Assunção Cristas, que teve a primeira palavra, começou por dizer que estava neste debate para “mostrar o que é o projeto do CDS, um projeto de centro-direita” para um país “numa altura muito crítica”. O estado crítico do país, explicou-o, prende-se na tendência deste em “virar à esquerda”. Por isso, viria a dizer depois, o CDS propõe-se como a “alternativa” e não acredita que estas “eleições estejam feitas e não valha apena ir a jogo”.
Inevitavelmente, Cristas trazia na pasta o tema "sei o que fizeste em outubro há quatro anos". E quando o moderador perguntou sobre um eventual acordo com o PS, a líder centristas tinha a resposta pronta:
“O Partido Socialista poderia ter optado por apoiar as forças políticas que tinham saído vitoriosas das eleições e dar estabilidade para que estas pudessem prosseguir um caminho de crescimento e reformas estruturais no país, mas optou por outro caminho, o de se juntar às esquerdas e, no fundo, deixar o país entre parênteses durante quatro anos”.
Mas a primeira frase taxativa viria à segunda investida do jornalista: “António Costa tem várias alternativas ao seu dispor. O CDS não é uma delas”. A líder dos centristas assumiu, depois, que o CDS foi e irá continuar a fazer “uma oposição muito firme e sempre construtiva”.
António Costa respondeu sem acusar aparente emoção com a indisponibilidade de Cristas (aliás, sobejamente conhecida). Destacou que entre o PS e o CDS há uma “enorme diferença”, que essa diferença reside na forma como os partidos se veem e se colocam na sociedade — usando exemplos como Ensino Superior, a Educação e Fiscalidade — para concluir que “entre o PS e o CDS há um enorme fosso”.
“De facto há um fosso grande entre nós”, concorda Cristas. “O Partido Socialista prometeu virar a página da austeridade e criou a carga fiscal máxima, nunca vista em Portugal”, continuou, acrescentado que as famílias e as empresas estão “asfixiadas”. “Achamos que é preciso libertar as famílias e as empresas dessa carga fiscal excessiva e é preciso permitir às pessoas construir os seus sonhos de vida”, respondeu.
Estudar ou pagar? O caso do Rui e do João e a (des)igualdade no Ensino Superior
“Sabe qual foi a média mais elevada em Portugal nesta entrada?”, questionou Assunção Cristas, aludindo a um dos exemplos dados anteriormente por António Costa — em que referiu uma proposta do CDS sobre a possibilidade de os alunos sem vaga na universidade poderem pagar para entrar.
“Foi Engenharia Aeroespacial no Técnico: 18,88”, responde à sua própria questão. E é nesse momento que conhecemos o exemplo do Rui.
“O Rui teve 18,6 de entrada; não ficou. Qual é a escolha que tem? Ou fazer melhoria de notas ou ir trabalhar ou para a Universidade Politécnica de Madrid e aí conseguir fazer o seu curso”.
Cristas continua: “Ao mesmo tempo há 17 vagas reservadas para alunos estrangeiros fora da União Europeia, que pagam uma propina superior aquela que pagam os nossos alunos. E questiona: “[A proposta do CDS] está a retirar direitos a alguém ou está alargar?”.
“Está a alargar”, na perspetiva de Cristas. E a “dar alternativas”, permitindo “às universidades, ao abrigo da sua autonomia, criar vagas concorrencias”.
António Costa, discorda e responde que esta proposta “está a subverter os critérios”, acusando o CDS de passar a mensagem de que “quem tem dinheiro não precisa de ter nota para entrar na Universidade" e que "quem não tem dinheiro tem de estudar e provar o mérito". "Isso é desigual”, acusou.
“Vai dizer isso ao Rui, que teve 18,6, que tem mérito, que não pode aceder às 17 vagas para alunos que vêm de fora e que vai estudar para Madrid se a família tiver dinheiro para pagar…?”, questiona novamente Cristas.
Costa responde que não vai, mas que também não vai “dizer ao João, que teve 18,8, que não precisava de ter estudado, que podia até ter tido 17, e que se tivesse dinheiro para pagar podia entrar”.
“Queremos viver numa sociedade onde o Estado organiza e cria oportunidade para todos, independentemente do dinheiro que têm, e não numa sociedade da desigualdade onde quem não têm dinheiro têm de estudar e quem tem não precisa de estudar porque têm os pais que lhe pagam a propina”, remata Costa.
A habitação e as “vítimas” da lei Cristas
O tempo de resposta já ia longo para Cristas, quase o dobro do seu adversário, pelo que a justificação sobre a questão da habitação teve de ser apressada a pedido do moderador.
“O que nós precisamos é de ter mais oferta na habitação e, portanto, simplificar procedimentos, garantindo que a oferta aparece rapidamente, e ter o património do Estado ao serviço de uma política de habitação para a classe média”, defendeu Assunção Cristas.
Na resposta, Costa lembrou que a líder dos centristas é autora da “lei das rendas, que liberalizou sem regras o mercado do arrendamento, não protegendo os idosos, os doentes ou as famílias com membros portadores de deficiente, e que criou uma onda de despejos e especulação imobiliária”. “Grande parte do trabalho desta legislatura foi conseguir dar garantias às vítimas da sua lei”, ressalvou, acusando depois o CDS de colocar o “direito de propriedade no centro das políticas públicas da habitação”.
Quanto vale uma criança
O terceiro pilar que separa “radicalmente” — palavras de António Costa — os dois partidos, está no domínio fiscal: o coeficiente familiar. Costa lembrou que o PS propõe que “se aumente progressivamente a redução em função do número de filhos, para apoiar as famílias que querem ter um segundo e terceiro filho” e não “que se aumente proporcionalmente ao rendimento, para que quem ganha mais, reduza mais”.
“As crianças valem todas o mesmo”, disse Costa.
“Essa é uma coisa que nos distingue, é que as crianças não valem dinheiro”, respondeu Cristas.
A maior carga fiscal e a promessa de não aumentar impostos
O debate já ía a meio e houve necessidade de intervenção na ordem dos temas por parte do moderador, o jornalista Pedro Pinto. “Vamos avançar”, pediu. À mesa é deixada uma questão: que compromisso estabelecem aos portugueses quanto a uma descida de impostos nos próximos quatro anos.
“O nosso objetivo é continuar a reduzir os impostos, como fizemos ao longo desta legislatura”, respondeu António Costa. Mais concretamente: “relativamente às empresas, aumentar as deduções para poderem investir, reforçarem o seu capital e instalarem-se no interior; manter a redução do IVA na restauração que foi fundamental para muitos dos estabelecimentos e na criação de milhares de postos de trabalho; incentivos fiscais às famílias para terem os filhos que desejam e incentivos fiscais para que os senhorios possam arrendar as casas a uma renda mais acessível”.
Questionado sobre se consegue explicitar quanto é que uma família de classe média vai pagar a menos ao longo dos próximos anos, Costa defendeu-se com a resposta de que irá trabalhar para “aumentar o número de escalões do IRS” e prometeu centrar-se, na próxima legislatura, nos rendimentos da classe média.
Assunção Cristas, por sua vez, disse que o CDS é “muito mais ambicioso”. “Achamos que deve haver uma libertação efetiva da maior carga fiscal de sempre”, voltou a referir.
Costa ripostou: “Temos uma carga fiscal menor do que aquela que teríamos se o governo do qual a doutora Assunção Cristas fez parte tivesse continuado a governar”. Assumindo, depois que “a carga fiscal subiu, é verdade”, justificando essa subida com o crescimento da economia.
Se Assunção Cristas disse olhar para o programa do PS e ver nele "um aumento de impostos", principalmente em medidas como o englobamento de rendimentos de capital ou de rendimentos prediais, Costa acusou o programa do CDS de ser "aventureiro", que os números apresentados centristas "são simpáticos para eleitor ouvir" e que "a última coisa que os portugueses querem é que os arrastem de novo para uma crise orçamental".
Como será no dia 7 de outubro
Podia ser a resposta para um milhão de euros, mas foi para um minuto — já que o tempo escasseou e por debater ficaram ficaram temas como o das desigualdades no interior.
Questionada sobre eventualidade de o CDS eleger menos de 18 deputados e sobre a sua liderança, Assunção Cristas diz estar apenas preocupada com o país, aquele que não "tem uma alternativa à esquerda que seja viável". Olhando diretamente para a câmara, dirigiu-se aos eleitores de centro-direita para os avisar do "perigo" de acordar no dia 7 de outubro com um "parlamento dois terços à esquerda". Perante "esse risco enorme para o país" ressalvou que o "voto no CDS é um voto seguro".
"Não acredito num país bem governado nem com maiorias absolutas de um só partido e também não acredito num partido governado com uma maioria à esquerda", defendeu.
O líder do PS, por sua vez, disse desejar que os portugueses possam acordar "tranquilos" a 7 de outubro, "sem receio de entrar em aventuras de reduções fiscais que acabem num enorme aumento de impostos ou das contas públicas". Dirigindo-se também ao país, disse que os portugueses sabem que o "PS, desde que Mário Soares o fundou, é o partido do bom senso, do equilíbrio e da estabilidade.
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