Artista pioneiro nesta área, em Portugal, Leonel Moura dedica-se à experimentação da robótica na arte há mais de vinte anos e, em outubro do ano passado, o primeiro desenho original criado por um dos seus robôs foi vendido em leilão, por 5.000 euros, em Lisboa.
“Fiquei muito surpreendido porque em Portugal ainda não há colecionismo nem grande interesse por este tipo de arte”, disse, comentando que o meio artístico do país “é ainda muito conservador, e continua a fazer e a vender arte nos pressupostos do século XX”.
Mas o século XXI tem assistido ao interesse crescente pela inteligência artificial, com as máquinas a tornarem-se cada vez mais inteligentes e autónomas, e a serem aplicadas em várias áreas da vida, além da indústria, transportes e comunicações, também na saúde, e diversos serviços do quotidiano.
O mundo da arte não ficou alheio à inteligência artificial e, no ano passado, também foi feita a primeira venda, pela leiloeira internacional Christie’s, de uma obra criada por um grupo de estudantes através de um software.
A tela criada por um logaritmo gerou uma inesperada febre de licitações, e os esperados dez mil euros passaram para cerca de 450 mil, um valor que gerou polémica no meio artístico.
Contactado pela agência Lusa sobre estas vendas inéditas, em leilão, de obras criadas por inteligência artificial, Leonel Moura comentou que, apesar do interesse ainda ser reduzido, vai aumentar: “Não tenho qualquer dúvida de que vai crescer”.
“O mundo da arte está muito atrasado nesta área, e a situação é dramática. Os museus continuam a programar exposições sem pensar nos avanços da ciência, as galerias de arte são obsoletas porque são uma espécie de mercearias da arte que já não fazem sentido”, avaliou.
Na opinião do artista, a gravidade desta situação tem a ver com “os jovens procurarem hoje uma relação completamente diferente com a cultura”.
Leonel Moura — que gostaria de ver mais “ousadia” no mundo da arte – considera que a aplicação de tecnologias nesta área se resume quase só aos vídeos.
“É um processo lento porque qualquer mudança no mundo da arte cria sempre resistências”, observou.
A obra de Leonel Moura vendida em leilão intitula-se “SP0008″, e é uma pintura de 30 por 30 centímetros realizada em acrílico sobre papel, e está assinada e datada de 10 de janeiro de 2002.
“Os robôs que eu uso para criar arte não têm uma programação específica. São autónomos em todo o sentido da palavra. O autor desta obra foi um dos primeiros que eu criei”, recordou.
O artista explicou que a inteligência artificial dos robôs que usa é baseada no comportamento de formigas, que comunicam entre si através da libertação de feromonas.
“Dou regras simples aos robôs, que são equipados com sensores às cores, e é a elas que reagem. Eles não são programados para criar algo pré determinado. À medida que vão criando, e verificando o que fazem, tomam decisões para fazer o que se segue”, descreveu.
O artista quis, desde o início deste tipo de trabalho, provar que “a criatividade não é um exclusivo do ser humano”, e, desta forma, questionar o mundo da arte.
“O papel do artista não é só criar. Também é questionar e contribuir para ampliar o campo da arte. Ser um visionário”, opinou.
O próximo projeto do artista é colocar a arte no espaço: em fevereiro vai apresentar um projeto para criar um cometa artificial para orbitar a terra, que seria ele próprio uma obra de arte.
“A ideia é criar um cometa com uma cauda extremamente brilhante, que reflete 97 por cento da luz do sol e pode ser visto de qualquer ponto da Terra”, disse Leonel Moura, justificando que o projeto não visa apenas colocar arte no espaço, mas também “dar uma sensação de mais unidade às pessoas, como habitantes do planeta, em igualdade”.
Para concretizar o projeto já fez alguns contactos com a Agência Espacial Europeia, e irá “desafiar Portugal” a apoiar esta iniciativa.
Em março do ano passado, o artista português apresentou um conjunto de robôs pintores, de sua autoria, numa exposição sobre o uso destas máquinas na arte, realizada no Grand Palais, em Paris.
A mostra constituiu uma das primeiras abordagens museológicas desta nova forma de arte, e reuniu obras de alguns artistas que foram precursores mundiais, como Jean Tinguely, e outros nomes, como Nicolas Schöffer, Patrick Tresset, So Kanno, Takahiro Yamaguchi, J. Lee Thompson e Arcangelo Sassolino.
Intitulada “Artistes & Robots”, incluiu um conjunto de robôs de Leonel Moura que criavam, em tempo real e de forma autónoma, pinturas originais.
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