Em declarações à Lusa, Rafael Marques disse que o “Luanda Leaks” ajuda a entender as ramificações e os tentáculos dos negócios da filha do ex-presidente José Eduardo dos Santos.
“Antes via-se a cabeça do polvo, mas não se viam os tentáculos. Agora foram revelados todos os tentáculos deste polvo de negociatas”, salientou.
Um Consórcio Internacional de Jornalismo de Investigação (ICIJ), que integra vários órgãos de comunicação social, entre os quais os portugueses Expresso e SIC, analisou, ao longo de vários meses, 356 gigabytes de dados relativos aos negócios de Isabel dos Santos entre 1980 e 2018, desvendando o caminho que levou a filha do ex-presidente angolano a tornar-se a mulher mais rica de África. A investigação é conhecida como “Luanda Leaks”.
Rafael Marques sublinhou que os jornalistas deram também a conhecer “quem são os facilitadores, sobretudo portugueses, “desta teia de corrupção que é o império de Isabel dos Santos”.
Uma teia que, apesar de já ser conhecida, “beneficiava de proteções das autoridades judiciais e do Banco de Portugal”, entidades que não atuaram devidamente, considerou o também jornalista.
“Isabel dos Santos e os seus facilitadores têm de ser investigados pelo Banco de Portugal e pelas autoridades judiciais”, reclamou Rafael Marques, referindo que todas as denúncias relativas a Isabel dos Santos “passaram ao lado do DCIAP [Departamento Central de Investigação e Ação Penal], apesar de ter “uma irmã que foi investigada por muito menos” (Tchizé dos Santos, por suspeitas de branqueamento de capitais).
E salientou que se, “antes Isabel dos Santos era intocável em Portugal”, face aos documentos expostos pela investigação “não há como agora a PGR justificar” e vai ter de abrir um inquérito.
“Estamos a falar de esquemas de lavagem de dinheiro que prejudicaram Angola e os angolanos e devem ser investigados com seriedade”, reforçou, acrescentando: “Já não há o ‘irritante’ [relativo ao processo judicial do ex-vice-presidente angolano, Manuel Vicente, que resultou em tensões entre a justiça portuguesa e Angola] e Isabel dos Santos já não goza de imunidade e do poder do pai”.
Rafael Marques espera também que a PGR angolana “abra um inquérito a todas estas figuras”, considerando que “há matéria mais do que suficiente” para abrir um processo-crime.
“Até agora havia um arresto de bens, mas com os documentos vindos a público revelam indícios de atividade criminal”, argumentou.
O ativista defendeu ainda que Isabel dos Santos deve regressar a Angola e enfrentar a justiça do seu país em vez de “andar a saltitar de um lado para o outro”.
“Agora dirá que há uma perseguição internacional, uma conspiração contra si, mas foi ela que conspirou contra o povo e está a pagar por isso”, comentou Rafael Marques, defendendo que a empresária “devia ser humilde e reconhecer o que fez”.
“Ainda não percebeu que acabaram os truques”, criticou, rematando que em todo o caso “neste momento, já não poderá mais andar a passear-se no exterior do país como a milionária africana”.
Durante a investigação do ICIJ foram identificadas mais de 400 empresas (e respetivas subsidiárias) a que Isabel dos Santos esteve ligada nas últimas três décadas, incluindo 155 sociedades portuguesas e 99 angolanas.
As informações recolhidas detalham, por exemplo, um esquema de ocultação montado por Isabel dos Santos na petrolífera estatal angolana Sonangol, que lhe permitiu desviar mais de 100 milhões de dólares (90 milhões de euros) para o Dubai.
Revelam ainda que, em menos de 24 horas, a conta da Sonangol no Eurobic Lisboa, banco de que Isabel dos Santos é a principal acionista, foi esvaziada e ficou com saldo negativo no dia seguinte à demissão da empresária.
Os dados divulgados expõem quatro portugueses alegadamente envolvidos nos esquemas financeiros: Paula Oliveira (administradora não-executiva da Nos e diretora de uma empresa offshore no Dubai), Mário Leite da Silva (CEO da Fidequity, empresa com sede em Lisboa detida por Isabel dos Santos e o seu marido), o advogado Jorge Brito Pereira e Sarju Raikundalia (administrador financeiro da Sonangol).
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