António Ramalho Eanes, primeiro Presidente da República eleito em democracia, dissolveu o parlamento ao fim de cerca de três anos na chefia do Estado, em setembro de 1979, na sequência da demissão de Mota Pinto de primeiro-ministro.

Das eleições intercalares de 02 de dezembro de 1979 saiu vitoriosa a coligação pré-eleitoral Aliança Democrática (AD) composta por PSD, CDS e PPM, com aproximadamente 43% dos votos, que conseguiu maioria absoluta no parlamento e formou o VI Governo Constitucional, chefiado por Francisco Sá Carneiro.

O PS liderado por Mário Soares tinha sido a força mais votada nas legislativas anteriores, de 25 de Abril de 1976, com 35% dos votos, e esteve à frente dos dois primeiros governos constitucionais, um executivo minoritário e outro em coligação com o CDS, a que se seguiram três governos de iniciativa presidencial.

Passado um ano das eleições intercalares, a AD reforçou a sua maioria absoluta nas legislativas de 05 de outubro de 1980, em que obteve perto de 45% dos votos.

O Presidente Ramalho Eanes dissolveu pela segunda vez a Assembleia da República em fevereiro de 1983, já no seu segundo mandato, após a demissão do primeiro-ministro, Francisco Pinto Balsemão, que então chefiava o terceiro governo da AD, o que conduziu a nova mudança política.

Desfeita a AD, o PS voltou a ser a maior força nas legislativas antecipadas de 25 de abril de 1983, com 36% dos votos, sem maioria absoluta, seguido do PSD, com quem formou o IX Governo Constitucional, o chamado "Bloco Central", chefiado por Mário Soares – tendo primeiro Mota Pinto e a seguir Rui Machete como vice-primeiro-ministro.

A rutura do "Bloco Central", quando Aníbal Cavaco Silva assumiu a liderança do PSD, levou Ramalho Eanes a dissolver o parlamento pela terceira vez, em julho de 1985, no final do seu segundo e último mandato presidencial.

O PSD foi o mais votado nas legislativas de 06 de outubro de 1985, com perto de 30% dos votos, e formou o X Governo Constitucional, um executivo minoritário chefiado por Cavaco Silva, viabilizado pelo recém-criado Partido Renovador Democrático (PRD), a terceira força no parlamento, inspirada na figura de Ramalho Eanes.

Menos de dois anos depois, com Mário Soares no seu primeiro mandato como Presidente da República e Ramalho Eanes a liderar o PRD, este partido apresentou uma moção de censura que fez cair o Governo minoritário do PSD, aprovada também com votos a favor do PS, que tinha Vítor Constâncio como secretário-geral, do PCP e do MDP/CDE.

Soares dissolveu o parlamento em abril de 1987 e convocou eleições legislativas para 19 de julho, nas quais o PSD teve uma vitória histórica, conquistando a primeira maioria absoluta de um só partido em democracia, com mais de 50% dos votos, que deu origem ao XI Governo, chefiado por Cavaco Silva.

Quinze anos mais tarde, com Jorge Sampaio no seu primeiro mandato como Presidente da República, a demissão de António Guterres de primeiro-ministro provocou a queda do XIV Governo Constitucional. O PS tinha ficado a um deputado da maioria absoluta nas legislativas de 10 de outubro de 1999, com 44% dos votos.

Em janeiro de 2002, face à demissão de Guterres, Sampaio decretou a dissolução da Assembleia da República e marcou eleições para 17 de março de 2002, que o PSD venceu com 40% dos votos, somando com o CDS-PP mais de metade dos deputados.

Com esta reconfiguração da Assembleia da República, formou-se um executivo de coligação PSD/CDS-PP, o XV Governo, chefiado por José Manuel Durão Barroso.

No seu segundo mandato, o Presidente Jorge Sampaio dissolveu novamente o parlamento, em dezembro de 2004, quando Pedro Santana Lopes chefiava o XVI Governo, em substituição de Durão Barroso, que tinha deixado o cargo de primeiro-ministro para exercer as funções de presidente da Comissão Europeia.

Das eleições antecipadas de 20 de fevereiro de 2005 resultou a primeira maioria absoluta do PS no parlamento, alcançada com 45% dos votos, e tomou posse o XVII Governo Constitucional, chefiado por José Sócrates.

Com Cavaco Silva como Presidente da República, no início do seu segundo mandato, o parlamento foi dissolvido pela sétima vez, em abril de 2011, após a demissão do primeiro-ministro, José Sócrates, que estava à frente do XVIII Governo Constitucional – já sem maioria absoluta, tendo baixado de votação para cerca de 37% nas legislativas de 27 de setembro de 2009.

Na sequência desta dissolução, o PSD foi o vencedor das eleições antecipadas de 05 de junho de 2011, com cerca de 39% dos votos, voltando a somar com o CDS-PP mais de metade dos deputados, e as duas forças coligaram-se uma vez mais para formar o XXI Governo Constitucional, chefiado por Pedro Passos Coelho.

Primeira dissolução do parlamento aconteceu após crise orçamental em 1979

A primeira dissolução da Assembleia da República a seguir ao 25 de Abril de 1974 aconteceu, como agora, após uma crise orçamental, em 1979, que levou à demissão do então primeiro-ministro, Mota Pinto.

Carlos Alberto da Mota Pinto apresentou a demissão em 07 de junho de 1979, alegando "obstrução sistemática da Assembleia da República" à ação do IV Governo Constitucional – o segundo governo de iniciativa presidencial nomeado pelo Presidente Ramalho Eanes sem suporte no parlamento, depois do de Nobre da Costa.

O Orçamento Geral do Estado para 1979 tinha sido rejeitado numa primeira versão, logo na generalidade, em 22 de março daquele ano, e a segunda versão foi aprovada com alterações na especialidade, em 05 de junho, enquanto as Grandes Opções do Plano foram duas vezes rejeitadas.

As duas propostas de lei de Orçamento para 1979 tiveram votos contra de PCP e UDP e a abstenção de PS e PSD, tendo a segunda sido viabilizada graças aos votos a favor de um grupo de dissidentes da bancada social-democrata, que se somaram aos do CDS.

"No caso do Orçamento, após uma primeira reprovação da proposta governamental, a Assembleia da República acabou por aprová-lo com tais emendas que ele resultou desfigurado, bem diverso da proposta do Governo, com um défice corrente muito elevado que agravará ainda mais os sacrifícios que no futuro esperam os portugueses", declarou Mota Pinto, ao apresentar a sua demissão.

O primeiro-ministro acusou PS e PCP de darem as mãos na Assembleia da República contra "importantes diplomas" do Governo, "entravando a sua ação e procurando substituir-se-lhe na área da sua competência, para além de anunciar iniciativas, como a inaceitável alteração da Lei de Bases da Reforma Agrária".

Nos debates orçamentais realizados durante o mês de março, final de maio e início de junho de 1979 participaram, entre outros, Ângelo Correia, pelo PSD, António Guterres, pelo PS, e o atual secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, consta das atas a aplaudir a posição do seu partido contra a política económica e financeira do IV Governo, ainda marcada pelo acordo anteriormente assinado com o Fundo Monetário Internacional (FMI).

Passado mais de um mês desde a demissão de Mota Pinto, em 13 de julho de 1979 o Presidente da República comunicou ao país a dissolução do parlamento: "Portugueses, tendo levado tão longe quanto possível as consultas e diligências, e depois de ouvido o Conselho da Revolução, nos termos constitucionais, tomei a decisão que, perante as últimas circunstâncias, considero menos gravosa para o país na presente crise política: será dissolvida a Assembleia da República e haverá eleições legislativas intercalares".

Antes da dissolução, contudo, Ramalho Eanes constituiu um novo Governo de iniciativa presidencial, chefiado por Maria de Lourdes Pintassilgo, que desse "garantias de independência e neutralidade durante o período que mediará até às eleições legislativas" – que só marcou dois meses depois, para 02 de dezembro de 1979, quando concretizou a dissolução do parlamento, "precedendo parecer favorável do Conselho da Revolução", lê-se no decreto de 11 de setembro.

Mário Soares, que liderava o PS, o partido mais votado nas legislativas de 25 de Abril de 1976, e tinha chefiado na I Legislatura os dois primeiros governos constitucionais, opôs-se à decisão de Eanes: "É de todos conhecido o facto de nesta Assembleia existir uma larga maioria contrária à sua dissolução. Mas, não obstante isso, o Presidente da República, a nosso ver atendendo a pressões da direita, veio a optar pela dissolução da Assembleia da República".

Soares tinha proposto a Eanes uma solução maioritária do PS com deputados dissidentes do PSD que constituíram a Ação Social-Democrata Independente (ASDI), que o Presidente da República recusou.

Das legislativas intercalares de 02 de dezembro de 1979 saiu vitoriosa a coligação pré-eleitoral Aliança Democrática (AD) composta por PSD, CDS e PPM, que conseguiu maioria absoluta na nova composição do parlamento, que só durou um ano, completando a I Legislatura, nos termos na altura previstos na Constituição.

Em 27 de outubro, houve pela segunda vez na história da democracia portuguesa um chumbo do Orçamento do Estado, no caso, para 2022, igualmente logo na generalidade, com votos contra de PSD, BE, PCP, CDS-PP, PEV, Chega e Iniciativa Liberal.

A proposta apresentada pelo Governo minoritário do PS teve votos a favor apenas dos socialistas e abstenções do PAN e das deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira.

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, tinha avisado, duas semanas antes, que se o Orçamento fosse rejeitado haveria provavelmente dissolução do parlamento e eleições legislativas antecipadas, que estimou que se realizariam em janeiro.

À medida que um cenário de chumbo se tornava quase certo, o chefe de Estado deixou claro avançaria de imediato com o processo de dissolução do parlamento, embora reiterando ao mesmo tempo, uma mensagem de esperança num entendimento "até ao último segundo" antes da votação na generalidade.

Confrontado com a disponibilidade do primeiro-ministro, António Costa, para se manter em funções mesmo sem Orçamento aprovado, Marcelo Rebelo de Sousa considerou bom "o Governo continuar em funções e não se demitir", porque "se se demitisse agravava a situação crítica".

(Artigo atualizado às 11:47)

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