A informação é avançada esta quinta-feira pelo Jornal de Notícias (JN) e deverá ser discutida em Conselho de Ministros durante o mês de setembro.
Em causa, diz o JN, está a necessidade de transposição para Portugal, até dezembro de 2021, de uma diretiva europeia de 2019, que prevê a proteção de pessoas que denunciem violações do direito da União Europeia.
Segundo o jornal, a ideia presente no relatório consiste na criação um diploma legal específico de proteção dos denunciantes, indo além do previsto na diretiva europeia. Desta forma, prevê-se que seja salvaguardado quem denunciar violações de direito interno português e não apenas da UE — o que tem sido já reclamado pela defesa do pirata informático Rui Pinto.
O grupo de trabalho é coordenado por Maria João Antunes, professora da Faculdade de Direito de Coimbra e ex-juíza do Tribunal Constitucional. No relatório final é sublinhada a necessidade de promover a "articulação" das regras dispersas que já existem relativas a denunciantes, com especial destaque para "o regime de proteção de testemunhas, à legislação de combate à corrupção, branqueamento de capitais e terrorismo, bem como ao código dos valores mobiliários e regime das instituições de crédito".
Outra questão abordada pelo grupo de trabalho é o incentivo e a promoção das denúncias como meio privilegiado de repressão da corrupção e crimes conexos, já que, neste tipo de criminalidade, não existe uma vítima concretamente determinada e são frequentes os pactos de silêncio (entre corruptor e corrompido), o que pode criar obstáculos à investigação.
O caso de Rui Pinto o estatuto de denunciante
O papel que o ‘hacker’ português Rui Pinto reivindica na divulgação dos negócios de Isabel dos Santos, empresária angolana e filha do ex-Presidente de Angola José Eduardo dos Santos, voltou a colocar em destaque o estatuto do denunciante.
Rui Pinto, preso preventivamente em Portugal no âmbito do caso Football Leaks, assumiu, através dos seus advogados, que entregou discos rígidos à Plataforma de Proteção de Denunciantes na África, que permitiram a recente revelação dos Luanda Leaks.
O Parlamento Europeu aprovou no ano passado uma diretiva de proteção aos denunciantes, mas a legislação ainda não foi transposta pelo Estado português.
Quando foi aprovada a diretiva europeia sobre ‘whistleblowers’?
O Parlamento Europeu aprovou por maioria, em 16 de abril de 2019, a lei para proteger denunciantes que agem em prol do interesse público na União Europeia (UE), sendo a primeira diretiva comunitária para este tipo de casos.
Naquela que é a primeira lei europeia para os ‘whistleblowers’ (em português, denunciantes), impulsionada pelas revelações do caso 'Football Leaks' e pelo papel do português Rui Pinto, o objetivo é criar um enquadramento legal de proteção uniforme em toda a UE, já que, atualmente, isso varia consoante o Estado-membro.
Rui Pinto, o único rosto conhecido até agora do 'Football Leaks', está a colaborar com Estados-membros como França, Bélgica e Holanda em investigações dos respetivos países com origem em documentos obtidos ou divulgados por esta plataforma eletrónica, lançada em setembro de 2015, e da qual o português é confesso colaborador.
O que diz a diretiva europeia sobre a proteção de denunciantes?
Esta legislação aplica-se às pessoas que pretendam alertar para eventuais violações do direito da União Europeia em vários domínios, incluindo o branqueamento de capitais, a fraude fiscal, a contratação pública, a segurança dos produtos e dos transportes, a proteção do ambiente, a saúde pública, a proteção dos consumidores e a proteção dos dados pessoais.
Os legisladores europeus introduziram uma maior flexibilidade na diretiva, permitindo que o autor da denúncia possa escolher o canal mais adequado para alertar para as violações, quer seja a nível interno (dentro da organização onde trabalha) ou externo (junto das autoridades públicas).
Além dos denunciantes, os jornalistas que divulguem as denúncias também serão protegidos.
A nova lei prevê ainda que os Estados-membros forneçam apoio jurídico, financeiro e psicológico aos denunciantes.
Uma das regras centra-se na criação de canais de comunicação internos em entidades públicas e privadas com mais de 50 funcionários, para que se possa denunciar dentro da própria organização.
Também as autoridades nacionais e europeias terão de ter canais de comunicação externos independentes.
Outra das possibilidades para os denunciantes passa a ser o recurso aos meios de comunicação social, isto em situações em que, por exemplo, não seja dada a devida atenção à sua denúncia ou haja perigo iminente para o interesse público ou risco de retaliação.
Estas formas de retaliação - como a despromoção, a suspensão ou o despedimento - passam, inclusive, a estar proibidas com a nova diretiva.
Qual é o enquadramento jurídico do estatuto de denunciante ('whistleblower') em Portugal?
Portugal, à semelhança de outros países, não prevê este estatuto. A lei portuguesa apenas regula a aplicação de medidas para proteção de testemunhas em processo penal quando a sua vida, integridade física ou psíquica, liberdade ou bens patrimoniais de valor consideravelmente elevado, sejam postos em perigo por causa do seu contributo para a prova dos factos que constituem objeto do processo.
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