No Brasil o aborto já é proibido, mas há três exceções em que a interrupção da gravidez é permitida: quando a gravidez coloca a vida da mãe em risco, quando a gravidez é fruto de uma violação ou quando o feto é diagnosticado com anencefalia, uma má formação rara do tubo neural que impede a sobrevivência fora do útero depois do nascimento.

“O PL [projeto de lei] 1904/24 quer mudar o Código Penal brasileiro para equiparar o aborto após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio, quando a gestação for fruto de violação, caso em que o aborto é permitido pela lei brasileira. Isso quer dizer que uma mulher violada pode ser condenada a uma pena superior à de seu violador: a pena máxima para violação é de até 10 anos, enquanto a de homicídio simples é de até 20 anos”, argumentou a primeira-dama brasileira numa mensagem publicada na rede social X (antigo Twitter).

Janja, apelido da mulher do Presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, considerou, na mesma mensagem, que a lei em discussão é preocupante para a sociedade brasileira e criticou a tramitação desse projeto sem a devida discussão nas comissões temáticas da Câmara dos Deputados, referindo-se ao pedido de urgência aprovado na quarta-feira para tratar da lei, que dispensou discussões mais aprofundadas nas comissões parlamentares.

“Os propositores do PL parecem desconhecer as batalhas que mulheres, meninas e suas famílias enfrentam para exercer seu direito ao aborto legal e seguro no Brasil. Isso ataca a dignidade das mulheres e meninas, garantida pela Constituição Cidadã. É um absurdo e retrocede em nossos direitos. A cada 8 minutos uma mulher é violada no Brasil”, criticou.

“O Congresso poderia e deveria trabalhar para garantir as condições e a agilidade no acesso ao aborto legal e seguro pelo SUS [Sistema Único de Saúde]. Não podemos revitimizar e criminalizar essas mulheres e meninas, amparadas pela lei. Precisamos protegê-las e acolhê-las. Seguimos juntas, lutando por nossos direitos”, concluiu a primeira-dama.

O tema entrou em debate no Congresso brasileiro por iniciativa do deputado federal Sóstenes Cavalcante, pastor evangélico e parlamentar da chamada bancada da Bíblia, em resposta a uma decisão do juiz Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que suspendeu os efeitos de uma resolução do Conselho Federal de Medicina do Brasil que proibiu médicos de realizarem assistolia fetal. O procedimento é recomendado por organismos internacionais para a realização do aborto legal após a 22.ª semana de gestação.

Se aprovada, a lei prevê que a pena para a mulher que interromper a gravidez será mais dura que aquela a ser imposta ao homem que a violou, por exemplo, porque a pena no Brasil para o crime de violação, se a vítima for adulta, varia entre seis anos e 10 anos e a nova lei prevê que mulheres que abortarem após 22 semanas, mesmo que tenham direito ao procedimento por estarem enquadradas nos casos em que a prática é permitida legalmente, estariam sujeitas penas de prisão entre seis e 20 anos.

Após o avanço da lei na Câmara dos Deputados, centenas de pessoas tomaram as ruas de algumas cidades brasileiras para se manifestarem contra o projeto na noite de quinta-feira.

A nova lei também tem recebido críticas nas redes sociais e nos ‘media’ locais porque retira direitos estabelecidos na Constituição do Brasil desde a década de 1940, que não estabelece tempo determinado para realização de um aborto em mulheres violadas, em risco de vida ou que estejam grávidas de fetos anencéfalos.