A decisão – passível ainda de recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa -, a que a agência Lusa teve hoje acesso, surge na sequência de um requerimento apresentado pela defesa do cantor a pedir ao TIC de Lisboa que “declare a perda pela CNM [Companhia Nacional de Música] da qualidade de assistente e consequentemente determine a suspensão provisória do processo”, ficando válido o acordo assumido em novembro do ano passado.
A 27 de novembro, todas as partes alcançaram um princípio de acordo, proposto pela juíza de instrução criminal Maria Antónia Andrade, que previa a suspensão provisória do processo durante quatro meses, na condição de, no prazo de 60 dias, Tony Carreira entregar 10.000 euros à Câmara da Pampilhosa da Serra, para apoio aos danos causados pelos incêndios, e mais 10.000 euros à Associação das Vítimas do Incêndio de Pedrógão Grande.
O compositor Ricardo Landum, também arguido, teria igualmente de pagar, nos 60 dias, 2.000 euros a uma instituição particular de solidariedade social à sua escolha.
Contudo, na resposta escrita enviada pelo proprietário da CNM ao TIC de Lisboa, Nuno Rodrigues acabou por rejeitar o acordo, que só seria válido se todas as partes o aceitassem, incluindo a editora, como assistente no processo, qualidade em que foi admitida pelo tribunal ainda na fase de inquérito.
Nessa ocasião, a defesa de Tony Carreira recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), que manteve a editora como assistente no processo, estando ainda pendente um recurso no Supremo Tribunal de Justiça, após novo recurso do cantor, para uniformização de jurisprudência.
Perante o recuo de Nuno Rodrigues em aceitar o acordo, a defesa de Tony Carreira avançou com um novo requerimento a reiterar a “falta de legitimidade” da editora para continuar a ser assistente no processo.
O TIC de Lisboa veio agora dar razão ao cantor, decisão que tem como consequência direta “a desnecessidade da concordância” da editora para a manutenção do acordo de novembro, proposto pela juíza e aceite pelo Ministério Público e arguidos, evitando dessa forma que Tony Carreira vá a julgamento. Mas o Ministério Público e a editora podem ainda recorrer desta decisão para o TRL.
A juíza Maria Antónia Andrade explica que a admissão da Companhia Nacional de Música como assistente, ainda na fase de inquérito, “não é algo imutável”, podendo ser apreciada posteriormente em virtude dos desenvolvimentos do processo.
“Na fase de inquérito, a decisão sobre a legitimidade para intervir como assistente é aferida em face da factualidade denunciada e em investigação. Após a acusação [do Ministério Público], tal legitimidade tem de ser aferida em função desta, uma vez que é a acusação que fixa o objeto do processo”, indica o despacho judicial.
A acusação refere que a CNM, fundada em 1993, é “uma referência no mercado editorial”, que se dedica à edição de variados géneros musicais. Acrescenta que, no âmbito da sua atividade, "editou e promoveu uma coleção de 'covers' [nova versão de uma música já existente], tendo pago à Sociedade Portuguesa de Autores os respetivos direitos".
O TIC de Lisboa diz que a acusação não refere “que 'covers' foram feitos pela assistente, de que canções, se das referidas na acusação ou de outras, quando tal foi feito, quanto foi pago pela assistente e a quem” e quais os “prejuízos” que teve.
“Considerando a factualidade descrita na acusação […] não pode considerar-se que a Companhia Nacional de Música é ofendida nos autos. Nada se refere na acusação sobre os 'covers' que efetivamente fez, de que obras e quanto pagou e a quem”, sustenta o despacho.
Assim, a juíza de instrução criminal Maria Antónia Andrade retirou a qualidade de assistente à editora, que foi quem apresentou a queixa-crime, em 2012, que deu origem ao processo. Já a procuradora do Ministério Público Cláudia Ribeiro, na resposta ao requerimento de Tony Carreira, defendeu, por seu lado, que “a ofendida tem legitimidade” para ser assistente.
“Pese embora o referido pelo Ministério Público e pela Companhia Nacional de Música, considero que neste momento, e considerando a acusação, a Companhia Nacional de Música carece de legitimidade para intervir nos autos como assistente, razão pela qual, e como requerido pelos arguidos, declaro a perda da qualidade de assistente da Companhia Nacional de Música, a qual doravante deixará de intervir nos autos com tal qualidade”, justifica o despacho judicial.
Tony Carreira está acusado de 11 crimes de usurpação e de outros tantos de contrafação, enquanto Ricardo Landum, autor de alguns dos maiores êxitos da música ligeira portuguesa, responde por nove crimes de usurpação e por nove crimes de contrafação.
Segundo o despacho de acusação do MP, a que a Lusa teve acesso em setembro, Tony Carreira e Ricardo Landum “arrogaram-se autores de obras alheias”, após modificarem os temas originais.
“Depois de ti mais nada”, “Sonhos de menino”, “Se acordo e tu não estás eu morro”, “Adeus até um dia”, “Esta falta de ti”, “Já que te vais”, “Leva-me ao céu”, "Nas horas da dor”, “O anjo que era eu”, “Por ti” e “Porque é que vens” são as 11 canções alegadamente plagiadas, de acordo com a acusação.
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