"A evasão durou seis minutos" e "83 minutos mediaram a evasão e o reporte às autoridades", revelou Rita Alarcão Júdice aos jornalistas numa conferência de Imprensa agendada para quatro dias depois da fuga dos reclusos, considerados perigosos pela Polícia Judiciária.
"Estavam ao serviço 35 guardas e o elemento que visiona as câmaras "encontrava-se no seu posto. Não foi uma fuga oportunista, mas um plano preparado com tempo e com ajuda de terceiros" — acrescenta.
"Houve uma sucessão de fragilidades" que a governante não descreve por motivos de investigação, mas assume que existiu "desleixo, fragilidade, facilidade e falta de comando".
"A fuga de cinco reclusos, em plena luz do dia, com ajuda externa, saltando dois muros, um deles com seis metros é de uma gravidade extrema. E é de uma gravidade que não podemos desculpar. Não podemos desculpar em nome da segurança da população, da confiança que depositamos no funcionamento das nossas prisões, do Estado de direito e também da reputação do nosso país."
A ministra da Justiça salientou que não "quis contribuir para o ruído de fundo",e que procurou "reunir toda a informação disponível, tudo o que foi possível, ouvir as explicações. Falar por falar não é o meu timbre" - afirmou.
O que aconteceu no sábado em Alcoentre?
A governante leu a seguinte linha de tempo dos acontecimentos, que consta no relatório, sem detalhar factos susceptíveis de colidirem com a investigação:
"A operação de fuga de cinco reclusos começou às 9h55 com a intrusão de três indivíduos no perímetro externo do estabelecimento prisional. A invasão dos reclusos teve início às 9h57. O último recluso a evadir-se ultrapassou a vedação exterior do estabelecimento prisional às 10h01. Assim, segundo este relatório, a evasão demorou seis minutos e foram usados recursos, como duas escadas, que não existiam no interior do estabelecimento prisional.
"A fuga é detetada por dois guardas, quase em simultâneo, pelas 11h. Um dos guardas encontrava-se no pavilhão do EP, o segundo guarda circulava em viatura no perimetro interior quando se depara com uma escada. O alerta dado a toda a corporação ocorre entre as 11h04 e as 11h08.
"Ainda segundo este relatório, a cronologia dos factos segue a seguinte ordem. O diretor do estabelecimento prisional de Valdez do Deus é informado às 11h10. O alerta à GNR é dado às 11h18. A DGRSP é informada às 11h19. Às 12h, o Diretor do Estabelecimento Prisional confirma à DGRSP a fuga e a identidade dos cinco reclusos. Assim, entre as manobras de aproximação dos cúmplices externos, que ocorreu às 9h55 e a detecção da fuga às 11h, decorreram 65 minutos. Entre o início da fuga e a comunicação ao órgão de polícia criminal competente, que foi no caso a GNR, mediaram 83 minutos."
"Neste relatório há outros dados que, sem comprometer a segurança nacional e sem prejudicar as investigações em curso, podemos também adiantar. No dia da fuga, estavam escalados 35 elementos. 33 guardas-prisionais, mais dois elementos com função de chefe de equipa. No momento da fuga, o sistema de videovigilância estava operacional e estava a funcionar. O elemento responsável por monitorizar as imagens estava no seu posto."
Apurar responsabilidades e tirar conclusões. O que vai fazer o Governo?
Acerca da responsabilidade na evasão dos reclusos, Rita Júdice considerou que "houve uma sucessão de fragilidades - cuja descrição promenorizada passava para aguardar as investigações em curso - e a própria segurança" não devo, nem vou, pelas razões que imaginam fazer.
O relatório "permanecerá reservado e confidencial" mas a ministra adiantou:
"Nos relatos recebidos vimos desleixo, vimos facilidade, vimos irresponsabilidade e vimos falta de comando. Também vimos decisões erradas, com a ausência de decisões nos anos mais recentes. Apesar das zonas cinzentas e perguntas sem resposta que subsistem, já tenho respostas que me permitem tirar conclusões e decidir.
Rita Júdice afirmou, como primeira conclusão, que tem "fundamento para concluir que a fuga de cinco reclusos resultou de uma cadeia sucessiva de erros falhas graves, grosseiras, inaceitáveis e que queremos irrepetíveis. Este episódio não traduz a cultura de segurança e de exigência que queremos".
Como segunda conclusão refere "que esta fuga foi orquestrada. Não resultou no aproveitamento de uma distração, não foi uma fuga oportunista, foi, como garantem os peritos de segurança, um plano preparado, com tempo, com método e com ajuda de terceiros."
Como derradeira conclusão, a governante afirma que a "recuperação da confiança no sistema prisional vai exigir a responsabilização a vários níveis e o reforço da fiscalização ao sistema prisional. Estas conclusões obrigam-nos a agir."
Como ações a implementar, revelou que aceitou "o pedido de demissão apresentado pelo diretor-geral da DGRSP e também o pedido de dimissão apresentado pelo Subdiretor-Geral dos estabelecimentos prisionais. Assumirá funções em regime de substituição a doutora Isabel Leitão, até aqui subdiretora-geral da DG RFP."
A tutelar da Justiça afirmou que mandatou a "inspeção-geral dos Serviços de Justiça para dar início, urgente, a uma auditoria aos sistemas de segurança de todos os 49 estabelecimentos prisionais do país"m que deverá estar entregue até ao final deste ano.
A ministra anunciou ainda "uma auditoria de gestão ao sistema prisional, que avalie a organização e a afetação de recursos da DGRSP e de todos os calecimentos prisionais do país". Esta segunda auditoria, adiantou, "será necessariamente mais demorada, vai ajudar-nos na tomada de decisões para uma melhor utilização de recursos e para afetuar-nos as mudanças que se imponham.
Aguarda-se "ainda o desfecho de outras investigações em curso e do processo de auditoria que está a ser levado a cabo pelo Serviço de Auditoria e Inspeção, da DGRSP, cujo trabalho acredito que esteja concluído no prazo de um mês.
"Não hesitarei em dar impulso aos processos disciplinares nem aos processos penais que se revelem necessários.
Demissão do diretor-geral das prisões
Esta tarde, a RTP noticiou a demissão do diretor-geral dos Serviços Prisionais, na sequência das fugas no passado sábado.
A ministra da Justiça, Rita de Alarcão Júdice, recebeu hoje de manhã o relatório de auditoria à atuação dos serviços de vigilância e segurança, elaborado pela divisão de segurança da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP), e está a analisar o documento, que apresenta na conferência de imprensa.
O relatório, sustentou fonte do MJ à Lusa, resultou de um “inquérito urgente” e é uma “auditoria técnica”, que aborda apenas os factos em torno da fuga e da segurança na prisão, com indicações das horas dos acontecimentos e do que falhou para ser possível a fuga dos cinco reclusos na manhã de sábado, sem se pronunciar sobre questões de natureza política.
As primeiras declarações da governante sobre o caso da fuga dos cinco reclusos de Vale de Judeus, em Alcoentre, no sábado, foram anunciadas para as 17:00, mas começaram uma hora depois.
Na conferência de imprensa estarão ainda presentes a secretária de Estado Adjunta e da Justiça, Maria Clara Figueiredo, que tem a tutela das prisões, e o inspetor-geral dos Serviços de Justiça, Gonçalo Cunha Pires.
Além deste relatório, a mesma fonte salientou que está em curso outro inquérito interno dirigido por um magistrado do Ministério Público, no âmbito do Serviço de Auditoria e Inspeção da DGRSP, e que “estará pronto dentro de um mês”.
Cinco reclusos fugiram no sábado do Estabelecimento Prisional de Vale de Judeus, em Alcoentre, no concelho de Azambuja, distrito de Lisboa. A fuga foi registada pelos sistemas de videovigilância pelas 09:56, mas só foi detetada 40 minutos depois, quando os reclusos regressavam às suas celas.
Os evadidos são dois cidadãos portugueses, Fernando Ribeiro Ferreira e Fábio Fernandes Santos Loureiro, um cidadão da Geórgia, Shergili Farjiani, um da Argentina, Rodolf José Lohrmann, e um do Reino Unido, Mark Cameron Roscaleer, com idades entre os 33 e os 61 anos.
Foram condenados a penas entre os sete e os 25 anos de prisão, por vários crimes, entre os quais tráfico de droga, associação criminosa, roubo, sequestro e branqueamento de capitais.
Ainda hoje, o Tribunal de Execução de Penas (TEP) de Lisboa emitiu mandados de captura, europeus e internacionais, que permitem que os cinco reclusos de Vale de Judeus possam ser presos no estrangeiro. Até agora estavam apenas disponíveis mandatos de captura nos sistemas Schengen, da Interpol e Europol.
“Em termos internacionais, posso dar nota que os mandados de detenção europeus foram já emitidos. Já estão emitidos hoje. Foram já inseridos no sistema, o que é extraordinário, porque estamos a falar de algo que aconteceu no sábado”, afirmou Rita Alarcão Júdice, entrevistada no Telejornal da RTP.
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