“Vamos reconstituir um pouco do que havia” antes do fogo de 15 e 16 de outubro de 2017, disse hà agência Lusa o presidente da ANCOSE, Manuel Marques.
Admitindo estar “um bocadinho mais otimista” do que nos meses que se seguiram à tragédia que dizimou milhares de animais das raças autóctones, com cujo leite se produz o queijo com denominação de origem protegida (DOP) Serra da Estrela, adiantou que “houve uma quebra de 20 a 30% na produção”.
No entanto, “a qualidade do queijo DOP não foi muito prejudicada”, apesar da escassez de pastos naturais associada à devastação causada pelo fogo em vários municípios da região demarcada, tanto nos campos de cultivo como nos espaços florestais.
Em muitos casos, os pastores tiveram de recorrer a palha e rações para alimentar as ovelhas das raças “churra mondegueira” e “bordaleira Serra da Estrela” enquanto as pastagens não se recompunham.
Até agora, a ANCOSE "já distribuiu cerca de 400 borregas desmamadas" para futura reprodução pelos associados que perderam efetivos no incêndio ou que pretendam aumentar os seus rebanhos.
“E vamos repor mais 400 entre 2018 e 2019”, adiantou o jurista Manuel Marques, explicando que a este esforço da associação, com sede em Oliveira do Hospital, distrito de Coimbra, juntam-se idênticas iniciativas de outras entidades e dos próprios criadores.
O presidente da ANCOSE revelou que, para surpresa dos pastores, “verificou-se um aumento da produção de leite” na última primavera, novidade que pode ter resultado da pluviosidade prolongada e do consequente renascimento dos pastos nas zonas ardidas, designadamente nos meses de abril, maio e junho.
Apesar de a produção deste ano do queijo DOP Serra da Estrela ter sido afetada pelos incêndios, este ano em geral “foi cumprida a resposta” às cadeias de distribuição que comercializam este bem alimentar de qualidade reconhecida em Portugal e no estrangeiro.
Manuel Marques entende, no entanto, que o Estado tem de “tomar medidas que incentivem” a criação de raças ovinas da Serra da Estrela, a fim de evitar o seu desaparecimento.
Nesta matéria, “os governos têm sido amorfos”, já que as ovelhas regionais podem em média produzir dois litros de leite por dia, muito aquém da capacidade das raças exóticas, que chega a duplicar.
“Empobrecer alegremente já lá vai”, alertou o presidente da ANCOSE, ao esclarecer que as exóticas asseguram aos pastores maiores produções, “mas a qualidade do leite não é a mesma”.
Na sua opinião, “o Governo tem de deitar mãos à obra, tem de tomar posições rápidas” para que este produto genuíno não se extinga.
Perante a baixa de produção do queijo DOP Serra da Estrela, geralmente ligada à pecuária familiar, não se verificou, desde 15 de outubro de 2017, “um aumento exponencial” do número de projetos industriais concorrentes, referiu Manuel Marques.
O incêndio que eclodiu há um ano no concelho da Lousã, distrito de Coimbra, e alastrou a outros municípios da região Centro, dizimou milhares de animais domésticos e selvagens, incluindo ovelhas e cabras, destruiu explorações agrícolas e florestais, indústrias, habitações e infraestruturas públicas.
Cinquenta pessoas morreram e 70 ficaram feridas na sequência dos incêndios de 15 e 16 de outubro, que também destruíram total ou parcialmente cerca de 1.500 casas e mais de 500 empresas.
Das 50 vítimas mortais, 25 ocorreram no distrito de Coimbra (13 das quais no concelho de Oliveira do Hospital e as restantes 12 nos municípios de Arganil, Pampilhosa da Serra, Penacova e Tábua) e 17 em Viseu (Carregal do Sal, Mortágua, Nelas, Oliveira de Frades, Santa Comba Dão e Tondela).
Os restantes óbitos foram registados na autoestrada que liga Aveiro a Vilar Formoso (A25), nas zonas de Sever do Vouga (Aveiro) e de Pinhel (Guarda), e no concelho de Seia (Guarda).
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