O programa “SuperNanny” vem sendo a celeuma de eleição dos últimos dias, por isso tenho a certeza que nesta discussão já quase tudo foi dito. Mesmo pouco havendo a acrescentar, o que é certo é que o napalm pegajoso do tema grudar-se-á a mim nos próximos parágrafos. Faltando-me filhos, faltando-me diplomas de pedopsicologia e faltando-me paciência para me alongar no assunto, destacarei apenas alguns pormenores que não têm estado forçosamente no centro da discussão.

Primeiro, assinalo a curiosidade de voltar a ver um reality show a tornar-se matéria de telejornais. Se não estou em erro, tal não acontecia há quase duas décadas, mais precisamente desde a primeira edição do Big Brother português. As comparações entre esses tempos e os de hoje mergulham-me num optimismo inesperado. Afinal até conseguimos evoluir em algumas coisas: há 18 anos, o Big Brother entrava no Jornal da TVI por motivos muito pouco jornalísticos; já a SuperNanny gera hoje uma discussão que visa temas relevantes a vários níveis. O pontapé que o Marco deu à Sónia teve, no ano 2000, um tratamento telenovelístico por parte dos noticiários; já em 2018, só uma reflexão séria sobre a violência doméstica, machismo e quejandos traria o biqueiro do Marco para um telejornal.

Ainda sobre reality shows, não deixa de ser estranho que o mais censurado de todos seja o menos aberrante de todos. SuperNanny é, muito provavelmente, o menos estupidificante, imoral e fútil de todos os reality shows do presente. Meio minuto de conversa num Secret Story, por exemplo, é mil vezes mais torpe que meia hora de SuperNanny, que nem sequer é torpe. O problema deste último não está nos objectivos, nem sequer nos métodos da senhora (nunca parecem escandalosos, sequer errados) e este é o ponto onde muitas vezes a discussão se equivoca.

Considerando que todos os intervenientes visíveis na SuperNanny são bem-intencionados, e que os objectivos são bons, descobrimos que o verdadeiro problema reside num maquiavelismo invertido, onde os meios justificam os fins. É nos meios que está a desvirtude - a exposição de menores, e a partilha humilhante de intimidades que são seleccionadas pela negativa. As intenções dos pais são boas e os métodos da senhora nanny não são maus, só que a sujeição de todo este processo às câmaras é perigosíssimo. Se para remediar o comportamento dos filhos vale tudo, até a sua violenta exposição mediática, qual é que é o argumento para as palmadas já não valerem?

Não aponto erros pedagógicos grosseiros à protagonista Teresa Paula Marques, mas à presunção pedagógica da SIC aponto com todos os dedos que tenho. Num debate promovido pelo canal, o argumento mais insistente da Júlia Pinheiro (Directora de programas) foi o de que “há uma intenção puramente social e pedagógica.” Não é por má vontade que digo que essa afirmação é uma grande treta. “Lérias!” -  resmungaria o meu avô (exímio a dispersar birras infantis com as suas mãos de sapateiro).

Para contrariar as duvidosas boas intenções da SIC, só tenho de enumerar um punhado de evidências. Aliás, basta ver o tipo de programas que, em 25 anos do canal, ocupou o horário nobre aos domingos. Esse historial permite perceber que “intenções puramente sociais” nunca foram o forte do cardápio, e que “intenções pedagógicas” nunca estiveram no paiol usado para a constante guerra de audiências.

O formato do SuperNanny, o franchise, a montagem sensacionalista, ou até o outfit farsola da psicóloga chegam para perceber que o propósito da estação está 99,9% concentrado no entretenimento mais básico.  Já a percentagem de “intenções pedagógicas” é tão reduzida que até parece homeopatia. A Júlia Pinheiro talvez se tenha achado momentaneamente Directora de programas da RTP 2, só isso a justifica. Fins educativos nem sempre são fáceis num canal que, em muitos serões, ainda é assombrado pelo fantasma do Ediberto Lima. 

Para terminar, apenas quero revelar que me descobri enorme fã da versão dinamarquesa da SuperNanny. É uma versão alternativa, em que a protagonista não vai a casa das famílias, vai antes às universidades para confrontar meninos birrentos. A nanny chama-se Marlene Wind, e escolheu um método muito interessante para confrontar uma criança pelo seu desrespeito das regras - fez-lhe estas perguntas: “Queres uma limpeza étnica? É esse o teu objetivo? Dizes que queres negociar com Rajoy, mas não achas que estás a ser muito provocador e a contribuir para uma escalada desta situação? E a democracia para ti é só fazer referendos e votar ou inclui também o respeito pela lei e pela Constituição?”. O petiz Puigdemont bem preferia ter ficado 55 minutos na cadeira do castigo.

SÍTIOS CERTOS, LUGARES CERTOS E O RESTO

Contam-se pelos dedos as semanas em que não escrevo sobre Trump. Nesta foi porque o JMT já tinha dito o que era preciso.

Operação plástico.

O verdadeiro underdog dos Óscares deste ano.