“Interessa-me ser uma figura feminina, a figura estrangeira que vê Portugal à época com os olhos de quem vem de fora. E interessa-me o podermos falar de nós e de quem éramos e de como se vivia uma história de amor com esta urgência”, afirmou hoje a realizadora aos jornalistas, num intervalo das filmagens.
“Snu”, que se estreia a 27 de setembro, é protagonizado por Inês Castel Branco, no papel de Snu Abecassis, que fundou a editora Publicações Dom Quixote e desafiou uma sociedade portuguesa ao assumir, nos anos 1970, uma união de facto com Francisco Sá Carneiro, que no filme é interpretado por Pedro Almendra.
“Esta é uma história de amor e de coragem e é isso que me prende a este filme”, sublinhou Patrícia Sequeira, que assina a segunda longa-metragem de ficção depois de “Jogo de damas” (2016), a convite da produtora portuguesa Sky Dreams.
O argumento foi escrito por Cláudia Clemente, com consultoria histórica de Helena Matos, e baseia-se nas biografias sobre Snu Abecassis e Sá Carneiro e em documentação da época.
Helena Matos descreveu esta produção como “um filme arriscadíssimo” pelo contexto político que recupera, pela própria particularidade da relação entre a editora e o político, pela polémica em torno do acidente em que ambos morreram, e porque é ainda uma memória recente da História de Portugal.
“Os portugueses não estão habituados a ver ficção com as suas personagens vivas. Passam a vida a dizer que ainda não é o tempo de falar das coisas, quanto mais fazer ficção. (…) Isto mexe com muita coisa. É provavelmente dos filmes portuguesas mais arriscados, porque se têm feito grandes histórias de amor e liberdade, mas estava tudo morto, estava tudo na paz dos cemitérios. E aqui ninguém está na paz dos cemitérios”, disse.
Pedro Almenda e Inês Castel Branco contracenam pela primeira vez neste filme e ambos reconheceram que é um desafio.
O ator disse que tentou “chegar à pele de alguém que ainda está muito presente na memória dos portugueses”.
A atriz recordou que, na preparação para o papel, leu e viu tudo o que havia disponível sobre Snu Abecassis e complementou a pesquisa com uma viagem a Estocolmo, para perceber a cultura e a educação em que a editora se inseriu antes de ir para Portugal.
Snu Abecassis e Francisco Sá Carneiro morreram a 04 de dezembro de 1980, quando o avião Cessna em que viajavam se despenhou em Camarate, pouco depois de levantar voo de Lisboa.
Patrícia Sequeira recordou que “Snu” é uma história de ficção a partir de factos reais e que o foco é uma história de amor, por isso não recriará o acidente fatal. A narrativa terminará quando entram no avião, disse.
“O filme está carregado de coisas reais. Às vezes a realidade não é tão interessante, vamos por outros caminhos e, quando entramos na porta de intimidade, ninguém sabe”, disse.
Seis anos depois da morte de Snu, a mãe, Jytte Bonnier, escreveu a sua biografia, publicada em 2003, com prefácio de Marcelo Rebelo de Sousa, antigo presidente do PSD entre 1996 e 1999.
Em 1983, Agustina Bessa-Luís escreveu “Os meninos de ouro”, em que retrata a vida de Sá Carneiro com a mulher, Isabel, mãe dos seus cinco filhos, a paixão por Snu e a chegada ao poder.
Em 2007, Miguel Real publicou a novela “O Último Minuto na Vida de S.”, adaptada para teatro, e, em 2011, Luís Filipe Rocha fez o filme “Camarate”.
A jornalista Cândida Pinto também se debruçou sobre esta história, fazendo em 2005 um documentário e depois uma biografia.
“Snu” conta com um orçamento de pouco mais de um milhão de euros e tem apoio do Instituto do Cinema e Audiovisual, NOS, RTP e Câmara Municipal de Lisboa.
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