A pandemia provocada pelo vírus SARS-CoV-2 empurrou-nos para dentro de casa e obrigou-nos a repensar a forma como trabalhamos. O teletrabalho, em Portugal, foi obrigatório durante vários períodos nos últimos dois anos, nos casos em que tal era possível, aumentando em grande percentagem o número de pessoas a trabalhar neste regime, ainda que abaixo a tendência registada noutros países europeus, como mostra o mapa de variação, em relação a 2019, abaixo.
Agora que a grande maioria das restrições foi levantada, o trabalho remoto não é algo que, como o vírus, se deseja que desapareça.
Assim, o teletrabalho veio para ficar, talvez na maioria dos casos não de forma tão rígida como aconteceu durante os períodos de confinamento, com o formato híbrido a ser o que parece reunir maior consenso. O presidente executivo da Claranet Portugal afirmou, em entrevista à Lusa, que "a maior parte das empresas" prevê o modelo de trabalho híbrido e que as pessoas não irão "voltar 100% ao escritório".
Atualmente, a tecnológica conta com "cerca de 800 colaboradores", dos quais perto de 150 estão na região do Porto, outros cerca de 350 na região de Lisboa e 200 "estão espalhados pelo país" ou "diretamente" nos clientes da Claranet Portugal.
"Em Lisboa, temos cerca de 300 a 350 colaboradores neste momento, são esses que vão utilizar a nova sede [no Hub Criativo do Beato], sendo que prevemos nunca voltar a 100% ao escritório", afirma António Miguel Ferreira. "Vamos sempre ter um 'mix' de trabalho remoto e trabalho no escritório", considera.
O Conselho Diretivo do Instituto Nacional de Estatística (INE) revelou que o teletrabalho não foi interrompido mesmo quando não era recomendado e a previsão é que se torne padrão o regime híbrido atual de quatro dias por semana em casa.
Em resposta enviada à agência Lusa, a direção do INE explicou que o atual regime híbrido foi instituído na sequência do estado de alerta (desde 1 de outubro de 2021), em que o teletrabalho não era recomendado “como medida de contenção e prudência face à evolução da situação pandémica antecipando um eventual agravamento”. “Acresce que já foi transmitido aos trabalhadores que se prevê que o regime híbrido passe a ser o padrão, mesmo sem pandemia, substituindo o regime presencial generalizado que vigorava antes de março de 2020”, disse ainda.
O CD do INE referiu que a forma final ainda se encontra em estudo, considerando que se “compara bem com instituições congéneres, privadas ou públicas, na procura das melhores soluções de equilíbrio entre as necessidades da organização e medidas de conciliação, em claro benefício dos trabalhadores”.
Os exemplos são muitos, mas a conclusão só uma: a forma como trabalhamos mudou definitivamente. E isso tem implicações. O impacto mais visível é na constituição e relação dentro de uma equipa que deixa de estar junta regularmente, com a situação a ser extremada com o caso de trabalhadores contratados durante o período de pandemia e que sempre trabalharam neste regime remoto.
O que fazer para contornar esta barreira e continuar a trabalhar de forma saudável as relação de uma equipa e passar aos trabalhadores a cultura e valores da empresa? Bryan Walsh, numa newsletter da Axios dedicada ao tema, diz mesmo que o futuro deste formato híbrido não é o trabalho. O texto começa com uma menção a Michael Scott, personagem fictícia e protagonista da série The Office, que é um símbolo de devoção à equipa e não ao trabalho.
O exemplo não é para ser levado a extremo, mas as empresas vão ter de começar a pensar em alternativas para criar uma cultura e os retiros parecem ser a solução da moda.
Em maio de 2021, numa conferência promovida pelo The Wall Street Journal, Mark Benioff, CEO da Salesforce, uma empresa norte-americana de software on demand, mais conhecida por ter produzido o CRM chamado Sales Cloud, admitiu a possibilidade de comprar um rancho para servir permanentemente como retiro, para que os funcionários vivam o espírito da empresa.
A ideia, que noutros tempos podia ser encarada como um desperdício de tempo, é atualmente vista como uma forma de aumentar a moral, criar laços dentro da equipa e melhorar as relações entre os trabalhadores
Mas porque não simplesmente chamar os funcionários de novo para o escritório? Parece que uma das consequências do teletrabalho é precisamente não querer voltar ao regime presencial, pelo menos não em full time. Segundo um estudo da Futuro Forum, da Fundação Calouste Gulbenkian, com 10 mil participantes, 76% dos empregados não quer voltar ao modelo tradicional pré-pandemia.
Também um estudo da consultora Ipsos em 29 países para o Fórum Económico Mundial diz que 66% dos trabalhadores de todo o mundo defende maior flexibilidade laboral no futuro.
O melhor será mesmo fazer as malas e aproveitar aqueles que parecem vir a ser dias de exceção, aqueles em que estamos com as pessoas com quem trabalhamos.
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