o jornal britânico The Telegraph, liga a discriminação ao seu envolvimento no terrorismo: “Khalid Massod [...] perdeu a cabeça por causa do racismo na sua vila e esfaqueou a cara do dono de um café antes de ser radicalizado na prisão”.
Um dos únicos dois homens negros numa pequena vila britânica, Adrian Russell Ajao, filho de mãe branca e pai negro, segundo alguma imprensa internacional, seria ostracizado.
“Masood descontrolou-se em julho de 2000, esfaqueando um homem na cara depois de uma discussão que teve 'tom racista'. O ataque atirou-o para a prisão e a sua vida, já fragmentada, acabaria por desabar”, escreve ainda o The Telegraph.
Ao que parece, as discussões raciais com o dono de um pub em Northiam, Sussex, não eram novidade quando, aos 35 anos, Khalid Masood, depois de mais uma discussão, cortou os bancos do carro do dono do café. Confrontado, acenou-lhe com a faca, acabando por apanhar a cara do homem que precisou de mais de 20 pontos, diz o The Telegraph. Acabou por ficar preso durante dois anos.
“Noutro ataque, três anos depois, esfaqueou um homem no nariz antes de, alegadamente, viajar para a Arábia Saudita”, diz a mesma fonte. Voltou à cadeia para mais seis meses por posse de arma perigosa.
Em 2005, já fora da prisão, o homem foi trabalhar para a Arábia Saudita, onde dava aulas aos trabalhadores da Autoridade Geral de Aviação Civil em Jeddah, segundo o tabloide britânico The Sun, que alegadamente teve acesso ao currículo profissional do suspeito.
Nesse documento, diz o The Telegraph, Adrian dizia ter formação em economia. Em 2004, ano em que casou com uma mulher muçulmana, Adrian Russell Ajao terá obtido um certificado que o deixava apto a ensinar inglês a estrangeiros. Já em 2009, o homem ter-se-á juntado a uma escola de inglês em Luton, no sul de Inglaterra, como “professor sénior de inglês”.
O Independent cita os vizinhos de Khalid para o descrever como “o modelo de vizinho suburbano”. Recatado, lavava o carro, aparava a relva, dava dicas de futebol às crianças do bairro. “Ele era um homem amigável, normal”, diz um dos vizinhos.
Outros dos muitos vizinhos descreve ao The Guardian um homem “muito calmo”. Calmo, mas a mudar de casa com frequência. Casas que estão agora a ser alvo de buscas pelas autoridades britânicas.
Na noite anterior ao ataque em Londres, Adrian terá dormido no quarto número 228 de um hotel barato a cerca de 80 quilómetros de Westminster, segundo o tabloide britânico The Sun, que mostra imagens do quarto, já alvo de buscas pela polícia. O carro usado, um SUV da Hyundai, era alugado.
Ainda ao The Guardian, Shashank Joshi, investigador associado do grupo de pensamento sobre segurança Royal United Services Institute, disse que “sempre soubemos que é excecionalmente difícil perceber quem se vai tornar num terrorista. Masood é invulgar porque apenas uma minoria se radicaliza depois dos 30 anos. O seu cadastro não surpreende, já que alguns estudos mostram que uma porção significativa dos jihadistas têm condenações anteriores.”
Jihadista, lobo solitário, vítima de racismo - vários podem ser os quadros em que Adrian Russell Ajao, ou Khalid Masood, se encaixa. As teorias abundam e as certezas escasseiam. Certo é que pelo menos 50 pessoas foram feridas e cinco pessoas morreram, incluindo um polícia desarmado e o atacante, um britânico de 52 anos.
Comentários