Foi o culminar de uma semana em que as tensões em torno do conflito na Síria subiram de tom e a possibilidade de um ataque americano se tornou mais plausível de dia para dia. Ao início da noite de ontem em Washington, madrugada em Lisboa e também em Damasco, na Síria, Donald Trump dirigiu-se aos americanos para comunicar que tinha dado ordens para que as tropas americanas avançassem com ataques de precisão na Síria com o objetivo de travar ataques químicos por parte das forças de Bashar al-Assad.
"Ordenei às forças armadas dos Estados Unidos que lancem ataques de precisão contra alvos associados à capacidade de armas químicas do ditador Bashar Al Assad", disse Trump num discurso a partir da Casa Branca.
As tropas americanas não estavam sozinhas e pouco depois de Donald Trump também a primeira-ministra britânica, Theresa May, confirmava a participação britânica na incursão militar na Síria ao lado dos Estados e da França. Seguiu-se o presidente francês, Emmanuel Macron, que assim fechou o xadrez da operação conjunta militar envolvendo os três países.
Mas, na realidade, mal Donald Trump concluiu a sua comunicação à nação, os primeiros mísseis norte-americanos atingiram alguns alvos em Damasco, dando assim início a uma operação que duraria pouco mais de uma hora. Várias explosões foram ouvidas nas primeiras horas deste sábado na capital da Síria, relatou o correspondente da AFP, enquanto o presidente americano, Donald Trump, anunciava em Washington que estavam em marcha ataques àquele país.
A TV estatal síria também reportou ataques americanos no país, coordenados com a França e o Reino Unido. "A defesa antiaérea síria" entrou em ação contra "a agressão americana, britânica e francesa", reportou a TV estatal síria, enquanto testemunhas relataram à AFP que colunas de fumo eram vistas no nordeste de Damasco.
"Estas não são as ações de um homem, são os crimes de um monstro"
No seu discurso, Trump responsabilizou a Rússia e o Irão por "apoiarem, equiparem e financiarem o regime criminoso" da Síria. O Presidente dos Estados Unidos considerou ainda que a Rússia não cumpriu com o compromisso de impedir Bashar al-Assad de usar armas químicas.
"No sábado passado, o governo de Assad utilizou de novo armas químicas para massacrar civis inocentes, desta vez na cidade de Douma (...). Este massacre foi uma escalada significativa no padrão de uso de armas químicas por parte deste terrível regime ", afirmou o presidente americano.
"Este ataque desprezível deixou mães e pais, bebés e crianças sufocados. Estas não são as ações de um homem, são os crimes de um monstro", sublinhou antes de deixar um recado direto à Rússia e também ao Irão, dois países que têm apoiado o regime sírio:“Que tipo de nação quer estar associada a um assassino em massa de homens, mulheres e crianças inocentes? As nações do mundo podem ser julgadas pelos amigos que mantêm.” A esta primeira invectiva, seguiu-se o desafio expresso: “A Rússia tem de decidir se quer continuar por este caminho negro ou se se junta às nações civilizadas”, disse o presidente americano. “Desejavelmente, um dia viremos a dar-nos bem com a Rússia e até com o Irão. Ou talvez não.”
Donald Trump sublinhou que "o objetivo de nossas ações esta noite foi estabelecer uma dissuasão contra a produção, distribuição e uso de armas químicas", garantindo que não pretende que as tropas americanas permaneçam muito tempo na Síria.
"Não podemos permitir que o uso de armas químicas seja normalizado — na Síria, nas ruas do Reino Unido, ou em qualquer outra parte do mundo"
Theresa May, através de um comunicado, confirmou a incursão militar e referiu que "não se trata de interferir numa guerra civil. Não é sobre uma mudança de regime. Trata-se de um ataque limitado e direcionado que não escala a tensão na região e faz tudo o que é possível para prevenir baixas civis".
Adianta May que o ataque dirigido à Síria é também uma mensagem para todos aqueles que ponderarem a utilização de armas químicas (de recordar que o Reino Unido acusa a Rússia de estar por trás do ataque ao ex-espião Sergei Skripal e à sua filha com um agente nervoso em Inglaterra).
"Esta foi a primeira vez que como primeira-ministra tive de tomar a decisão de enviar as nossas forças armadas para combate — e não foi uma decisão tomada de ânimo leve. Fi-lo porque acredito que esta ação é no interesse nacional do Reino Unido. Não podemos permitir que o uso de armas químicas seja normalizado — na Síria, nas ruas do Reino Unido, ou em qualquer outra parte do mundo", afirma May em comunicado.
"A linha vermelha fixada pela França em maio de 2017 foi ultrapassada"
Também o presidente francês Emmanuel Macron confirmou que a França participava da operação em curso com os Estados Unidos e o Reino Unido na Síria, destacando que os bombardeamentos estavam "circunscritos às capacidades do regime que permitem a produção e o uso de armas químicas". "Não podemos tolerar a banalização do uso de armas químicas", justificou o presidente francês em comunicado.
"A linha vermelha fixada pela França em maio de 2017 foi ultrapassada. Ordenei assim às forças armadas francesas que atuassem esta noite, como parte de uma operação internacional realizada com os Estados Unidos e oReino Unido e tendo como alvo o arsenal químico clandestino do regime sírio".
"A França e os seus aliados retomarão, a partir de hoje, os seus esforços nas Nações Unidas visando a instalação de um mecanismo internacional de estabelecimento de responsabilidades e prevenção de impunidade" envolvendo o regime sírio.
"Desde maio de 2017, as prioridades da França na Síria são constantes: terminar a luta contra o Daesh, permitir o acesso da ajuda humanitária às populações civis, promover uma dinâmica coletiva para se obter uma solução política do conflito, levar a paz à Síria e zelar pela estabilidade na região".
A conta de Twitter do Eliseu divulgou esta madrugada imagens dos aviões militares franceses a levantarem voo em direção à Síria.
13 mísseis terão sido abatidos, diz televisão estatal síria
Várias explosões foram ouvidas esta madrugada na capital da Síria, em Damasco, segundo um correspondente da AFP, e em Homs.
A televisão estatal síria também reportou os ataques e a acrescentou que a defesa antiaérea entrou em ação contra a "agressão" americana. Pelo menos 13 mísseis lançados no ataque liderado pelos Estados Unidos foram abatidos pelas forças sírias, segundo informações da televisão estatal.
O Observatório Sírio dos Direitos Humanos adianta que o ataque visa três centros de investigação, dois em Damasco e um em Homs, além de bases militares em Damasco. Todos estes alvos, segundo o Observatório, foram evacuados pelo governo sírio esta semana.
Escreve a AFP que em Homs o ataque foi conduzido por aviões britânicos. Quatro aviões Tornado dispararam mísseis Storm Shadow contra "um complexo militar, uma antiga base de mísseis, a cerca de 24 km a oeste de Homs, onde se suspeita que o regime armazene substâncias para fabricar armas químicas", adianta o ministério da Defesa do Reino Unido.
Já uma fonte oficial norte-americana adiantou à Reuters que os Estados Unidos usaram mísseis cruzeiro Tomahawk neste ataque.
Os ataques concentraram-se em alvos selecionados para evitar atingir as forças da Rússia, afirmou o chefe do Comando Conjunto dos EUA, o general Joe Dunford. Foram "especificamente identificados os alvos para reduzir o risco de envolver as forças russas" na Síria, disse Dunford durante uma entrevista no Pentágono.
Por volta das 3h20, hora de Lisboa, foi anunciado que os ataques tinham chegado ao fim. Os ataques ordenados pelo presidente Donald Trump contra a Síria "terminaram" e não há, no momento, previsão de novas ações militares, afirmou o secretário americano de Defesa, o general Jim Mattis. "No momento não planeamos ataques adicionais", disse Mattis, citado pela AFP, acrescentando que o departamento de Defesa está em consulta permanente com França e Reino Unido.
O ataque a Douma, em Ghouta Oriental
Mais de 40 pessoas morreram no sábado passado, 7 de abril, num ataque contra a cidade rebelde de Douma, em Ghouta Oriental, que segundo organizações não-governamentais no terreno foi realizado com armas químicas.
A oposição síria e vários países acusam o regime de Bashar al-Assad da autoria do ataque, mas Damasco nega e o seu principal aliado, a Rússia, afirmou que peritos russos que se deslocaram ao local não encontraram “nenhum vestígio” de substâncias químicas.
Citando informações fornecidas por organizações de saúde locais em Douma, a Organização Mundial de Saúde (OMS) indicou na quarta-feira que “cerca de 500 pessoas procuraram centros de atendimento exibindo sintomas de exposição a elementos químicos e tóxicos”.
O Presidente francês, Emmanuel Macron, afirmou dispor de “provas” de que o regime de Bashar al-Assad utilizou armas químicas num ataque contra a localidade rebelde síria de Douma.
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