“Não é verdade que é só uma lista de nomes”, afirmou o membro da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica Portuguesa, esclarecendo: “A lista foi obtida a partir das denúncias de vítimas – em que a vítima X diz que foi abusada pelo padre Y – e da investigação resultante do Grupo de Investigação Histórica junto dos arquivos. E a lista que foi entregue resulta da junção destas duas”.
Em declarações à Lusa, Daniel Sampaio enfatizou que houve um trabalho realizado ao longo ao último ano em todas as dioceses com os bispos e que “cada nome é do conhecimento das dioceses”, uma vez que o grupo de investigação histórica já confrontou os bispos com os registos, adiantando até que “já há bispos a trabalhar no assunto”.
“Quando o cardeal-patriarca diz que a Igreja não tem dados não é verdade”, afirmou o psiquiatra, que sublinhou: “Não é uma lista de nomes que caiu do céu”.
No domingo, o cardeal-patriarca de Lisboa, Manuel Clemente, declarou que a Igreja poderia atuar se tivesse factos para juntar aos nomes que constam da lista apresentada.
“Aquilo que nos foi entregue pela Comissão Independente foi uma lista de nomes. Se essa lista de nomes for preenchida por factos, tanto nós como as autoridades civis podemos atuar”, disse Manuel Clemente.
Apesar de notar que a Comissão Independente não era uma comissão de investigação, Daniel Sampaio lamentou a reação de sexta-feira da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) ao relatório divulgado em fevereiro pela Comissão Independente, na qual os bispos recusaram comprometer-se com o afastamento imediato dos padres identificados como abusadores.
“Fiquei dececionado, mas não inquieto, porque o relatório teve um enorme impacto. Temos de distinguir os bispos da Igreja em si. Há muitos movimentos católicos a manifestarem-se e a situação não vai parar. Criou-se uma dinâmica de discussão, este é só um atrasar do problema”, disse.
Questionado ainda sobre a recusa de uma suspensão preventiva dos padres denunciados pelas vítimas que deram o seu testemunho sobre os abusos sexuais sofridos, num trabalho que abrangeu a realidade portuguesa desde 1950, o psiquiatra justificou que a suspensão não é sinónimo de condenação, mas pode ser essencial do ponto de vista clínico.
“A suspensão não é uma condenação. É importante suspender porque, do ponto de vista psiquiátrico, há grandes probabilidades de estas pessoas repetirem o comportamento. A suspensão é preventiva para averiguação e se não se averiguar nada, retoma”, observou, concluindo: “Não me parece legítimo que uma pessoa que esteja sob suspeita possa continuar a exercer o seu ministério”.
A Comissão Independente para o estudo dos abusos sexuais de crianças na Igreja Católica validou 512 testemunhos, apontando, por extrapolação, para pelo menos 4.815 vítimas. Vinte e cinco casos foram enviados ao Ministério Público, que abriu 15 inquéritos, dos quais nove foram arquivados.
A comissão entregou à Conferência Episcopal Portuguesa uma lista de alegados abusadores, alguns no ativo, tendo esta remetido para as dioceses a decisão de afastamento de padres suspeitos de abusos e rejeitado atribuir indemnizações às vítimas.
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