“A política na Europa mudou drasticamente e isso tem consequências a muitos níveis. A meu ver, que sou do PSD, deve haver essa consequência ao nível da relação com o PS e romper-se o consenso que se estabeleceu nos últimos 30, 35 anos”, defendeu o deputado social-democrata, que considera que o último acordo concreto entre os dois partidos sobre fundos comunitários representou “uma posição clientelar” em relação à Europa.
Em declarações à Lusa, o antigo assessor político do ex-primeiro-ministro Pedro Passos Coelho explicou que, se este consenso entre as principais forças políticas foi positivo para a construção europeia, há mudanças nos últimos dez anos que impõem uma nova visão.
“A insistência num consenso entre partidos europeístas para fazer frente aos partidos anti-europeístas é extremamente danosa porque as sociedades ficam apenas com direito a uma escolha: ou a destruição da Europa ou um consenso tecnocrático que não distingue políticas de esquerda, nem de direita”, alertou o deputado.
Por isso, defendeu, o PSD “não se deve sentir vinculado” a qualquer consenso à partida com o PS em matérias europeias, pois, no período da ‘troika’, os socialistas também se desvincularam do mesmo, ao rejeitarem na oposição as políticas com que se tinham comprometido ainda no Governo.
“A meu ver, o que tem de se fazer ao nível dos Estados nacionais para recompor o panorama partidário é criar, dentro da família pró-europeísta, um europeísmo de direita que debata com um europeísmo de esquerda e que debata contra o anti-europeísmo dos partidos populistas de extrema-esquerda e extrema-direita”, afirmou.
Para o deputado do PSD, este “europeísmo de direita” assenta em dois grandes princípios: a continuidade da ideia de nação de cada Estado-membro e a manutenção da relevância das instituições democráticas nacionais.
“A posição do europeísmo de direita é que os Estados foram, são e devem continuar a ser os senhores dos tratados e não uma qualquer instância que transcende os Estados”, afirmou, opondo este princípio à ideia de “super Estado federal” que considera caracterizar o “europeísmo de esquerda”.
Como exemplo concreto, apontou a posição do PSD – ainda liderado por Passos Coelho – na negociação da Cooperação Estruturada Permanente (CEP), um aprofundamento da política de defesa comum.
Nessa ocasião, os sociais-democratas recusaram um consenso “assinado de cruz” e impuseram três linhas vermelhas para darem o seu acordo a uma posição comum com o Governo: o aprofundamento da política europeia de defesa não poderia comprometer a participação de Portugal na NATO, nem a sua importância na defesa europeia, não poderia conduzir à criação de um exército comum europeu e não poderia admitir uma imposição externa da especialização das Forças Armadas.
“Foi um momento em que ficou claro, numa situação concreta que toca o coração da soberania nacional, que houve duas posições pró-europeias distintas”, apontou o deputado, que anunciou recentemente em entrevista ao Expresso que pretende lançar em breve um movimento para repensar o PSD e capaz de “federar as várias direitas”.
Questionado sobre como enquadra o acordo assinado entre PSD e Governo em 18 de abril sobre o próximo Quadro Comunitário de Apoio, Miguel Morgado considerou que “traduz o que têm sido todos os esforços de consenso” entre as duas áreas políticas.
“Traduz uma posição clientelar em relação à Europa, não é uma tomada de posição sobre política europeia, é apenas uma relação clientelar”, disse.
Nessa ocasião, quer Governo quer PSD assumiram que o objetivo da declaração conjunta assinada era “reforçar a posição de Portugal em Bruxelas” para que, no próximo ciclo de fundos, o país “tenha pelo menos se não mais, verbas idênticas às do Portugal 2020”, ou seja, cerca de 30 mil milhões de euros.
Se em matérias orçamentais considera existirem fatores, como o elevado endividamento português, que acabam por condicionar a política de qualquer Governo, Miguel Morgado indicou um eventual alargamento do peso do orçamento comunitário como outro ponto de discórdia entre europeístas de esquerda e de direita.
“Para termos um orçamento comunitário com uma dimensão relevante para lidar com crises, isso teria uma contrapartida: em Portugal, por exemplo, teríamos de reduzir a despesa pública drasticamente e a carga fiscal drasticamente, senão a vida fiscal seria insuportável”, afirmou, manifestando-se contra essa hipótese até por tornar o parlamento nacional “quase irrelevante” e diminuir o papel do Governo.
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