Como é que se recorda um ano que se quer esquecer?
Quando as palavras nos faltam, e faltaram por várias vezes ao longo dos últimos meses, restam-nos as imagens. À distância — palavra-chave para resumir 2020 —, e fechados em casa, foi pela lente de fotojornalistas e repórteres de imagem que nos chegou mundo.
De Wuhan a Washington.
De Marega a George Floyd.
Da DGS ao SEF.
O estado de 2020 foi de emergência — e estas fotografias resumem o que foi o estado das coisas.
Emergência de saúde pública
A 30 de janeiro a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou emergência de saúde pública internacional.
Esta fotografia, pela lente do fotógrafo da Agência France Press (AFP) Hector Retamal, foi tirada neste dia, em Wuhan. A imagem é considerada uma das imagens do ano — fazendo parte da lista de fotografias selecionadas pelo britânico The Guardian, que considerou o chileno sediado em Xangai como o Fotógrafo de Agência 2020.
A fotografia do cadáver de um homem, que jazia no chão a poucos metros de um hospital, e a agitação em torno dele passaram a simbolizar a crise da Covid-19.
Dia B, de Brexit
O "casamento" de 47 anos entre o Reino Unido e a União Europeia chegou ao fim no dia 31 de janeiro. Seguiu-se um período de transição que vigorará até 31 de dezembro. Acordo de Saída ainda está a ser negociado.
A imagem mostra o momento em que a bandeira do Reino Unido foi retirada do Parlamento Europeu, em Bruxelas.
Marega alvo de comentários racistas
O jogador do FC Porto abandonou o recinto do encontro da I Liga em Guimarães, a 16 de fevereiro, aos 69 minutos, depois de ter aguentado insultos racistas desde o aquecimento da partida. O caso, no qual foram identificados mais de 20 suspeitos, abalou o mundo do futebol, com representantes do setor a pedirem mudanças na forma como a violência e racismo no desporto é combatida.
Viver em Estado de emergência
A exemplo da China, e após a explosão de casos em todo o mundo, sobretudo a partir de fevereiro, grande parte dos governos desdobrou-se em medidas restritivas que levaram ao confinamento total das populações, deixando cidades inteiras em silêncio.
O estado de emergência foi decretado em Portugal pela primeira vez em democracia no ano de 2020. Em dois períodos distintos com um intervalo de seis meses (em março e novembro).
O decreto presidencial do estado de emergência determinou a suspensão parcial do exercício dos direitos de deslocação e fixação em qualquer parte do território nacional, permitindo expressamente o confinamento no domicílio ou em estabelecimento de saúde e a fixação de cercas sanitárias.
O país ficou dividido em níveis de risco (moderado, alto, elevado e muito elevado), foi proibida a circulação entre concelhos por diversos períodos, sair de casa teve limitações temporárias (com recolher obrigatório às 13h00, nos fins de semana e feriados, e às 23h00, nos dias úteis) e datas como a da Páscoa, do Natal e da Passagem de Ano foram vividas com fortes medidas e restrições.
O ano que testou o SNS e levou os profissionais da saúde ao limite
A pandemia testou ao máximo os serviços de saúde. Obrigou a parar a assistência a doentes não urgentes, suspendendo consultas, cirurgias e tratamentos, mas também pressionou respostas novas do Serviço Nacional de Saúde (SNS), mesmo com os profissionais no limite.
Os lares e o peso do isolamento
As notícias de surtos de Covid-19 em lares de idosos despertaram o país para uma realidade de muitas residências sem condições ou a funcionar de forma ilegal e sem qualquer acompanhamento ou fiscalização do Estado.
A proibição das visitas a lares foi uma das primeiras medidas a serem anunciadas pelo Governo no início de março, reconhecendo os idosos como grupo de risco particularmente vulnerável à doença.
O peso do isolamento e da ausência de contacto físico com a família, assim como um aliviar generalizado das restrições em vigor no país, levou a uma revisão das medidas, e as visitas aos lares, ainda que de forma condicionada e com um conjunto de regras apertadas, voltaram a ser permitidas em maio.
Uma praça impressionantemente vazia
A 27 de março, o Papa Francisco deu uma bênção histórica "Urbi et Orbi" - para a cidade e para o mundo - a partir de uma praça de São Pedro no Vaticano totalmente vazia dos fiéis.
Celebrações de ruas despidas
A pandemia obrigou a alterar as comemorações do 25 de Abril e do 1.º de Maio. Em Lisboa, não se desceu a Avenida da Liberdade, na primeira na data, nem a Avenida Almirante Reis, na segunda, e ambas as celebrações estiveram envoltas em polémica — pela cerimónia na Assembleia da República e pela manifestação da CGTP, na Alameda.
Black Lives Matter
George Floyd, um afro-americano de 46 anos, morreu a 25 de maio, em Minneapolis (Minnesota, EUA), depois de um polícia branco lhe ter pressionado o pescoço com um joelho durante cerca de oito minutos numa operação de detenção, apesar de Floyd dizer repetidamente que não conseguia respirar.
A sua morte provocou largos protestos antirracismo e contra a brutalidade policial nos EUA e em diversos países, Portugal inclusive, num movimento internacional que ficou conhecido como Black Lives Matter.
Para o infinito e a SpaceX mais além
O primeiro foguetão concebido e construído por uma empresa privada, a SpaceX, de Elon Musk, levando a bordo dois astronautas foi lançado a 30 de maio na presença do Presidente do Estados Unidos, Donald Trump.
Os astronautas norte-americanos Bob Behnken e Doug Hurley voaram do Kennedy Space Center, na Florida, a bordo da cápsula espacial Dragon, transportada por um foguetão Falcon 9 da SpaceX, a primeira empresa privada certificada pela NASA para missões tripuladas.
Uma saída anunciada
Na imagem António Costa, Mário Centeno e João Leão juntos num briefing do Conselho de Ministros.
João Leão, até aqui secretário de Estado do Orçamento, substituiu a 9 de junho Mário Centeno como ministro de Estado e das Finanças
Um mês depois, o irlandês Paschal Donohoe foi eleito presidente do Eurogrupo, o fórum de ministros das Finanças da zona euro, e substituiu Mário Centeno no cargo.
A 16 de julho Mário Centeno foi nomeado governador do Banco de Portugal, sucedendo a Carlos Costa.
Em Barcelona, as plantas saíram à noite — e esgotaram uma sala
Um concerto para 2.292 plantas. A Ópera de Barcelona reabriu com concerto exclusivo para plantas. O quarteto de cordas UceLi subiu ao palco do Gran Teatre del Liceu para interpretar a obra “Crisantemi”, do compositor italiano Giacomo Puccini.
Caos em Beirute
No início de agosto, duas explosões no porto de Beirute num depósito contendo toneladas de nitrato de amónio, armazenado sem precaução durante anos, deixou mais de 200 mortos e 6.500 feridos. Parte da capital do Líbano foi destruída e até 300.000 pessoas ficaram sem casa.
Reeleição de Alexander Lukashenko e Bielorrússia na rua
A reeleição, no início de agosto, de Lukashenko, 66 anos, no poder desde 1994, foi considerada fraudulenta pela oposição e pelo Ocidente e gerou protestos em massa. Como resultado da repressão na Bielorrússia, milhares de manifestantes foram detidos e muitos outros fugiram para a Lituânia ou para a Polónia, incluindo a principal opositora, Svetlana Tikhanovskaya.
Bayern de Munique campeão em Lisboa
O Bayern de Munique conquistou pela sexta vez a Liga dos Campeões Europeus de futebol, ao vencer na final o Paris Saint-Germain PSG) por 1-0, em jogo disputado no estádio da Luz, em Lisboa. A 65.ª edição da prova teve uma inédita 'final a oito' em Lisboa, depois de ter sido interrompida devido à pandemia de Covid-19.
Caso Navalny
No final de agosto, o dirigente da oposição russa, Alexei Navalny, de 44 anos, foi hospitalizado por suspeitas de envenenamento em Omsk, na Sibéria, numa deslocação no âmbito da campanha eleitoral. Após ter ficado em coma num hospital da região, Navalny foi transferido para o hospital Charité, em Berlim, onde foi detetado um agente tóxico do grupo Novichok no sangue e urina do paciente russo.
O primeiro "giga-fogo" da história
A Califórnia viveu o pior ano de sua história em termos de número de incêndios e área ardida. Os incêndios florestais de setembro e outubro geraram o primeiro “giga-fogo” da história — um incêndio que se estende por 1 milhão de acres, o que equivale a cerca de 405 mil hectares.
Julgamento de Rui Pinto
Rui Pinto, criador da plataforma eletrónica Football Leaks, através da qual divulgou milhares de documentos confidenciais do mundo do futebol e alegados esquemas de evasão fiscal cometidos em diversos países, e responsável também pelo processo Luanda Leaks, começou a ser julgado — por 90 crimes — no início de setembro.
Considerado por uns um 'whistleblower' (denunciante) e por outros um criminoso e um pirata informático ('hacker'), Rui Pinto trouxe para a opinião pública e para a política nacional e internacional o debate sobre os limites entre o interesse público das denúncias e a forma, eventualmente ilícita, como essas informações foram obtidas.
Veneza 'ouviu' Ana Rocha de Sousa
O filme "Listen", a primeira longa-metragem de ficção da realizadora portuguesa Ana Rocha de Sousa, foi distinguido em setembro, no Festival de Cinema de Veneza, em Itália. O filme, inspirado numa história real, sobre uma família portuguesa emigrada em Londres, a quem é retirada a guarda dos filhos, por suspeitas de maus-tratos, venceu seis prémios, entre os quais o "Leão do Futuro", para uma primeira obra, e o prémio especial do júri da competição Horizontes.
Confrontos em Nagorno-Karabakh
O Azerbaijão e a Arménia assinaram no início de novembro um acordo patrocinado pela Rússia que pôs fim a seis semanas de confrontos em Nagorno-Karabakh, região separatista do Azerbaijão de maioria arménia.
Quando o distanciamento social se pintou no chão do Santuário de Fátima
Fátima em tempos de pandemia. A Peregrinação Internacional Aniversária de outubro ficou marcada pelo limite de 6.000 mil pessoas no recinto de oração, devido a pandemia. Com círculos tracejados no chão, a tinta branca, as celebrações no Santuário de Fátima ficaram marcadas por um recinto mais despido e com uma organização diferente do espaço.
De Portimão para a história da F1
A vitória de Lewis Hamilton deixou o GP de Portugal na história da Fórmula 1. O britânico alcançou a 92.ª vitória da sua carreira no Autódromo Internacional do Algarves (Portimão), superando o alemão Michael Schumacher.
Quando a arte salva
Estas imagens correram o mundo. Uma carruagem de metro escapou à queda da composição da frente ao ‘aterrar’ numa escultura gigante de baleia, perto da cidade portuária de Roterdão, na Holanda. Em vez de se precipitar na água, 10 metros abaixo, a composição ficou suspensa no ar, apoiada na cauda metálica do cetáceo.
America blue again
Os Estados Unidos foram às urnas a 3 de novembro com a contagem dos votos a prolongar-se por vários dias. O democrata Joe Biden foi declarado Presidente-eleito depois de vencer o estado da Pensilvânia. Donald Trump não assumiu imediatamente a vitória, recorrendo às redes sociais (e aos tribunais, que não lhe deram razão) para acusar o processo de ser fraudulento. Kamala Harris fez história ao ser foi eleita a primeira mulher negra na vice-presidência do país.
'El Pibe' saiu de campo
O mundo recebeu a notícia da morte de Maradona a 25 de novembro. A despedida da lenda do futebol comoveu o mundo do desporto, independentemente dos emblemas e cores.
"No fim, no triste rescaldo, amontoam-se contradições: morreu agora o homem, morreu já há muito o artista, é para sempre o melhor de sempre" — Maradona por Samuel Úria.
Uma morte às mãos do SEF
A suspeita de homicídio em março de um cidadão ucraniano por elementos do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) no aeroporto de Lisboa chocou o país, a acusação surgiu célere, mas só gerou um “tsunami” político em novembro.
Nove meses depois do alegado homicídio, a diretora do SEF, Cristina Gatões, demitiu-se após alguns partidos da oposição terem exigido consequências políticas deste caso. O ex-comandante-Geral da GNR Luís Francisco Botelho Miguel foi nomeado como o novo diretor do SEF.
O ministro Eduardo Cabrita, que se mantém no cargo apesar das críticas, anunciou para janeiro a restruturação do SEF - que poderá passar pela extinção da autoridade.
A morte de Ihor Homeniuk veio ainda pôr a nu os abusos a que imigrantes e requerentes de asilo podem estar sujeitos quando aterram em Portugal, a começar pela falta de apoio jurídico.
A primeira vacina do resto da vacinação
O Reino Unido, o segundo país europeu mais atingido pela Covid-19, iniciou a sua campanha de vacinação a 8 de dezembro. A primeira pessoa a ser inoculada com a vacina da Pfizer/BioNTech, para a qual o país aprovou o seu uso de emergência a 2 de dezembro, foi Margaret Keenan, de 90 anos.
Portugal vai começar a vacinar a 27 de setembro e os profissionais de saúde dos centros hospitalares universitários do Porto, São João, Coimbra, Lisboa Norte e Lisboa Central serão os primeiros a receber a vacina.
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