Segundo o relatório da IGAI, a que a agência Lusa teve hoje acesso, os sete polícias da Esquadra de Intervenção e Fiscalização Policial (EIFP), da Divisão de Loures, “pensaram que o veículo em causa seria efetivamente” o automóvel onde estava o grupo que assaltou um multibanco, pelo método de explosão, na zona do Pragal, concelho de Almada, na madrugada de 15 de novembro do ano passado, “e que estaria de novo a tentar escapar”, quando ignorou as ordens para parar e fez marcha-atrás aos "ziguezagues" para atropelar os agentes policiais.
“Com recurso ao princípio 'in dubio pro reo' (na dúvida, absolve-se), constatou-se que quando os agentes policiais efetuaram disparos pela parte da frente e lateral do veículo com as armas de fogo que lhe estavam distribuídas, estavam em situação de manifesto e iminente perigo para as suas integridades físicas e mesmo para as suas vidas, verificando-se assim uma situação de legítima defesa, pelo que tais disparos têm de ser tidos como justificados”, refere o relatório da IGAI, nas suas conclusões, que propõe o arquivamento dos autos.
Os dois instrutores da IGAI analisaram, numa primeira fase, a atuação policial junto ao terminal 2 do Aeroporto de Lisboa, para onde o carro dos suspeitos fugiu inicialmente, e, depois, o que se passou na Rua 3, no Bairro da Encarnação, que culminou na morte de uma cidadã brasileira. Em ambos os casos, a IGAI concluiu que os polícias agiram em conformidade com as regras e os regulamentos em vigor e sempre em "legítima defesa".
A IGAI conta que nessa madrugada, pelas 02:53, ocorreu um furto de uma caixa multibanco no Pragal, Almada, alegadamente cometido por três suspeitos, que, na posse de “determinada quantia em dinheiro”, fugiram num automóvel preto, em direção a Lisboa pela Ponte 25 de Abril.
Elementos policiais de Lisboa, perderam a viatura de vista, após troca de tiros junto ao terminal 2 do aeroporto.
Pelas 03:00, e após ouvir uma comunicação rádio, com menção à cor e à marca da viatura onde seguiam os suspeitos, uma Equipa de Intervenção Rápida, da Divisão de Loures da PSP, composta por sete elementos, avistou, cerca de 35 minutos depois, na Rua 3, na Encarnação, "uma viatura de cor escura, com as luzes apagadas e com movimentos de alguém no seu interior”.
Nessa viatura estavam o condutor, que não tinha carta de condução, e a mulher que viria a ser baleada mortalmente, minutos depois.
A viatura policial caracterizada ligou então as luzes e, quando os polícias saíram apeados na direção do automóvel, que, entretanto, tinha ligado os faróis dianteiros, o condutor fez marcha-atrás e embateu num muro de uma casa. De seguida, os agentes policiais, empunhando as respetivas armas de serviço, gritaram: 'polícia pára, pára'.
“O condutor da viatura em fuga não obedeceu a essas ordens, motivo pelo qual, face a esta atitude do condutor, os elementos da PSP mais convencidos ficaram de que o veículo em causa seria efetivamente o utilizado pelos assaltantes do multibanco de Almada e que estaria de novo a escapar”, relata a IGAI.
Durante o desenrolar da situação, “o veículo ziguezagueou enquanto prosseguia a sua marcha de fuga”, em direção a cada um dos agentes policiais que se tinham posicionado na via estreita, por onde passa apenas um carro. Um dos agentes teve de saltar e os restantes tiveram de se desviar para não serem atropelados.
Os agentes policiais dispararam então, ao todo, 44 tiros, um dos quais “entrou pela parte traseira do veículo, do lado direito do mesmo, atravessou a viatura, perfurando os bancos traseiro e dianteiro direitos, atingindo Ivanice Carvalho”, que seguia no lugar do pendura.
Apesar dos danos provocados pelos disparos nos pneus do lado direito, o veículo, que se veio confirmar ser de marca diferente daquela em que seguiam os suspeitos do assalto, continuou a sua marcha, acelerou e viria a ser intercetado por outros polícias na rua da Quinta de Santa Maria, num acesso à Segunda Circular.
O relatório indica que não foi possível determinar qual dos revólveres GLOCK efetuou o disparo mortal e, consequentemente, qual polícia é que disparou.
“Efetivamente, neste momento, apenas interessa a constatação de que este veículo efetuou tentativas de atropelar cada um dos agentes que disparou, o que os colocou em situação de poderem reagir, efetuando recurso a disparo de arma de fogo, em situação de legítima defesa própria e de terceiro, legitimando o uso de arma de fogo, mesmo quanto aos disparos dirigidos à traseira desse veículo. Estamos, em conclusão, perante uma situação evidente de disparos efetuados e legítima defesa própria e de terceiros”, salienta a IGAI.
Os sete polícias vão ser, contudo, alvos de processos disciplinares internos, pois relataram no aditamento ao auto de notícia e nos relatórios de uso de arma de fogo que elaboraram e confirmaram, que o veículo onde seguia a vítima mortal fez marcha-atrás com os faróis desligados e que só os acendeu quando bateu no muro e seguiu em frente, como forma de reforçar o facto de terem suspeitado de que se trataria do veículo procurado dos assaltantes.
Contudo, a investigação da IGAI apurou que os faróis estavam ligados quando a viatura iniciou a marcha-atrás.
O relatório da IGAI já terá sido enviado ao Ministério Público para que seja junto à investigação criminal e haja uma de duas decisões: ou despacho de acusação contra os sete polícias constituídos anteriormente arguidos, ou despacho de arquivamento, como propõe a IGAI.
(Notícia atualizada às 17:47)
Comentários