A Câmara do Porto anunciou, na quarta-feira, na sua página oficial na Internet, que pretende compensar em cerca de 360 mil euros os comerciantes das ruas Alexandre Braga e Formosa afetados pelas obras de requalificação do mercado.
"Isto foi feito à má fila para não permitir que haja contraditório", afirmou o comerciante Mário Martins, que calcula que os prejuízos decorrentes das obras de construção do Túnel do Bolhão, que arrancaram a 20 de agosto, ultrapassem os 50%.
O responsável pela Casa das Colchas, um negócio da família instalado na Rua da Formosa desde 1983, considerou que o momento escolhido pela autarquia para anunciar o valor das compensações revela "má-fé", uma vez que já não é possível que os comerciantes se inscrevam para falar na reunião do executivo de segunda-feira, na qual vai ser votada a proposta que estabelece as compensações.
Mário Martins garante que os comerciantes nada sabiam desta proposta, nem dos valores ou critérios por detrás dos mesmos, mas, olhando para o valor anunciado, diz ser já visível que é "manifestamente insuficiente".
Também Alberto Rodrigues, proprietário de uma das lojas mais antigas do Porto - Mercearia do Bolhão -, recebeu a notícia com "surpresa", porque desconhecia a decisão e os valores propostos, que considerou "bastante insuficientes" para os prejuízos causados.
Para além disso, ninguém sabe quanto tempo é que isso vai demorar a ser pago, salientou, reiterando que o negócio "vai muito mal".
José Rodrigues, proprietário da Confeitaria do Bolhão onde trabalham 28 pessoas, e que desde o início das obras chegou a atingir um terço da sua faturação, também considera que o valor é insuficiente.
Umas portas ao lado, na Pérola do Bolhão, António Reis, que já teve de recorrer às suas poupanças para pagar aos funcionários, considerou que o valor proposto é "razoável".
"É melhor do que nada", afirmou, sublinhando que já não estava à espera de nada.
De acordo com a proposta, a que a Lusa teve acesso, no caso da Rua da Formosa foram considerados pela autarquia, no âmbito da avaliação que foi feita, 15 estabelecimentos comerciais, que no total vão receber 304 mil euros.
O estudo que foi feito pela KPMG apresenta dois cenários, tendo a estimativa por base "um período de obra estimado de 16 meses indicado pelo MP [município do Porto], entre agosto de 2019 e dezembro de 2020”.
De acordo com o documento, no primeiro cenário, para uma perda 50%, o valor a atribuir ao conjunto dos 15 comerciantes é 505 mil euros, enquanto que num segundo cenário é considerada uma perda de 30%, o que corresponde a uma compensação total de 304 mil euros.
O segundo cenário, cujo critério de compensação incidiu sobre a diminuição do resultado operacional (EBIT), foi o escolhido pelo município que, no caso dos comerciantes da rua Alexandre Braga, vai atribuir uma compensação total de 54.800 euros.
Esta estimativa resulta, segundo o estudo, do "cenário mais favorável para as entidades" e tem por base um período estimado de 23 meses, entre fevereiro de 2019 e dezembro de 2020.
Neste caso, foram considerados sete estabelecimentos comerciais, sendo que dois destes não vão receber qualquer compensação.
Em declarações à Lusa, Sérgio Silva, proprietário de um café na Rua Alexandre Braga, que está na iminência de fechar a porta, disse considerar "vergonhosa" esta compensação. No seu caso, e segundo a estudo da KPMG, vai receber 10.600 euros, quando desde fevereiro até agora registou uma diferença de cerca de 38 mil euros face à faturação do ano passado.
"É um absurdo. Nós não andamos a mendigar. Andamos a trabalhar. (…) É preciso ter coragem para estragar assim o Natal de uma pessoa", afirmou, lamentando que aos comerciantes não tenha sido dada a possibilidade de expressar a sua revolta em sede de reunião do executivo.
Sérgio Silva, que soube das indemnizações pelos jornais, admitiu que se a situação não for revista continua na iminência de encerrar portas. Para além do valor não ser suficiente para fazer face aos prejuízos, os comerciantes desconhecem quando vão receber estas verbas.
As obras de construção do Túnel do Bolhão, que arrancaram a 20 de agosto, obrigaram a alterações à circulação, que, dizem os comerciantes, mais não fez do que acrescentar prejuízos aos que já se somavam desde o início das obras de requalificação do mercado em maio de 2018.
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