Depois de um ano de paragem, devido à pandemia da Covid-19, a Eurovisão está de regresso esta terça-feira. A primeira de duas semifinais acontece já hoje, com a final marcada para sábado.
A pausa, a primeira na história do concurso, impediu que os temas de 2020 fossem a votos. Elisa, que representaria Portugal na edição cancelada, não pode defender “Medo de Sentir”. E como ela, os restantes representantes dos outros países. Isto porque, decidiu a Eurovisão, os temas deixavam de ser "elegíveis".
"Levar as mesmas canções ao ESC2021 não estaria dentro do espírito do concurso e faria perder o entusiasmo e a tração criados em torno das seleções dos países, assim como o orgulho nacional, a diversidade e relevância do tema, influenciando negativamente o rating de cada emissão. Essa escolha iria impactar naturalmente também a importância do evento nas redes sociais, no online e nas emissões durante as finais e nos espetáculos prévios", pode ler-se na zona de perguntas e respostas do site oficial da Eurovisão.
Alguns países mantiveram os seus representantes, submetendo a concurso ano novas canções, mas outros, como Portugal, voltaram a escolher internamente os seus intérpretes.
Se acompanha, reconhecerá os nomes que transitam de 2020. E não são assim tão poucos: Vincent Bueno (Áustria), Hooverphonic (Bélgica, mas com novo vocalista), Victoria Georgieva (Bulgária), Benny Cristo (República Checa), Tornike Kipiani (Geórgia), Daði og Gagnamagnið (Islândia), Lesley Roy (Irlanda), Samanta Tīna (Letónia), Jeangu Macrooy (Países Baixos), Vasil (Macedónia do Norte), Roxen (Roménia), Senhit (São Marino), Hurricane (Sérvia), Ana Soklič (Eslovénia), Blas Cantó (Espanha), Gjon’s Tears (Suiça), Go_A (Ucrânia), Montaigne (Austrália) e James Newman (Reino Unido).
Portugal será representado pelos Black Mamba, com um tema ("Love in on My Side") que regressa quase à casa de partida — como o contou Tatanka, vocalista e autor do tema, em entrevista ao SAPO24.
Recorde-se que a cidade de Roterdão, nos Países Baixos, recebe esta edição, depois de Duncan Laurence vencer (com "Arcade") o festival em 2018.
Um grupo a representar Portugal. Já não acontecia desde os Homens da Luta
O representante português é escolhido pelo Festival da Canção. Acontece que, poucas vezes, desde 1964, ano de estreia de Portugal na Eurovisão, levámos uma banda (ou grupo, dependendo da data).
Em 1971, foi acordado que cada país poderia ter até seis artistas em palco. Até então, só eram permitidos solos ou duetos.
A estreia acontece em 1977 com Os Amigos, um grupo formado por Ana Bola, Edmundo Silva, Fernanda Piçarra, Fernando Tordo, Luisa Basto e Paulo de Carvalho. “Portugal no Coração”, o tema que foi à Europa, tinha letra de José Carlos Ary dos Santos e música de Fernando Tordo — e um tom bastante político.
A título de curiosidade “Portugal no Coração” teve uma segunda versão, esta cantada pelos Gemini (Tozé Brito, Mike Sergeant, Teresa Miguel e Isabel Ferrão). O mesmo grupo que em 1978 levou “Dai Li Dou” a Paris.
Anos mais tarde, foi a vez das Doce. Em 1982 a Eurovisão ficaria a saber o que era “Bem Bom” e para Portugal veio um discreto 13º lugar. Na década de ouro da música pop em português, seguiram-se os Da Vinci com “Conquistador”, em 1989.
Quase uma década depois, em 1998, José Cid levou os Alma Lusa à Eurovisão. Inês Santos deu voz a “Se eu te pudesse abraçar”.
Pela primeira vez na história do Festival RTP da Canção a final de 2001 não foi em transmitida directo, com o país de luto face à então recente tragédia da queda da ponte de Entre-os-Rios. O grupo MTM, formado por Marco Quelhas e Tony Jackson venceu essa edição e foi à Eurovisão com "Só Sei Ser Feliz Assim".
Anos depois, em 2005, os 2B, duo formado por Rui Drummond e Luciana Abreu, representavam Portugal. Seguiram-se as Nonstop, em 2006, com “Coisas de Nada (Gonna Make You Dance”, e os Flor-de-Lis, em 2009, com “Todas as Ruas do Amor”. A última participação em grupo é dos “Homens da Luta”, em 2011.
A estatística não é favorável. Ao longo dos anos, e nas 51 representações de Portugal, os temas a uma só voz parecem ter a preferência do júri eurovisivo. A pior prestação, até 2018, com um penúltimo lugar, tinha sido em grupo (com os Homens da Luta). A melhor não é preciso dizer...
E em inglês, pela primeira vez
Os Black Mamba fazem história ao levar um tema cantado em inglês à Eurovisão. No entanto, não será a primeira vez que um representante nacional canta na língua de Shakespeare num palco eurovisivo. Confuso?
Vamos por partes: "Love is on My Side" é o primeiro tema com letra totalmente em inglês. Mas antes — em 2003 (Rita Guerra), 2005 (2B) e 2006 (Nonstop) — Portugal já havia concorrido com temas cujos refrães faziam um desvio no idioma. Destes, só "Deixa-me Sonhar", pela voz de Rita Guerra, se qualificou para a final.
A regra de cantar na língua materna foi abolida em 1999 (o mesmo ano em que se perdeu a orquestra e o maestro em palco). Nesse ano, e pela primeira vez desde 1977, foi levantada a obrigação de as canções se apresentarem nas suas línguas oficiais. Assim o fizeram 14 dos 23 participantes dessa edição, com temas total ou parcialmente cantados em inglês.
Mas então, como é que os ABBA (suecos) venceram com "Waterloo" em 1974? Entre 1973 e 1977 a obrigação dos intérpretes cantaram numa das línguas oficiais do país que representa também havia sido colocada de lado.
Cantar em inglês dá ou não uma vantagem? Os números dizem que sim (46,42%), mas Salvador Sobral é a prova de que não são regra.
Quase metade dos temas que já venceram o festival foram cantados total ou parcialmente em inglês. Segue-se o francês (20,32% e o hebraico (5,82%). No entanto, em 2003, a Bélgica quase venceu (ficou em segundo lugar) com um tema (“Sanomi”) cantado numa ‘linguagem’ inventada.
As casas de apostas, sempre as casas de apostas
Quem sobe, quem desce, a maior subida, a maior descida. As apostas online relacionadas com o Festival Eurovisão da Canção começam a ser um tema assim que as canções são conhecidas.
O site Eurovision World reúne os vários dados das casas de apostas online e é a referência para muitos fãs. Outros preferem o número de visualizações dos temas no YouTube ou ainda o que dizem os sites especializados, como o Wiwibloggs.
Nos últimos dias, "Love is on my side" tem conquistado mais pontos nas bolsas de apostas. Os dois primeiros ensaios no palco do Festival Eurovisão puxaram pelo tema dos Black Mamba, que neste momento está bem cotado para passar à final (em 8º lugar nas apostas, garante um dos dez lugares da segunda semifinal).
Entre os favoritos à vitória, e não contrariando o título deste artigo, está o tema de Itália ("Zitti e buoni"). Segue-se a França, Malta, Islândia e, a fechar o top5, Chipre.
Galas com público, mas não chegam aos milhões de casa
Embora a 65.ª edição do Festival da Eurovisão seja disputada por 39 países, apenas 33 competem nas semifinais (16 na primeira e 17 na segunda). Os restantes seis países — os 'big-five' e o país anfitrião (Países Baixos) - têm acesso garantido à final. Em cada semifinal são escolhidos dez países (ver caixa), com Portugal a competir na quinta-feira por um lugar na final.
As duas semifinais e a final vão ter público a assistir ao vivo, tendo a organização colocado à venda este mês 3.500 bilhetes por espetáculo.
Além do bilhete, para entrar no recinto, a Ahoy Arena, todos os espectadores terão de apresentar um teste à Covid-19 negativo que não pode ter mais de 24 horas. Já as delegações vão ter de permanecer numa "bolha", só saindo do hotel para ensaios no recinto, atuações ao vivo e outras atividades relacionadas com o programa do evento.
A logística é rígida, sobretudo por ser este um dos primeiros eventos com várias delegações e público. A Eurovisão acontece dias antes da final da Liga dos Campeões, a 29 de maio, no Porto, ou do campeonato europeu de futebol, com início a 11 de junho em várias cidades.
Mesmo com audiência reduzida, o festival da Eurovisão continua a ser uma montra — uma grande montra. A final de 2019 (parece que foi há uma eternidade) teve mais de 180 milhões de espectadores (e a de 2016, mais de 200 milhões). Em que outro festival um artista tem esta plateia?
Austrália à distância
Para garantir que o concurso acontece mesmo ou que nenhum país é afastado por ter um caso positivo na sua delegação, os concorrentes gravaram as atuações previamente, para poderem participar caso não fosse possível viajarem para Roterdão.
A gravação, entregue previamente pelas estações de televisão participantes (no caso de Portugal é a RTP), teve de “acontecer num estúdio e em tempo real (tal como seria no concurso), sem qualquer edição da voz ou de qualquer parte da atuação, depois de esta ser gravada”.
E a organização terá de utilizar a gravação de pelo menos um dos 39 países: a Austrália, cuja delegação se viu impedida de viajar para os Países Baixos. Montaigne, a concorrente australiana da Eurovisão, irá participar a partir de 'casa' em formato "live-on-tape".
"Naturalmente, estou triste por não poder participar no espetáculo ao vivo da Eurovisão, pelo segundo ano consecutivo", desabafou Montaigne, que interpreta a canção 'Technicolour', "apesar da desilusão, ainda sinto que é um enorme privilégio poder participar e competir".
E já se perguntou porque é que a Austrália faz parte da competição? O país foi convidado a participar no concurso pela primeira vez em 2015, por ocasião do 60ª aniversário da Eurovisão. E apesar de nunca ter participado até essa data, desde 2005 que o concurso europeu era transmitido anualmente pelo canal de televisão do país, a SBS, tendo conquistado popularidade e muitos fãs. A sua estreia, com Guy Sebastian, correu tão bem (um quinto lugar) que valeu à Austrália um lugar definitivo na Eurovisão.
Bielorrússia de fora
São 39 os países em competição, mas podiam ser 40. No final de março, a União Europeia de Radiodifusão (UER/EBU), entidade que organiza a Eurovisão, que a Bielorrússia não iria participar na edição deste ano.
"A 10 de março, enviamos um pedido à BTRC, responsável pela inscrição da Bielorrússia a concurso, a solicitar que tomassem todas as medidas necessárias para alterar a sua música inscrita no evento deste ano para garantir que estava em conformidade com as regras do concurso“, pode-se ler no comunicado.
Para a Eurovisão, a canção "Ya Nauchu Tebya", do grupo Galasy ZMesta, tinha uma mensagem de apoio ao regime do presidente Alexander Lukashenko. Na letra, o grupo cantava versos como "vou ensinar-te a andar na linha", interpretados como propaganda. E, de acordo com a organização, o tema colocava em causa "a natureza não-política do concurso", não sendo "elegível".
Em resposta à solicitação da EBU, a BTRC submeteu um novo tema, composto e interpretado pelo mesmo grupo, mas que voltou a ser rejeitado.
Na resposta final, a EBU esclareceu que "examinou cuidadosamente a nova submissão do país" e concluiu que esta também violava as regras da competição. "Como a BTRC não submeteu uma inscrição válida dentro do prazo, lamentavelmente, a Bielorrússia não irá participar no 65º Festival Eurovisão da Canção, em maio”, concluiu a organização.
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