O público da poesia em Portugal é "mínimo, mas muito especial, exigente e atento", a crítica é "uma micro-nano-crítica" e a imprensa especializada tem uma circulação muito reduzida, notou hoje Rosa Oliveira, após receber o Prémio Literário Fundação Inês de Castro de 2017, na Quinta das Lágrimas, em Coimbra.
Apesar disso, a poeta sublinhou que lhe parece que a poesia, em Portugal, está "numa onda crescente", a julgar pelo "número de editoras, especialmente pequenas editoras - algumas delas nascidas sob a ameaça de extinção -, o número de leitores, as instituições que apostam na poesia e os inúmeros festivais de poesia" e grupos que se juntam "para ler e para chamar a poesia à baila".
Nesse sentido, Rosa Oliveira entende que se está a colocar a poesia, "ainda que timidamente, no lugar onde ela começou", cada vez mais "no centro", como forma de arte anterior até "à palavra escrita".
Da sua poesia, diz que tenta "apanhar uma fotografia daquilo que vai vendo e sentindo", referindo que está "longe do fantasma romântico e, por via, modernista e, por extensão, pós-modernista que encerra o texto em si mesmo e o fecha ao mundo", bem como se distancia da "arte livre e total, sem objeto, capaz de exprimir o inexprimível".
Durante o discurso, a poeta, que venceu o prémio literário pelo livro de poesia "Tardio", recordou o estranhamento e as perguntas que recebeu aquando da edição do seu primeiro livro, "Cinza", quando tinha 55 anos. "Porquê tão tarde?", perguntaram-lhe, ao que respondeu "Porque não?".
A voz de poeta "foi crescendo pequenina e irá perdurar ou não", disse Rosa Oliveira, deixando a interrogação e hipótese, que só poderá ter uma resposta "daqui a uns tempos ou daqui a uns livros", concluiu.
Na cerimónia, falou também o ensaísta e crítico literário Eugénio Lisboa, agraciado com o prémio de carreira, Tributo de Consagração, que, no ano passado, concluiu as suas memórias, com o último volume de "Acta est Fabula".
No discurso, o ensaísta sublinhou que o prémio o levou a refletir sobre "o que é isto de uma carreira literária", considerando que a carreira literária, na sua vida, não seria inevitável, tendo acabado por apanhar "o pontapé de saída" por José Régio, escritor que lhe pediu sempre para "escrever mais intensamente".
"Com muita pena minha, nunca na vida do José Régio lhe dei a satisfação de ser um escritor mais assíduo", sendo que só depois da morte daquele escritor é que começou a levar "mais a sério a escrita". "Talvez, por uma certa impulsão de remorso", confidenciou.
"Sinto-me realizado como artista, através daquilo que faço enquanto ensaísta, que pode injetar-se tanta criatividade num ensaio como num livro de teatro ou de poesia", frisou Eugénio Lisboa, contestando em "absoluto" a divisão entre a "dita escrita criativa" (teatro, poesia e romance) e a "não criativa" (ensaio, crónica e crítica).
O Prémio Literário Fundação Inês de Castro vai na 11.ª edição.
Rosa Oliveira sucede a Rui Lage, que, em 2016, venceu o galardão por "Estrada Nacional", numa lista de premiados anteriores que inclui ainda José Tolentino Mendonça, Gonçalo M. Tavares e Mário de Carvalho, entre outros.
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