A proposta de lei do Governo deu entrada na Assembleia da República em 10 de janeiro de 2017, tendo o diploma baixado à especialidade.
Esse debate na especialidade só foi agendado já este ano, tendo sido adiado por duas vezes: em 22 de fevereiro potestativamente a pedido do PS, por precisar de mais tempo para encontrar consensos com os outros partidos e, 15 dias depois, pelo PCP, depois da entrada de duas propostas de alteração do PSD e do PS no próprio dia da votação.
Os deputados da Comissão de Economia, Inovação e Obras públicas votaram em 14 de março, artigo a artigo, e por vezes alínea a alínea, a proposta de lei do Governo e as propostas dos partidos.
O facto de veículos de transporte de passageiros através de plataformas eletrónicas se encontrarem a operar desde 2014 sem regulamentos tem sido contestado pelo setor do táxi.
A nova lei deixa de fora a definição, pelas autarquias, do número de veículos ao serviço das plataformas, os chamados contingentes, defendidos pelas associações dos táxis, que já aventaram a possibilidade de novas formas de luta.
Eis as principais normas do regime jurídico da atividade de transporte em veículo descaracterizado a partir de plataforma eletrónica (TVDE):
Operadores e motoristas
Os operadores de plataformas eletrónicas de reserva e os operadores de TVDE e respetivos motoristas devem respetivamente nos prazos máximos de 60 a 120 dias contados da data da entrada em vigor da presente lei, confirmar a sua atividade.
A presente lei entra em vigor no primeiro dia do terceiro mês seguinte ao da sua publicação.
Operadores de TVDE
A atividade de operador de TVDE (empresas que se associam às plataformas) é realizada por pessoas coletivas que efetuem transporte individual remunerado de passageiros.
O início da atividade está sujeito a licenciamento do Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT), tendo este um prazo de 30 dias úteis para analisar o pedido e decidir.
Considera-se aprovado se, no prazo previsto, não for proferida decisão, constituindo causa de indeferimento o não preenchimento de algum dos requisitos legalmente exigidos para o seu exercício.
Plataformas eletrónicas de reserva
São as infraestruturas eletrónicas que, através de uma aplicação de telemóvel, prestam o serviço de intermediação entre utilizadores e prestadores de serviços de TVDE aderentes à plataforma, na sequência de reserva efetuada pelo utilizador.
O início da atividade está sujeito a licenciamento do IMT.
As plataformas ficam obrigadas a enviar mensalmente à Autoridade da Mobilidade e dos Transportes (AMT), até ao fim do mês seguinte a que reporta, informação relativa à atividade realizada, nomeadamente o número de viagens, o valor faturado individualmente e a respetiva taxa de intermediação efetivamente cobrada.
As plataformas - empresas intermediárias detentoras dos contratos com os motoristas e veículos - devem ainda conservar durante dois anos os registos de atividade dos operadores de TVDE, motoristas e veículos, de acordo com o seu número único de registo de motorista.
Supervisão
A atividade dos operadores de plataformas eletrónicas de reserva, dos operadores TVDE, bem como dos veículos e motoristas é objeto de supervisão e regulação pelas entidades competentes, designadamente pela AMT e pelo IMT.
A fiscalização do cumprimento das disposições da lei compete ainda à Autoridade para as Condições de Trabalho, Instituto da Segurança Social, Guarda Nacional Republicana, Polícia de Segurança Pública, Autoridade Tributária e Comissão Nacional de Proteção de Dados.
Motoristas
A nova lei prevê que a formação do motorista, válida por cinco anos, deverá ter uma carga horária definida por portaria do Governo, o chamado “certificado de formação rodoviária”.
O vínculo jurídico estabelecido entre o operador de TVDE – o dono da frota - e o motorista será titulado por contrato de trabalho escrito assinado pelas partes.
Os motoristas das plataformas eletrónicas de transporte de passageiros vão ter de ser titulares de carta de condução há mais de três anos e têm de comunicar previamente ao IMT o início da sua atividade.
Os motoristas não vão poder conduzir por mais de 10 horas dentro de um período de 24 horas, independentemente do número de plataformas nas quais prestem serviço, sem prejuízo da aplicação das normas imperativas, nomeadamente do Código de Trabalho.
Veículos
Os veículos vão circular com um dístico, visível do exterior e amovível, em termos a definir por deliberação do conselho diretivo do IMT.
Apenas podem ser utilizados veículos inscritos junto da plataforma eletrónica de reserva e o operador não pode ser proprietário de veículos TVDE, nem financiar ou ser parte interessada em negócio relativo à aquisição, aluguer ou leasing e só podem ser utilizados automóveis ligeiros de matrícula nacional, com lotação não superior a nove lugares, incluindo o do motorista.
Os automóveis devem ter idade inferior a sete anos a contar da data da primeira matrícula e, sem prejuízo dos demais seguros exigidos por lei, devem ter também seguro de responsabilidade civil e acidentes pessoais, que inclua os passageiros transportados e respetivos prejuízos.
Os veículos não vão poder circular nas faixas de BUS, conforme acontece com os táxis, nem vão poder recolher passageiros na via pública.
Plataformas pagam ‘contribuição’
As plataformas como a Uber, Cabify, Taxify ou Chofer vão estar obrigadas ao pagamento de uma contribuição de regulação e supervisão, de forma a compensar os custos administrativos de regulação e acompanhamento das respetivas atividades, sendo o valor exato definido por portaria do Governo.
Do total de comissão que as plataformas retiram de cada viagem, vão ter de pagar uma contribuição entre 0,1% e 2% ao Estado, sendo que o Governo deverá definir, em portaria, o valor exato.
Os ganhos das plataformas não podem ultrapassar 25% do valor de cada viagem, sendo os restantes 75% repartidos entre as empresas intermediárias e os motoristas.
Pagamento e tarifas
O pagamento do serviço é processado e registado através da plataforma eletrónica de reserva, não podendo os passageiros fazer o pagamento em numerário ou outras formas de pagamento, segundo proposta de alteração ao diploma do Governo feita pelo PSD. O CDS-PP optou pela abstenção em todas as alíneas votadas no artigo “preço e pagamento do serviço”.
Os prestadores de serviço podem aplicar uma tarifa dinâmica, a qual não pode ser superior ao valor decorrente da aplicação de um fator de majoração de 100% ao valor médio do preço cobrado pelos serviços prestados nas 72 horas imediatamente anteriores por esse operador.
Multas
A nova lei prevê que as infrações à regulamentação sejam sancionadas com coimas entre 2.000 e 4.500 euros, no caso de pessoas singulares, ou de 5.000 a 15.000 euros, no caso de pessoas coletivas.
A principal multa será aplicada àquele que preste serviços de TVDE fora da plataforma eletrónica de reserva. Outro exemplo de multa será aplicado a quem venha a recolher passageiros na via pública, ou ainda aos motoristas que operem sem se encontrarem inscritos na plataforma eletrónica de reserva.
O produto das multas reverte em 60% para o Estado, 20% para o IMT e 20% para a entidade fiscalizadora.
A implementação da lei hoje aprovada será objeto de avaliação pelo IMT, em articulação com a AMT, três anos após a sua entrada em vigor.
O IMT, por seu turno, terá de elaborar um relatório final que deverá apresentar propostas de ajustamento das regras legais e regulamentares em vigor, sendo posteriormente submetido a parecer por parte da AMT.
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