O coordenador do Centro de Estudos sobre Incêndios Florestais disse à agência Lusa que existe em Portugal "um bloqueio do emprego" de produtos retardantes da ação das chamas, acrescentando desconhecer a razão de não serem utilizados.
"Era importante que pudessem ser usados por meios terrestres, para efeitos de rescaldo e para evitar reacendimentos, porque os reacendimentos quando acontecem dão origem a incêndios ainda maiores. E há muitos modos de os usar. [O uso] Pode ser feito com calma e planeamento, pelo menos no rescaldo", observou Xavier Viegas.
Os produtos retardantes e bloqueadores podem ser utilizados quer por meios aéreos, quer por meios terrestres - em viaturas de bombeiros ou mesmo em mochilas de operacionais apeados -, mas em Portugal não são utilizados há cerca de 20 anos, por razões que Xavier Viegas disse não acreditar que sejam "só financeiras".
"Não creio que seja só financeira, gasta-se dinheiro em tanta coisa. Pode ser por falta de sensibilidade, falta de perceção ou falta de estudo porque se criam mitos. Há quem diga que fazem mal ao ambiente, mas os produtos certificados têm um impacto mínimo e uma eficácia enorme", argumentou.
"É utilizado em concentrações tão baixas [misturado com água] que não seriam de modo a causar algum dano ambiental e, claramente, não é mais nocivo do que um incêndio", advogou Xavier Viegas.
Por outro lado, Xavier Viegas frisou que a utilização de retardantes e bloqueadores - produtos biodegradáveis, que se misturam em água e que aquando da sua utilização no terreno libertam hidrogénio, cortando o oxigénio e contribuindo para a extinção do foco de incêndio - permitiria "melhorar a eficácia" do combate aos incêndios.
"O que não me parece razoável é que não se use nada", sustentou Xavier Viegas.
Em abrir de 2014, há mais de quatro anos, os Bombeiros Voluntários da Figueira da Foz (BVFF) promoveram uma demonstração da utilização de um produto retardante e bloqueador numa pequena faixa de pinhal, à qual foi lançado fogo, com resultados "muito bons", recordou Lídio Lopes, presidente daquela associação humanitária e antigo responsável da Proteção Civil municipal.
De acordo com este responsável, para utilizar um produto do género, o "paradigma do combate aos incêndios em Portugal teria de mudar", já que a ação de retardantes/bloqueadores, utilizada por meios terrestres ou aéreos, "não é para usar em cima do fogo", defendeu.
"Com um produto destes, que fica no terreno vários dias, nenhuma povoação podia ficar em risco porque teria uma faixa em volta em poucas horas", ilustrou Lídio Lopes, argumentando que o uso de retardantes/bloqueadores "devia ser cirurgicamente decidida pelo comando operacional".
Explicou que o lançamento pode ser feito por meios aéreos - embora a utilização do químico pelas aeronaves anfíbias atualmente existentes em Portugal limite a atuação destas, já que o produto, por ser previamente misturado em água, obriga ao reabastecimento do avião numa pista após cada descarga - ou ser colocado no terreno por meios terrestres "à frente da linha de fogo".
"Quando a linha de fogo chega ao produto, quanto mais quente estiver, mais reação química existe e maior libertação de hidrogénio e a linha de fogo quebra", explicou.
Após a demonstração da Figueira da Foz, a que assistiram vários responsáveis operacionais, a empresa produtora do Fire Limit chegou a oferecer cerca de 10 mil litros à Autoridade Nacional de Proteção Civil, para realização de testes, que foram feitos, em 2015, por elementos da Força Especial de Bombeiros e em aeronaves Fireboss, mas Lídio Lopes lamenta que a iniciativa não tenha tido seguimento.
"Defendo há muitos anos a utilização destes produtos e tenho a garantia de que os testes realizados foram muito positivos e com resultados favoráveis para o combate", sublinhou.
A agência Lusa questionou a ANPC sobre o porquê da não utilização em Portugal de produtos retardantes e bloqueadores das chamas, nomeadamente por meios terrestres, mas, até ao momento, não obteve resposta.
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