Como se não bastasse o fim das quotas leiteiras que impunham limites à produção no espaço comunitário, os produtores de leite continuaram este ano a ser penalizados pela retração da procura, ditada pelas novas tendências de consumo, pelo aumento da produção fora da Europa e pelo embargo russo, que dificulta o escoamento dos produtos agrícolas europeus.
Os produtores saíram à rua diversas vezes reclamando o regresso das quotas e contestando as importações e o que consideram ser “práticas comerciais abusivas” por parte da grande distribuição, mas, apesar de o Governo ter lançado um pacote de 17 medidas destinadas a apoiar o setor, o problema dos preços mantém-se.
O presidente da Federação Nacional das Cooperativas de Leite (FENALAC), Fernando Cardoso, lamentou o ano “muito difícil”, que resultou de situações que já vinham do passado e se traduziram numa “queda muito acentuada dos preços, que atingiu um pico por altura do verão”.
As boas notícias parecem ter ficado guardadas para o final do ano, com alguns sinais positivos no horizonte.
“Parece haver alguma recuperação das exportações, bem como aumentos consideráveis das cotações de produtos industrializados, como o leite em pó e a manteiga”, produtos “simbólicos” para a evolução no setor, disse o dirigente da FENALAC.
“Falta o passo final, que é refletir essas tendências de mercado nos produtores. Alguns compradores [indústria], sobretudo nos países do norte, já têm a perspetiva de fazer refletir essa melhoria, aumentando a remuneração dos produtores. No nosso mercado doméstico, essa tendência será mais lenta”, admitiu o mesmo responsável.
Em setembro, o preço pago aos produtores era de 27,10 cêntimos, em linha com a média comunitária de 27,79 cêntimos, mas no próximo ano “poderá haver um ajustamento dos preços”.
Tudo depende “das tendências globais, mas também do comportamento da distribuição”, sublinhou Fernando Cardoso, criticando “o grande garrote” das promoções que “pressionam os preços para valores irracionais”.
Também os suinicultores viveram um ano de crise e contestação, que o Governo procurou contrariar com linhas de crédito, redução nas contribuições para a Segurança Social e rotulagem obrigatória da carne, o que não impediu os preços de voltarem a cair para valores inferiores aos custos de produção.
“Estamos novamente abaixo dos custos de produção. A situação ainda não está tão grave como nos primeiros quatro meses do ano, mas quase”, adiantou o secretário-geral da Federação Portuguesa de Associações de Suinicultores (FPAS), António Simões Monteiro.
Segundo o responsável da FPAS, a produção “já está a praticar preços abaixo de 1,35 euros”, enquanto os custos de produção rondam os 1,45 a 1,55 euros por quilo.
Entre as razões da crise contam-se o facto de Portugal estar “ao lado do terceiro maior produtor mundial [Espanha]”, que consegue exportar para no mundo inteiro a preços competitivos com os quais os suinicultores nacionais não conseguem concorrer.
Os suinicultores promoveram, ao longo de 2016, várias ações de promoção do consumo da carne de porco nacional, realizadas em hipermercados, que responsabilizam em parte pela fragilidade dos produtores nacionais devido à política de “promoções em cima de promoções em cima de promoções”.
A grande distribuição, no entanto, não se revê no papel de “má da fita” e diz-se disponível para “dialogar com os produtores e apoiar a produção nacional”, garantindo o cumprimento da legislação comunitária e nacional em vigor.
Em março, a Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED) demarcou-se das dificuldades que afetam estes setores da pecuária, lembrando que a atual conjuntura “tem origem em questões relacionadas com o funcionamento do mercado nacional e europeu que só podem ser resolvidas com a intervenção das autoridades nacionais e europeias”.
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