“As tarifas de água urbanas do Algarve são, em média, 15 a 17% inferiores à média nacional. Numa região de escassez [hídrica] (…), ter água mais barata do que em zonas de abundância é um erro de análise crasso”, disse o ex-presidente da APA, que deixou o cargo no final de janeiro após cerca de 12 anos em funções.
Nuno Lacasta falava num debate sobre a crise hídrica no Algarve promovido pela Ordem dos Economistas - Delegação Regional do Algarve, realizado em Faro.
Para o docente universitário e consultor em ambiente e sustentabilidade, manter os preços atualmente cobrados pelos serviços de abastecimento no setor urbano, que inclui o turismo, significa “dar um incentivo económico óbvio para as pessoas não pouparem água”.
Segundo Nuno Lacasta, esta é uma de três “disfunções”, em termos económicos, que encontra na análise à temática da escassez de água no Algarve.
As outras duas disfunções passam pela existência dos segundos contadores, normalmente utilizados para rega de jardins ou enchimento de piscinas e que têm um tarifário mais favorável, e pela utilização de água potável na rega.
“Como é possível andarmos a gastar para rega água para beber”, questionou, acrescentando: “Andamos a gastar dinheiro dos nossos impostos para despoluir e para limpar a água para beber. E, no entanto, utilizamos esta água para regar espaços verdes ou lavar carros”.
Nuno Lacasta criticou ainda o nível de perdas de água no abastecimento público do Algarve, “entre 20 a 40 por cento, dependente de cada município”, considerando que o país foi “complacente” com a situação e dormiu “à sombra da bananeira”, apesar do forte investimento realizado no setor nas últimas décadas.
O ex-presidente da Agência Portuguesa do Ambiente considerou que a região “não pode desperdiçar” o plano de investimentos de 240 milhões de euros, com fundos do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), e defendeu a construção de uma segunda estação de dessalinização, além daquela que está prevista para instalar em Albufeira.
“As chuvas de março deram-nos oito meses. Mas o momento Cidade de Cabo não desapareceu por ter chovido em fevereiro e março”, afirmou, numa alusão à crise hídrica que a cidade de África do Sul passou em 2018, quase levando a um corte total no abastecimento de água, o chamado ‘dia zero’.
As barragens do Algarve dispõem atualmente de mais 6,6 hectómetros cúbicos (hm3) de água do que no período homólogo do ano passado, situando-se nos 45% da sua capacidade total, revelou esta semana a Agência Portuguesa do Ambiente (APA).
Apesar de as chuvas registadas nos primeiros meses do ano e no período da Páscoa terem melhorado as reservas na região, as autoridades ambientais têm vindo a alertar que a situação de seca se mantém no Algarve e é necessário continuar a adotar medidas de controlo do consumo.
O Algarve está em situação de alerta devido à seca desde 05 de fevereiro, tendo o Governo aprovado um conjunto de medidas de restrição ao consumo, nomeadamente a redução de 15% no setor urbano, incluindo o turismo, e de 25% na agricultura.
A estas medidas somam-se outras como o combate às perdas nas redes de abastecimento, a utilização de água tratada na rega de espaços verdes, ruas e campos de golfe ou a suspensão da atribuição de títulos de utilização de recursos hídricos.
O Governo já admitiu elevar o nível das restrições, declarando o estado de emergência ambiental ou de calamidade, caso as medidas agora implementadas sejam insuficientes para fazer face à escassez hídrica na região.
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