Aprender a viver com medidas “duríssimas”

Alexandra Antunes
Alexandra Antunes

À meia-noite, António Costa falou. O tema já era conhecido e, em parte, já se sabia o que poderia sair da reunião do Conselho de Ministros — mas não havia pormenores. Segundo o decreto do Presidente da República, o novo estado de emergência podia trazer novidades no que diz respeito a restrições de circulação, convocação de recursos humanos para rastreio, utilização de meios do setor privado e social e no controlo da temperatura. E agora já se sabe quais são as medidas exatas.

O governo aprovou no sábado as medidas do estado de emergência que vai vigorar entre o dia de amanhã, segunda-feira, e 23 de novembro, prevendo o recolher obrigatório noturno durante a semana nos 121 concelhos de maior risco de contágio — uma das medidas que mais discussões provoca.

Mas há ainda mais uma restrição neste sentido. Nestes 121 municípios, onde há "risco elevado de transmissão da covid-19", abrangendo 70% da população residente, ou seja, 7,1 milhões de habitantes em Portugal, incluindo todos os concelhos das Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto, a circulação também estará limitada nos próximos dois fins de semana entre as 13:00 de sábado e as 05:00 de domingo e as 13:00 de domingo e as 05:00 de segunda-feira.

O executivo aprovou ainda outras medidas que se irão aplicar a Portugal Continental, como a possibilidade da medição de temperatura corporal por meios não invasivos e a possibilidade de exigir testes de diagnóstico para a covid-19 em locais específicos, como estabelecimentos de saúde, estruturas residenciais, estabelecimentos de ensino, à entrada e à saída de território nacional e em prisões, entre outros.

Apresentadas as medidas, o primeiro-ministro admitiu que o novo estado de emergência não tem apenas uma “natureza preventiva”, e até contempla medidas “mais intensivas” ao fim de semana do que em março. Além disso, Costa frisou que estas restrições — principalmente as de deslocação — são “duríssimas” para os cidadãos, bem como para a restauração e o comércio.

Todavia, o objetivo é que se consiga ter um Natal “o mais normal possível”, o que não acontecerá sem que as medidas sejam cumpridas ao máximo.

Até agora, o PCP, o Chega e o PAN já reagiram à comunicação do governo. Mas há outras reações — desde a Igreja ao comércio e espetáculos. Vejamos algumas:

  • Ordem dos Advogados refere que as medidas anunciadas são “uma fortíssima restrição do direito ao repouso”, ao lazer e “ao descanso semanal dos trabalhadores”, o que vai contra o que diz a Constituição;
  •  A Conferência Episcopal Portuguesa demonstrou surpresa pelas regras comunicadas após o Conselho de Ministros de sábado — nomeadamente no que diz respeito às limitações de circulação nos próximos dois fins de semana. Depois destas regras, pediu às dioceses para adaptar horários de "celebrações vespertinas e outras atividades" durante o estado de emergência;
  • A Fenprof mostrou-se desiludida com as medidas do governo para as escolas nesta fase de estado de emergência e criticou a falta de diálogo sobre as tarefas a desempenhar pelos professores sem componente letiva. Neste sentido, Costa apenas referiu que as escolas não vão fechar;
  • A Associação Portuguesa de Centros Comerciais (APCC) alertou para as "graves consequências" e "grande golpe" dado ao comércio e restauração com a proibição de circulação nos próximos dois fins de semana, já que "as empresas não suportam mais paragens de funcionamento forçadas", porque são situações que provocam prejuízos avultados, perdas de emprego e contribuem para o desacelerar da economia;
  • A Associação Nacional de Restaurantes PRO.VAR acusou hoje o governo de, com as novas medidas anunciadas, paralisar “quase por completo” um setor “à beira da bancarrota” e defende a criação de um gabinete de crise para acompanhar a atividade;
  • A Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP) classificou de "catastróficas" para a restauração e para o alojamento as restrições de circulação anunciadas.

Enquanto as medidas são criticadas, também há quem agradeça pelo passo dado: a Ordem dos Médicos congratulou-se com a declaração de estado de emergência, que queria ativado mais precocemente, e avisou a população sobre um agravamento da pandemia nas próximas semanas e a necessidade de manter medidas preventivas. Para acentuar as necessidades no país, a Ordem deixou ainda uma citação do filósofo grego Sócrates: “A Saúde não é tudo, mas tudo é nada sem Saúde”.

E, por isso, só resta aprender a viver com as novas medidas — mesmo que surjam críticas, que nunca se agrada a gregos e a troianos.

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