“O povo é quem mais ordena. Espero que a abstenção baixe e que os portugueses escolham a pensar numa solução que sirva Portugal num momento muito complexo para a Europa e para o mundo”, afirma o chefe de Estado, em resposta escrita a uma das mais de duas dezenas de perguntas que lhe foram dirigidas à distância pelos alunos da Universidade de Verão do PSD.
O ex-líder do PSD, que já participou presencialmente nesta iniciativa de formação política de jovens quadros por nove vezes, optou por responder a todas as questões que lhe foram feitas, em vez de, como habitualmente, escolher apenas duas.
Questionado se desde as eleições de 2015 - em que pela primeira vez não foi o partido mais votado que conseguiu formar Governo - Portugal ficou “democraticamente mais pobre” com esta forma de assegurar o poder, o Presidente da República respondeu que “o panorama político está em mudança constante”.
“Por isso é que é cada vez mais difícil ser-se Governo e fazer-se oposição. E, porventura, ser-se Presidente da República”, disse.
A uma outra aluna que lhe perguntou sobre o que pensava de “não ter sido respeitada a vontade do povo nas últimas legislativas”, o chefe de Estado sublinhou que, inicialmente, foi entregue a tarefa de formar Governo “à formação política mais votada, no caso, uma coligação [PSD/CDS-PP]”.
“Tendo sido rejeitado o Programa de Governo, o novo executivo, então formado, obteve apoio maioritário no parlamento para o seu programa. Uma nova fórmula de Governo, correspondendo a uma nova prática constitucional nasceu”, considerou.
Para Marcelo Rebelo de Sousa, “hoje sabe-se que há duas possíveis leituras constitucionais, uma que privilegia o debate sobre a escolha do primeiro-ministro, outra que privilegia a existência de maioria parlamentar de apoio”.
Questionado como gere a convivência com uma governação ideologicamente afastada do seu pensamento, respondeu que “o Presidente da República deve saber coexistir com diversas soluções governativas, sempre a pensar no melhor para Portugal, tal como o entende”.
Instado a comentar se é sustentável a existência de novos partidos na democracia portuguesa, o chefe de Estado aponta-a como “um desafio complexo, para os que surgem e para os que já existiam”.
“Mas a democracia faz-se dessa mutabilidade constante. E ninguém pode acreditar que a mudança é travável com o mero desejo de que ela não ocorra. Eu digo aos meus alunos: a mudança é uma grande constante destes tempos e quem não sabe antecipá-la pode sofrer muito com isso”, alertou.
Sobre os poderes presidenciais, Marcelo referiu não ser necessário reforçá-los e afirmou não sentir qualquer tensão entre a sua proximidade com os eleitores e as funções como chefe de Estado.
“Há muitas outras missões tão ou mais importantes do que a de Presidente da República. Todas elas exigindo racionalidade e afeto. E, claro, ação. Separar o que deve estar junto é artificial”, acrescentou.
O chefe de Estado manifestou-se favorável à ideia do voto eletrónico em Portugal – dizendo ter introduzido essa metodologia no PSD em 1998 -, mas advertiu para a necessidade de ultrapassar a infoexclusão.
A continuação da eleição presidencial por sufrágio direto e universal foi também apoiada pelo antigo líder do PSD, por considerar que os poderes de dissolução da Assembleia da República, de convocação de referendos e de veto de diplomas o justificam.
O chefe de Estado recebeu ainda várias perguntas sobre os apoios às zonas afetadas pelos incêndios e uma em concreto sobre as denúncias da sua utilização ilegal em Pedrógão Grande.
“É muito preocupante. Importa que Ministério Público e Inspeção-Geral das Finanças - esta quanto ao Revita, se for caso disso - cumpram a sua missão de modo cabal e célere. Tenho a certeza de que assim será, tal a relevância nacional e democrática da matéria”, reiterou.
Questionado sobre a situação da CP e uma eventual privatização da empresa, o Presidente sublinhou que “há problemas urgentes que não podem esperar por um debate eleitoral”, que considera ser “talvez inevitável para o ano”.
“Esses problemas não comportam, portanto, agora, acenar com soluções como imediatas, sabendo que o não podem ser”, disse.
Ainda nas perguntas na área dos transportes, Marcelo Rebelo de Sousa sustentou que o projeto de aeroporto no Montijo “pode ser muito importante para evitar estrangulamentos e visões de mero curtíssimo prazo” e desejou um futuro “mais promissor ao magnífico aeroporto de Beja”.
A situação dos lusodescendentes na Venezuela e a abertura do ano letivo suscitaram também dúvidas aos alunos da Universidade de Verão.
No primeiro caso, o chefe de Estado reafirmou a preocupação com os portugueses na Venezuela, mas sem “os expor a riscos ou represálias”, e, no setor da edução, lamentou que ainda não tenham sido possíveis acordos mínimos de regime, para lá do tempo das legislaturas.
Confessando-se “um crónico apreciador” da iniciativa social-democrata de formação de quadros, Marcelo deixou um conselho aos participantes desta 16.ª edição, que decorre até domingo em Castelo de Vide, distrito de Portalegre.
“Tenham caráter, sejam corajosos, arrisquem e nunca percam a vossa independência, toda ela, a começar na económica, sem a qual a do pensamento pode ser condicionada”, apelou.
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