Em missiva dirigida ao Fórum Penal, o advogado Francisco Teixeira da Mota mostrou-se indignado com a posição assumida pelo Fórum Penal, revelando renunciar "com efeitos imediatos" à qualidade de membro daquela associação, que, em seu entender, pretende "impedir que uma Comissão Parlamentar de Inquérito tenha acesso a informações eventualmente relevantes para os seus objectivos", através do depoimento de Rui Pinto.
Francisco Teixeira da Mota esclarece que deixa de pertencer ao Fórum Penal não por desconsideração com os princípios constitucionais invocados pela Associação de Advogados Penalistas, mas pelo que esta "omite", notando que o Fórum Penal transmitiu publicamente uma "tomada de posição cúmplice com o imenso universo da criminalidade económica", situação, essa sim e a seu ver, faz "perigar a democracia".
"Pretender que os deputados da Assembleia da República, no âmbito de uma Comissão Parlamentar de Inquérito, não possam ouvir um cidadão (Rui Pinto) que consideram poder contribuir para o esclarecimento da verdade é uma tentativa de silenciar quem possa contribuir para a descoberta da verdade e de, lamentavelmente, cercear a liberdade dos deputados", critica Francisco Teixeira da Mota.
O advogado de Rui Pinto sublinha ainda que, tal como o Presidente da Assembleia da República referiu, espera que os resultados desta Comissão Parlamentar de Inquérito ao Novo Banco "correspondam às altas expectativas", lembrando, a propósito, ter "bem presente que a crise resultante da derrocada do Banco Espírito Santo (BES) teve consequências devastadoras para o país".
"Ignoro o que o Rui Pinto terá para dizer no âmbito da Comissão Parlamentar de Inquérito, mas parece-me absolutamente inaceitável esta tomada de posição pública do Fórum Penal pelo que entendo dever deixar de fazer parte" desta associação, conclui o advogado, enfatizando que tal renúncia tem "efeitos imediatos"
Na passada sexta-feira, O Fórum Penal pediu ao presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, e ao presidente da comissão de inquérito ao Novo Banco, Fernando Negrão, que Rui Pinto não seja ouvido no parlamento, por considerarem violação da Constituição.
"Não permita que seja violada a Constituição ao admitir como prova no Inquérito Parlamentar sobre o Novo Banco aquela que foi obtida com acesso criminoso aos sistemas informáticos de advogados, magistrados e instituições públicas e privadas", lia-se na carta do Fórum Penal, a que a Lusa teve acesso e, posteriormente, publicada no Twitter de Rui Pinto.
Entre os signatários da carta encontra-se o Conselho Consultivo da associação, onde figuram nomes como o do presidente Germano Marques da Silva, João Medeiros, Manuel Magalhães e Silva, Paulo Saragoça da Matta, Raúl Soares da Veiga, Rogério Alves, Rui Patrício ou Teresa Serra.
A carta do Fórum Penal enviada a Ferro Rodrigues foi também subscrita pelos membros da Direção da associação Cláudia Amorim, João Barroso Neto, João Matos Viana, Pedro Duro, Sofia Ribeiro Branco e Vânia Costa Ramos.
Os signatários defendem, no documento, que "os titulares de cargos públicos não têm o direito de perdoar crimes nem de se servirem do produto desses crimes, sejam quais forem as motivações", considerando que "ao admitirem-no, são cúmplices dos atos criminosos e estimulam os criminosos na senda do crime".
Os advogados consideram que "o justo processo ou processo equitativo é um dos pilares fundamentais do Estado de direito democrático", consagrado no número 8 artigo 32.º da Constituição, que diz serem "nulas todas as provas obtidas mediante tortura, coação, ofensa da integridade física ou moral da pessoa, abusiva intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações".
"São as chamadas proibições de prova, quer quanto aos meios usados para a sua obtenção quer na sua invalidade processual", que constituem a marca mais significativa do processo democrático" e "assinalam o repúdio político pelos métodos totalitários", alegam os advogados na carta.
Os signatários consideram que "se assim é na investigação criminal, por maioria de razão deve ser, tem de ser também nas investigações de cariz político, nomeadamente nos Inquéritos Parlamentares".
Os advogados consideram que os órgãos e agentes do Estado, "imbuídos de um certo populismo de inspiração mediática que vem conspurcando os valores que ainda há pouco eram considerados estruturais do Estado de direito democrático" acabam por não hesitar "em lançar mão de procedimentos de inspiração guerreira que desprezam, esmagam e violam as normas e os valores que a Constituição consagra".
Referindo-se indiretamente à forma como Rui Pinto obteve informação, através do acesso a servidores de várias empresas, os signatários entendem que "as boas intenções não justificam nem desculpam os maus atos".
Na sua conta na rede social Twitter, Rui Pinto replicou que "sucedem-se as tentativas" de o "tentar silenciar e impedir" que "seja ouvido na Comissão Parlamentar de Inquérito".
"Alguns senhores têm medo! Muito medo!", exclamou o 'hacker' na publicação.
Rui Pinto, de 32 anos, responde por um total de 90 crimes no caso 'Football Leaks': 68 de acesso indevido, 14 de violação de correspondência, seis de acesso ilegítimo, visando entidades como o Sporting, a Doyen, a sociedade de advogados PLMJ, a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e a Procuradoria-Geral da República (PGR), e ainda por sabotagem informática à SAD do Sporting e por extorsão, na forma tentada. Este último crime diz respeito à Doyen e foi o que levou também à pronúncia do advogado Aníbal Pinto.
O criador do ‘Football Leaks’ e alegado responsável pela divulgação do escândalo ‘Luanda Leaks’ encontra-se em liberdade desde 07 de agosto, “devido à sua colaboração” com a Polícia Judiciária e ao seu “sentido crítico”, mas está, por questões de segurança, inserido no programa de proteção de testemunhas em local não revelado e sob proteção policial.
No âmbito da Comissão de Inquérito ao Novo Banco, o PAN pediu uma audição a Rui Pinto, "para que apresente os documentos que afirma comprovarem um desvio de 600 milhões de euros através da criação de empresas meramente instrumentais, depósitos fictícios, e transferências bancárias para ‘offshores’ como as Ilhas Virgens Britânicas e as Seychelles”.
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