A nova comissão de inquérito sobre a Caixa Geral de Depósitos (CGD), que toma posse na terça-feira, foi pedida de forma potestativa (obrigatória) pelo PSD e pelo CDS-PP e tem como objetivo apreciar a contratação, gestão e saída do anterior presidente do banco público, apesar de não haver qualquer referência direta no objeto às comunicações entre António Domingues e o ministro das Finanças, Mário Centeno.
Contactado pela agência Lusa, o constitucionalista Jorge Miranda não tem qualquer dúvida de que estas comunicações possam ser conhecidas “pelos deputados no âmbito da comissão de inquérito”.
“São comunicações no exercício de funções públicas, que afeta direta ou indiretamente o interesse público, portanto qualquer deputado tem o direito de conhecer o conteúdo dessas comunicações e de fazer o seu juízo, no âmbito do parlamento, não é fora do parlamento evidentemente”, sustentou.
Para o “pai” da Constituição, “não são comunicações privadas” porque “quando é o ministro das Finanças, no exercício das suas funções, que entra em conversa com determinada pessoa para efeito de eventual exercício de um cargo numa entidade pública como a Caixa Geral de Depósitos, não pode considerar-se uma conversa privada”.
“Se é uma conversa entre o ministro das Finanças e um parente ou um amigo acerca de qualquer assunto privado, com certeza que não porque há o direito à privacidade, à intimidade da vida privada. Agora se é o ministro das Finanças, no exercício dessas funções, que tenha esse tipo de conversas eu não vejo qualquer violação de um direito fundamental, o que faz com que possam ser objeto de inquérito”, justificou.
Por outro lado, o constitucionalista Bacelar Gouveia considerou que o “acesso às comunicações de SMS supostamente trocadas entre o ministro das Finanças e o antigo presidente da CGD pode suscitar um problema de privacidade das comunicações porque a Constituição garante o sigilo das comunicações privadas”.
“Aqui privadas é em dois sentidos: comunicações pessoa a pessoa e através de instrumentos que não são públicos, mas privados. Não são oficiais como por exemplo seria um e-mail oficial de uma entidade a uma outra entidade”, sublinhou.
Na opinião de Bacelar Gouveia “a questão que se coloca é saber se essas mensagens integram ou não o conceito de comunicação privada a dois títulos: nos destinatários e no modo”.
“Também é verdade que as comissões parlamentares de inquérito têm poderes próximos das autoridades judiciárias, mas nunca terão o poder de ter acesso a mensagens que estejam protegidas pela inviolabilidade e pelo sigilo das comunicações privadas porque nesse caso só é possível ter acesso no âmbito da investigação criminal”, explicou o professor universitário.
Para Jorge Miranda, “como em relação a qualquer comissão parlamentar, a divulgação dos trabalhos depende da comissão” e o conhecimento das comunicações “para lá da comissão de inquérito, depende da própria comissão de inquérito”.
“Muitas vezes há interesse que as comissões tenham toda a publicidade e outras vezes pode suceder que os deputados entendam que não e que portanto não admitam a transmissão pública por via dos jornalistas. Isso depende essencialmente do parlamento e antes de mais nada da comissão”, explicou.
JF // ZO
Lusa/fim
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