Para concretizar a exumação dos restos mortais do ditador - uma medida que tem a oposição da família de Franco - o governo do primeiro-ministro Pedro Sánchez optou por um decreto-lei para retirar o corpo de um mausoléu no Vale dos Caídos, nos arredores de Madrid.
Esse mesmo decreto, que reformulará a chamada Lei da Memória Histórica, foi hoje aprovado em Conselho de Ministros, anunciou a vice-primeira-ministra Carmen Calvo. A partir de hoje a família de Franco tem 15 dias para se pronunciar sobre a decisão.
"Estamos a celebrar os 40 anos da Espanha democrática, de uma ordem constitucional estável e madura (…) e não é compatível com um monumento estatal em que a figura de Franco continua a ser glorificada", declarou numa conferência de imprensa.
Segundo Carmen Calvo, a exumação, que recebeu uma forte oposição da família de Franco, poderá ocorrer no final do ano.
O decreto-lei terá ainda de ser aprovado pelo Congresso dos Deputados, em data a definir. Os socialistas são minoritários, mas esperam obter a maioria com o apoio da esquerda radical do partido Podemos e dos nacionalistas bascos e catalães.
A vice-presidente do Governo disse que o Executivo escolherá o local para onde serão transportados os restos mortais de Franco se a família não se manifestar “a tempo e horas”, assegurando-lhe “uma sepultura digna”.
O objetivo é acabar com uma "anomalia democrática, um mausoléu de culto a um ditador", afirmou o porta-voz socialista no Senado, Ander Gil.
O governo baseia-se numa proposta aprovada no Parlamento em maio de 2017, quando o governo era comandado pelo conservador Partido Popular, e que determinava a exumação.
Desde 23 de novembro de 1975, três dias depois de sua morte, o corpo do general Franco está no 'Valle de los Caídos".
O local, um impressionante complexo a 50 km de Madrid, tem uma basílica com uma cruz de 150 metros de altura.
O militar que governou o país de 1939 a 1975 está enterrado no altar da basílica sob uma laje sempre coberta por flores frescas, assim como o fundador do partido fascista Falange, José Antonio Primo de Rivera.
No mesmo complexo foram sepultados quase 27 mil combatentes franquistas e 10 mil opositores republicanos, motivo pelo qual o ditador apresentou o "Valle" como um local de "reconciliação".
Os críticos, no entanto, consideram-no um insulto às vítimas da repressão franquista, porque os corpos dos republicanos, retirados de cemitérios e valas comuns, foram levados até o local sem o consentimento das suas famílias. Além disso, o conjunto monumental foi construído por quase 20 mil presos políticos, entre 1940 e 1959.
Pedro Sánchez defendeu a iniciativa poucos dias depois de chegar ao poder, alegando que um lugar como "Valle de los Caídos" seria inimaginável em países como Alemanha ou Itália.
A solução lógica seria enviar os restos mortais para o túmulo que a família Franco tem no cemitério El Pardo, na região de Madrid.
Os socialistas afirmam que desejam transformar o "Valle de los Caídos" num verdadeiro local de reconciliação e memória, sem apresentar detalhes sobre como pretendem modificar o espaço monumental de forte caráter católico e idealizado pelo próprio Franco.
Mas num país onde a memória sobre a guerra e a ditadura continua a ser um tema envenenado, todos os projetos esbarram na oposição da família do ditador, da Fundação Francisco Franco, que reivindica a sua memória, e sobretudo com a do PP, que insiste na necessidade de não reabrir "antigas feridas".
Os conservadores já informaram que pretendem recorrer ao Tribunal Constitucional contra a exumação, pois consideram abusivo o uso de um decreto-lei para um tema que não é urgente.
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