Anestesiologista de base, com "um forte interesse pela área da emergência médica e do doente crítico", António Marques da Silva é o presidente da Comissão de Gestão do Plano do Ministério da Saúde para a Jornada Mundial da Juventude 2023, que entra hoje na segunda semana.
Com um vasto currículo na coordenação de diversos eventos em matéria de saúde, o diretor do Hospital de Magalhães Lemos já tinha sido responsável pelo plano de contingência do Ministério da Saúde para a visita do Papa Francisco a Fátima, em Maio de 2017. Mas, desta vez, as coisas atingem outras proporções.
Sem despir a bata de médico, numa conversa por Zoom, conta ao SAPO24 que os maiores hospitais do país atualizaram e testaram os seus planos de contingência com simulações dos piores cenários e fala do reforço de meios e do desafio que é receber um milhão de peregrinos e o Papa.
"Entre 26 e 30 de Julho, até às 15 horas, houve 16.046 chamadas para o SNS 24, 235 relacionadas com a JMJ"
O plano que está em vigor desde o dia 26 de Julho, entra agora na segunda semana. Como está a correr e que tipo de ocorrências têm surgido?
Temos uma monitorização diária apertada e, agora, durante o período de maior risco, fazemos o ponto de situação várias vezes ao dia, seja entre as entidades nacionais e regionais do Ministério da Saúde, seja com a rede hospitalar. Temos uma noção do que está a acontecer no país e os problemas que vão surgindo são não só partilhados, mas também analisados, porque é importante resolvê-los, mas também tirar lições ou criar mecanismos para evitar que determinada situação se repita.
Dito isto, aquilo que deu mais que falar nos últimos dias foi uma ocorrência na zona de Leiria, que nada teve que ver com a Jornada Mundial da Juventude, uma intoxicação alimentar. Mas posso dizer que os mecanismos criados por causa da Jornada ajudaram a resolver o problema.
Ao longo do país tem havido muito poucas ocorrências e, normalmente, casos de muito pouca importância do ponto de vista de criticidade. Talvez as duas situações mais relevantes tenham acontecido em Aveiro: o registo de um internamento por pneumonia e o registo de um internamento por fratura de um membro.
Sobre o número de pedidos de apoio, posso partilhar, por exemplo, que desde o dia 26 de Julho até às 15 horas de dia 30, domingo, houve 16.046 chamadas para o SNS 24. Destas, 235, ou seja, 1,46%, foram de alguma forma relacionadas com a JMJ.
De resto, são coisas muito pouco urgentes, como alguém com uma irritação cutânea ou alguém que esteve demasiado tempo ao sol, e que têm sido facilmente resolvidas, muitas das quais nos postos de apoio, sem necessidade de chegar aos centros de saúde ou aos hospitais. Felizmente, tem corrido bem.
"O calor vai ser, provavelmente, o grande desafio que temos pela frente."
Qual o seu pior pesadelo para esta Jornada Mundial da Juventude?
Não gostaria de colocar a questão em termos de pesadelo, mas existem desafios e preocupações. Um desafio é lidar com a diversidade dos riscos - estamos a falar de coisas que têm a ver com a saúde pública, com emergência médica. Depois há as massas e há as particularidades da segurança do Papa. São múltiplas frentes.
Outro desafio tem a ver com a circunstância de estarmos em pleno Agosto, o calor. Provavelmente, perdoe-me a expressão, a maior ameaça. Daí a importância das recomendações divulgadas relativamente à hidratação, à proteção solar. O calor vai ser, provavelmente, o grande desafio que temos pela frente.
E há sempre a contingência relativamente a uma eventual situação de excepção; não estamos isentos de um acidente rodoviário. Quantos autocarros estão em circulação? Pode haver um acidente de viação, por isso é importante estarmos preparados para situações de trauma com múltiplas vítimas. Essa é uma das razões por que se envolveram os principais hospitais do país.
Há, francamente, um ponto de preocupação que é o da mobilidade - e uma coisa é ir para os sítios, outra é quando as pessoas querem ir embora, desmobilizar. Mas esse desafio é sobretudo da área da segurança, não tanto da saúde, mas pode ter consequências para a saúde. Temos de pensar nas diversas possibilidades ao longo do trajeto e criar cenários, ter plano A e um plano B para cada cenário.
"Estão envolvidos o Centro Hospitalar Universitário de São João e o Centro Hospitalar Universitário de Santo António, no Porto, o Centro Hospitalar Universitário de Coimbra, o Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte, o Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central, o Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental e o Hospital Beatriz Ângelo"
Quais são, exatamente, os hospitais envolvidos?
Quando digo principais, é no sentido dos de maior dimensão, aqueles que à partida têm maior capacidade de resposta. Também tem a ver com a distribuição dos eventos e do número de pessoas nesses eventos.
São o Centro Hospitalar Universitário de São João e o Centro Hospitalar Universitário de Santo António, no Porto, o Centro Hospitalar Universitário de Coimbra, o Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte, o Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central, o Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental e, fruto de haver eventos de grande importância na zona de Loures, o Hospital Beatriz Ângelo, que, apesar de não ter a mesma dimensão dos outros, não pode ser esquecido.
Como é que esses hospitais se prepararam para o que aí vem?
Todos estes hospitais atualizaram os seus planos de contingência relativamente à resposta com situação de múltiplas vítimas e fizeram simulacros, testaram esses planos para ter a certeza que as equipas de urgência estavam a par do que fazer em caso de acionamento.
"E também foram feitos testes de comunicações com o INEM de forma aleatória, sem hora combinada, nomeadamente com o Centro de Orientação de Doentes Urgentes (CODU) e os hospitais, via rádio, ou seja, utilizando o SIRESP (Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal). Sem comunicação não há plano de controlo e coordenação."
Houve falhas nesses testes?
Não, correu tudo bem. Do ponto de vista técnico as comunicações funcionam e do ponto de vista humano as pessoas estiveram atentas e responderam às chamadas. Falar pela rádio é diferente, talvez para quem está no pré-hospitalar seja o dia-a-dia e para quem já participou em equipas do INEM pode ser um procedimento fácil, mas para muitos outros profissionais não é o mesmo que falar ao telefone, são procedimentos que têm de ser treinados e tem de haver sempre alguém do outro lado disponível 24 horas por dia. E isso está previsto e foi testado ao longo de vários dias e funcionou bem.
Estes exercícios, a atualização dos planos e contingência e os simulacros, são importantes muito para além da Jornada Mundial da Juventude. Eu quase diria que a JMJ é um pretexto para lembrar, para olhar para aquilo com olhos de ver, para testar. Porque toda a gente fica muito preocupada quando existe um risco eminente, mas quando as coisas vão correndo normalmente o tempo vai passando e começam a esquecer-se as coisas.
"Uma das mais-valias disto é o legado, o que fica pós-Jornada. Não será exagerado dizer que o país fica mais seguro depois da JMJ"
Instala-se a rotina, uma certa acomodação?
Pode haver uma inundação, uma derrocada, um incêndio ou sabe-se lá o quê. Daí que a situação que mais nos poderá causar receio é a que não tem hora marcada. Por isso temos de utilizar este evento, ou outros eventos de grande envergadura, como pretexto para atualizar procedimentos para nos prepararmos para situações específicas e os seus riscos.
Uma das mais-valias disto é o legado, o que fica pós-Jornada. Não será exagerado dizer que o país fica mais seguro depois da JMJ.
Obviamente devo ser respeitoso para toda a rede hospitalar do país, mas sabemos que no dia-a-dia, mesmo sem catástrofes, se houver uma situação muito crítica, vai ter a um destes hospitais [de maior dimensão]. Que acabam por ser a rede de segurança do país.
Já agora, a propósito de legado, uma das coisas em que acho importante pensar é no que fica depois do esforço e do investimento, como é que isto é rentabilizado no futuro. E uma das coisas objeto de muito investimento foi a interoperabilidade entre sistemas de informação. Cada vez mais devemos decidir menos em função de achismos, "eu acho que", "tu achas que". É evidente que a experiência é importante, o bom senso é importante, mas cada vez mais devemos decidir em função de dados objectivos e fidedignos. Ter quadros onde esta informação possa ser projetada e cruzada é importante para a decisão.
"Foi criado um mecanismo para atribuir um número de utente a todas as pessoas, para poder gerir registo de doentes e prescrição de receitas"
Como está organizada esta Comissão?
A saúde tem um representante do INEM, um representante da Direção-Geral de Saúde e um representante da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo no centro de coordenação nacional da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil durante todo o funcionamento deste evento.
Além disso, há também uma sala de situação (de gestão e monitorização) do Ministério da Saúde, onde representantes de diversas entidades - esta comissão coordena 18 entidades ao todo, no contexto de entidades nacionais e regionais de saúde -, podem inter-atuar e onde temos informações online para ajudar na decisão.
Esta capacidade de dispor de informação em tempo real é uma ferramenta de gestão muito poderosa, que no futuro poderá ser útil, por exemplo, para os planos de Inverno, para os planos do Verão ou o acompanhamento de outros grandes eventos que possam vir a existir em Lisboa, que são cada vez mais. No passado recente tivemos coisas como o Festival Eurovisão da Canção ou o Web Summit, e há aqui uma ferramenta útil para a JMJ que fica para muitos outros eventos.
Vamos ter no país mais um milhão de pessoas, a maioria estrangeiros. Como se articula isto com a rede de cuidados de saúde primários e dos hospitais?
Foi criado um mecanismo para atribuir um número de utente a essas pessoas, para poder gerir as situações do ponto de vista do registo de doentes, prescrição de receitas, mesmo quando não se trata de um cidadão de um país da União Europeia ou de um país com protocolos com Portugal.
Essa situação também motivou o alargamento de número de farmácias abertas na zona da Grande Lisboa, de forma a facilitar o acesso aos medicamentos, e houve uma valorização das situações que já estão referenciadas pelos grupos - há crianças que vêm a este tipo de eventos na esperança de alguma benção.
Estamos a falar de pessoas entre os 14 e 30 anos, a imensa maioria é saudável. Mas há um segmento que, de facto, tem patologia crónica e é preciso ter resposta para ele. Nestes casos houve uma coordenação, as pessoas não vieram sem mais nem menos, houve um aviso dos casos e foram criadas soluções para essas situações.
Digo isto porque esta capacidade de registar e de tratar é importante por causa das prescrições, por exemplo. Já aconteceu pessoas esquecerem-se da medicação. Há que ter mecanismos para que essa medicação possa ser dispensada com todo o rigor.
"Linha SNS 24 vai ter atendimento em cinco línguas, mas poderá estender-se, com uma breve espera, a um total de 61 línguas"
O procedimento vai ser igual para pessoas do espaço Schengen (23 dos 27 Estados-membros da UE, incluindo Croácia desde o início deste ano, mais Islândia, Liechtenstein, Noruega e Suíça) e de países terceiros?
Não há descriminação do ponto de vista da nacionalidade no acesso aos cuidados e saúde, na prestação e no processamento dos cuidados. Há sim diferenças que têm a ver com quem tem cartão de saúde europeu ou vem de países com protocolos com Portugal, mas isso no processamento de eventuais taxas ou valores a pagar, mais nada. Aliás, a capacidade de atribuição de um número ao doente/processo para poder registar e processar uma situação, por exemplo, com emissão de receita, possibilita o acesso àqueles que são de países que não têm nenhum acordo com Portugal. Todos têm acesso à saúde.
Falou no esquecimento de medicamentos. O que deve fazer um doente que se esqueceu da insulina ou da bomba de asma, por exemplo?
Seja de que país for a pessoa tem sempre uma solução. Muito do que tem sido divulgado em termos de recomendações e informações no site da JMJ e no site do Ministério da Saúde, ou até pela aplicação da JMJ, foi acertado entre os diversos organismos. E aí está claro como é que as pessoas devem pedir ajuda.
E como é que devem pedir ajuda?
Se ligarem para a linha de saúde SNS 24, terão as orientações necessárias. Mas, se é uma situação que não coloca em causa o risco de vida, fará sentido ligar SNS 24. Se é uma situação de emergência, onde há risco de vida ou é eminente haver risco de vida, então devem ligar 112.
Será fácil contactar qualquer desses números, mesmo para estrangeiros?
Para facilitar a comunicação houve um investimento que também me parece importante realçar e que tem a ver com a capacidade de comunicar. Estamos com capacidade de manter no SNS 24 a comunicação 24 horas por dia em português e inglês, que acaba por ser a língua franca dos participantes e dos coordenadores dos grupos onde estão enquadrados os participantes.
Além disso, em conjunto com o Alto Comissariado para as Migrações, houve um trabalho que possibilita que tanto o SNS 24 como o CODU, que recebe as chamadas do 112, possam fazer um atendimento nas cinco línguas oficias, que incluem o espanhol, o francês e o italiano.
Ainda, se necessário, as pessoas podem ser atendidas em mais 17 línguas em tempo breve, que poderá ir até um total de 61 línguas, recorrendo a tradutores que podem não estar disponíveis imediatamente. Isto quer dizer que se a pessoa tiver dificuldade numa das cinco línguas oficiais, poderá facilmente comunicar com quem está do outro lado e transmitir o seu problema.
E este é outro legado importante: como somos um país com muitos turistas, independentemente da Jornada, no futuro esta articulação entre SNS 24, Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS) e CODU com o Alto Comissariado para as Migrações é uma parceria muito interessante, dará bons frutos para o funcionamento pós-jornadas.
"No dia 30 de Julho o tempo de resposta de chamada do SNS 24 era de 23 segundos"
A linha SNS 24 foi reforçada?
Sim, houve um reforço do SNS 24 para níveis perfeitamente capazes de lidar com uma avalanche de chamadas, se isso acontecer. Não tem acontecido. Mas tivemos a experiência da pandemia, em que, de facto, houve picos de chamadas, como há um ano, quando deixou de haver testes gratuitos de Covid-19, houve um pico importante de pedidos de esclarecimento. Portanto, já temos um histórico do que constitui um pico e houve reforço de pessoal no sentido de estarmos preparados.
Posso dizer que no dia 30 de Julho o tempo de resposta de chamada era de 23 segundos - e isto está a ser controlado ao segundo.
Fomos buscar informação ou know-how lá fora, aos países anfitriões de Jornadas?
Quando se analisa os casos acontecidos noutros países, a informação é genérica e escassa. Porque não houve capacidade de indexar determinado episódio de urgência à Jornada. Daí que haja registos espalhados por diversas instituições, mas não há informação, não há cruzamento de dados.
Pois bem, quisemos fazer algo diferente para nos facilitar a gestão deste processo e nos pontos de situação diários conseguimos perceber quantos contactos estão relacionados com a JMJ ao longo da rede de cuidados de saúde primários, dos hospitais, do INEM, da Cruz Vermelha, dos bombeiros. Existe esta capacidade de controlo, no bom sentido da palavra, de monitorização, que no passado não existia.
Portugal vai ser o primeiro país, porque queremos deixar esse legado e ser um bom exemplo sobre como é que se faz, a conseguir dizer qual foi o número de contactos com a saúde. E podemos até investigar o que aconteceu. Isto representa uma mais-valia em termos de transformação de dados dispersos, isolados, em informação tratada, que pode ser útil para a gestão e para o balanço.
E essa informação pode ser passada, por exemplo, para o próximo país a realizar a JMJ, com as devidas salvaguardas?
Com as devidas salvaguardas legais, de proteção de dados, a informação pode ser partilhada, no sentido de se perceber os riscos enfrentados na prática. Também tentámos avaliar isso em relação a outros países e chegou-se à conclusão que havia boa vontade, mas não havia dados muito concretos. Portugal vai marcar a diferença.
"As greves [de médicos] respeitam os serviços mínimos, por isso têm muito mais impacto no trabalho programado do que na urgência"
Tem-se falado na falta de médicos, na dificuldade de acesso a cuidados de saúde, consultas e tratamentos. Neste processo está envolvido apenas o SNS ou também o setor privado e social?
Só posso responder pela parte que me compete. E a parte que me compete é o público. No dispositivo público só temos entidades públicas. Agora, a Fundação da JMJ tem alguns acordos com privados, mas isso terá de lhes perguntar. O dispositivo do Ministério da Saúde tem em conta exclusivamente a rede pública. Depois no INEM existem interfaces com terceiros a nível hospitalar, porque coordena os meios da Cruz Vermelha e dos bombeiros, que são entidades que não pertencem ao Ministério da Saúde.
Demissões em hospitais, greves de médicos, recusa de horas extraordinárias. O atendimento de doentes vai sofrer constrangimentos por causa da JMJ ou houve um reforço de meios?
Mais uma vez, vamos ter de separar as águas entre aquilo que é da responsabilidade do Ministério da Saúde e aquilo que é da Fundação Jornada Mundial da Juventude. Não vou fazer comentários sobre as greves e a oportunidade ou não das mesmas, são questões dos sindicatos e de quem adere ou não à greve, ponto final. Sendo certo que as greves respeitam os serviços mínimos, que incluem os serviços de urgência. Por isso, essas greves têm muito mais impacto no trabalho programado do que na urgência.
Não devemos misturar s coisas. Não é uma situação que nos preocupe por aí além, porque acreditamos que dentro do SNS, apesar de tudo o que possa ser dito, existem respostas. Mais, devo dizer o seguinte: quando as pessoas criticam o SNS têm pouca cultura sobre o que existe por esse mundo fora. Temos um SNS excelente. Quando se considera o nível de acesso e o custo para o utente e se compara com realidades como a dos Estados Unidos ou de outros países ditos desenvolvidos, a realidade portuguesa, apesar dos seus constrangimentos, é muito melhor. Porque aqui, efetivamente, o nível de acesso e o custo para o utente não tem nada, mas mesmo nada a ver com o que acontece noutros países.
Isso deve tornar-nos menos exigentes?
Não. Isso quer dizer que, claro que sim, devemos ser exigentes relativamente ao funcionamento do sistema. Mas também devemos ser pragmáticos e devemos ser gratos e reconhecidos por aquilo que temos, porque há muitos outros que não têm. E estou a falar de países ditos mais desenvolvidos do que Portugal. O SNS, por muitos problemas que possa ter, é um bom SNS.
"Há neste momento mais 106 meios pré-hospitalares em circulação, 17 postos médicos avançados, 124 equipas apeadas, 76 postos de suporte básico de vida e quatro hospitais de campanha"
Voltando aos meios disponíveis, falou nos hospitais, nas comunicações e na monitorização, mas houve reforço de outros meios e há também médicos e enfermeiros que vieram do estrangeiro em regime de voluntariado.
Há neste momento mais 106 meios pré-hospitalares em circulação, um número apreciável, do INEM ou gerido pelo INEM (porque alguns são dos bombeiros ou da Cruz Vermelha), todos dentro do chamado Sistema Integrado de Emergência Médica. Isto, obviamente, reforça o dispositivo no terreno para dar conta do recado relativamente às ocorrências que já vão acontecendo e a um eventual acréscimo de pedidos por causa da Jornada.
Além disso, inicialmente tínhamos planeado dez, mas há 17 postos médicos avançados no terreno, ou seja, locais onde é possível proceder à estabilização do doente grave. Em complemento há mais 124 equipas apeadas e 76 postos de socorro ao nível de suporte básico de vida.
Os postos médicos avançados e as equipas apeadas são geridos pelo INEM, enquanto os 76 postos de suporte básico de vida são da responsabilidade da Fundação JMJ. E é aí que estão médicos e enfermeiros, e às vezes também alunos de Medicina e de Enfermagem, alguns do quais voluntários. Mas não confundir com o dispositivo do Estado, que é profissionalizado, ainda que seja verdade que no dispositivo pré-hospitalar haja envolvimento de voluntários da Cruz Vermelha e dos bombeiros.
Nos meios INEM há ainda a salientar os hospitais de campanha, que já são quatro, apesar de no início se falar em apenas dois, e que são certificados pela Organização Mundial de Saúde, o que significa que têm alguma exigência relativamente aos meios e capacidade de resposta.
"Sobre a saúde do Papa, há avaliação e validação externa, mas os meios de resposta são nacionais"
Por que motivo há mais hospitais de campanha do que estava previsto?
A razão de ser de termos aumentado o dispositivo foi baseada em duas premissas: por um lado a prudência, se era possível mobilizar, mobilizou-se, para estar à altura do desafio e ter alguma margem de manobra. Por outro lado, acreditamos que muitas situações poderão ser aqui resolvidas, não precisam de apoio hospitalar, ou poderão ser aqui estabilizadas e depois enviadas para o hospital mais adequado, ora em função das valências de que o doente precisa, ora em função da vaga.
Daí que a questão da gestão das vagas de cuidados intensivos a nível nacional seja também uma preocupação - e temos um mecanismo que nos permite saber isso a todo o tempo. Muitas vezes o que complica o funcionamento da rede hospitalar é as pessoas dirigirem-se em grande número e, muitas vezes, para o sítio errado, que implica transferências para outros locais. Muito do que está aqui em causa, no geral, mas também neste caso específico, tem a ver com a coordenação.
Não posso terminar sem falar do Papa. Coordenou a visita do Papa Francisco a Fátima, em Maio de 2017. Alguma semelhança?
Na realidade, as situações são um pouco diferentes, para não dizer muito diferentes. Em 2017 tínhamos um sítio, Fátima, e um registo temporal muito restrito. Agora, a Jornada Mundial da Juventude implica duas semanas, a primeira com eventos em 17 dioceses ao longo do país, 15 no continente e duas nas regiões autónomas. A segunda semana, a primeira de Agosto, tem diversos eventos ao longo dos dias.
O que quer dizer que a JMJ é um pouco mais complexa, a abrangência é maior, mais locais e também mais pessoas. A diversidade, seja em termos geográficos, seja em número de dias e de participantes, é muito diferente.
A saúde do Papa também é uma preocupação. Tem uma equipa de médicos que o acompanha, há em Portugal procedimentos de urgência em caso de necessidade? Como estão as coisas organizadas a este nível?
Relativamente ao Papa há avaliação e validação externa, mas os meios de resposta são nacionais. Naturalmente que há oficiais de ligação, ou seja, pessoas que estabelecem a ligação entre o plano que é feito e a sua avaliação, no sentido de estarem confortáveis com as soluções existentes. Há uma avaliação prévia e uma validação dos mecanismos de resposta, mas os meios que acompanham, que tratam, que transportam são nacionais.
Do ponto de vista formal, há regras relativamente ao sigilo, reserva de informação por questões de segurança. O que posso dizer é que há planos para as diversas contingências no que diz respeito ao Papa e há também soluções em redundância. E os elementos do Vaticano que tomam conhecimento e avaliam as nossas respostas também estão tranquilos com isso, senão não haveria esta visita. O dispositivo nacional empregue no pré-hospitalar ou no intra-hospitalar para a circunstância específica do Papa é robusto e perfeitamente capaz.
Como responsável pela comissão que coordena a área da saúde para a JMJ já tem um lugarzinho no céu?
[Ri] Não vou fazer comentários de ordem religiosa, mas, muito honestamente, é de ter orgulho no SNS.
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