“É robô, não lhe chame carros que eles ficam ofendidos”, diz o artista Leonel Moura, entre sorrisos, ao SAPO24 quando o abordamos junto à sua tela. Bem, a tela sim é do português, mas os traços nela desenhados são de responsabilidade repartida.
À entrada do palco AutoTech/TalkRobot, no pavilhão 3 da Feira Internacional de Lisboa (FIL), não passa despercebido: uma obra de arte feita a ser feita em tempo real por três robôs que riscam constantemente uma tela. Moura chama-lhe a “New Kind of Art”. Não há outra definição, diz-nos.
“Vou assinar esta tela agora e depois vamos meter uma nova. Vão ser duas telas nestes três dias”, explica-nos, acrescentando que ambas serão usadas em exposições e que vão ser colocadas à venda por um valor de 20 mil euros, cada uma.
“Sabe que o valor da arte tem a ver com o mercado, em nada tem a ver com o meu desejo. Como telas desta dimensão, também feitas por robôs, foram vendidas por esse preço, estas custam 20 mil euros”, conta-nos o artista que revela que esteve recentemente em Astana, no Cazaquistão, onde teve a oportunidade de ver uma série de telas produzidas por robôs. Uma dessas telas vai estar exposta em Lisboa a partir de sexta-feira (9 de novembro), no museu de História Natural, diz-nos em jeito de sugestão.
Arte com robótica não é uma inovação. Então em que é que este projeto assinado por Leonel Moura se destaca? Na criatividade atribuídas às máquinas.
“Eu sou pioneiro nesta arte exatamente porque em 2001 fiz uma coisa que nenhum artista tinha feito. A maioria dos artistas, mesmo aqueles que utilizavam máquinas, e até programação, tinham a vontade de controlá-las. Eu fui o primeiro a perceber que seria também interessante não controlar a máquina e ser ela própria criativa”, explica.
O sistema funciona com três robôs munidos de rodas e de uma caneta de feltro. Cada robô sensível a uma cor diferente: vermelho, azul e verde. Os robôs andam e, no início, com a tela a branco fazem vários traços aleatórios. Depois, passado algum tempo mudam de pressuposto e passam a pintar apenas onde já existe a sua cor, reforçando a presença daquela tonalidade em várias zonas da tela. A programação é feita pelo próprio artista, e o hardware é feito pela Behind Solutions que deu vida ao BeBot, o “enxame” de robôs construídos para a Expo2017,em Astana, e que foi ponto de atração na Web Summit.
“O que eu criei foi o processo, os robôs é que fazem as telas. A minha criação foi dar criatividade às máquinas. Aí é que eu sou criativo. Porque ser artista não é só pintar telas à mão”, remata.
“Estes robôs não me tiram nada, acrescentam. Nunca tive medo que um robô me roubasse o trabalho”
O tema da inteligência artificial tem dominado a sétima edição da Web Summit. Os medos e as vantagens têm estado em debate e no mundo da arte isso também acontece. Neste ecossistema onde a arte e a tecnologia se cruzam não há que ter medo garante Leonel Moura.
“Nunca tive medo que um robô me roubasse o trabalho. As pessoas têm muito pavor porque pensam errado. Estes robôs não me tiram nada, acrescentam. É mais um pintor que existe no mundo, há tantos pintores... e agora há robôs que também são pintores, qual é que é o problema? É mais, não é menos. ”, sublinha.
Para o artista português, que começou na fotografia, nos anos 90, e só no início do século se começou a dedicar-se à robótica, uma tela desenhada autonomamente por um robô tem “muito mais interesse” do que uma tela feita à mão. “Feitas à mão há milhões. Destas há pouquíssimas, são únicas. E representam um novo tipo de arte. Temos que perceber que as máquinas podem ser inteligentes e podem ser criativas. É normal. No futuro vão ter consciência”, garante o artista de 69 anos que diz que tudo isto não passa de um processo evolutivo tão natural como a vida em si.
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