“É inquestionável a persistência de uma perceção geral de ineficiência e de ausência de respostas globais adequadas, perceção essa claramente alimentada por processos mediatizados, normalmente processos penais de grandes dimensões e envolvendo figuras com notoriedade pública. Muitos desses processos têm, de facto, tempos de vida socialmente insuportáveis, numa era em que a verdade se tornou instantânea”, afirmou.
Numa intervenção realizada em audição regimental na Assembleia da República, a governante vincou a “leitura normativa” da importância da celeridade na justiça e que “o processo equitativo (…) não deve ceder à tentação da urgência”, mas reconheceu que a lentidão pode ter consequências ao nível da eficácia e ser usada como uma arma por autoritarismos.
“Concordamos que a justiça não tem de se acomodar a expectativas individuais. Mas entendemos hoje, como antes, que é necessário aproximar o tempo da justiça de expectativas sociais razoáveis, sob pena de inadequação, de ineficácia e de instrumentalização por pulsões autoritárias”, observou.
A ministra da Justiça não descartou a realização de “mudanças” ou a necessidade de “alterar regimes”, sobretudo por força da transição digital, que considerou acarretar “um amplo conjunto de interrogações, de natureza jurídica, ética e social” sobre a sociedade e, em particular, sobre o setor judicial.
“Como impedir que a hipercomplexidade das formas processuais seja reproduzida no ambiente digital? Como evitar a tentação de aumentar a extensão das peças, em resultado da facilidade de pesquisa e recolha de informação? Como impedir que grande parte da população veja aumentadas as dificuldades no acesso ao direito por falta de competências digitais? Como atenuar os riscos associados à utilização, nas decisões, da inteligência digital?”, questionou.
Defendendo “o indeclinável dever de não interferir”, Francisca Van Dunem catalogou este princípio como uma “regra de ouro” e sublinhou que “não pode, sob pretexto algum, ser quebrada” pelo Governo, mesmo que tenha a responsabilidade sobre o sistema de justiça e que a pressão mediática siga nesse sentido. Referiu que a qualidade das decisões judiciais está em linha com os outros Estados-membros da União Europeia.
“O nível de escrutínio público a que está hoje sujeita a atividade dos tribunais, (…) associada à expressão quantitativa dos recursos interpostos das decisões judiciais, consente-nos a conclusão de que, em geral, no plano da qualidade de decisão, existe um padrão que não conflitua com as expectativas comunitárias”, finalizou.
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