Em abril deste ano, o Ministério Público (MP) acusou o autarca de contrafação, por alegado plágio de 40 textos originais na sua tese de doutoramento "As linhas de Torres, um destino turístico estratégico para Portugal", que foi defendida em dezembro de 2015 e obteve aprovação pelo júri.
A defesa requereu a abertura de instrução, fase facultativa em que o juiz de instrução criminal (JIC) decide se o processo segue e em que moldes para julgamento, e, segundo a decisão instrutória, a que agência Lusa teve acesso, a JIC Anabela Rocha pronunciou hoje (decidiu levar a julgamento) o arguido nos exatos termos da acusação do MP.
“O que está em causa é o uso de excertos que constam da acusação. O autor da tese de doutoramento, ora arguido, não aplicou as regras da citação, isto é, não chamou o seu a seu dono, no dizer popular. O uso de excertos começa logo na introdução (as primeiras 19 linhas). E veja-se que em muitas situações, os excertos que o arguido utilizou são extensos”, refere a decisão instrutória.
Segundo o tribunal não se pode afirmar que estes excertos ganhem de alguma forma originalidade, por serem “reproduções exatas de obras anteriormente existentes”.
“O leitor da aludida tese, crê-se, não questionará que os excertos de que ora nos ocupamos são da autoria do arguido, isto é, que da forma como são apresentadas criam convicção de que tais afirmações são da lavra originária do arguido”, acrescenta o TIC de Lisboa.
Anabela Rocha sustenta, por outro lado, e dada a extensão “significativa” dos excertos em causa, que a “tese apresentada pelo arguido perde o seu caráter de originalidade ou individualidade (que se não confunde com interesse ou pertinência, no dizer da análise já efetuada)”.
“No que respeita ao tipo subjetivo [do crime], exige-se o dolo, nas suas diversas formas. De alguma forma, ainda que não o diga de forma explícita, na medida em que o arguido admite não ter cumprido as regras de citação, o arguido deixa no ar a possibilidade de ter praticado os factos imputados por negligência. No entanto, e nesta fase, não apontam os autos nesse sentido. Aliás, a extensão de texto que o arguido utilizou na sua tese e que não foi por si criada aponta, mais uma vez, do ponto de vista indiciário, em sentido contrário”, frisa a JIC.
Nesse sentido, o TIC de Lisboa considera que a utilização por Carlos Bernardes das expressões e excertos na tese de doutoramento “consubstancia a prática do crime de contrafação”, pelo qual o arguido está acusado e será julgado por um tribunal singular (só um juiz).
“Da análise destas provas, resulta a convicção da forte probabilidade de que o arguido seja responsável pelos factos constitutivos do crime […]. O desfecho desta sede processual passará necessariamente pela pronúncia do arguido”, lê-se na decisão instrutória.
Na acusação, o MP concluiu que O autarca usou textos alheios como se fossem seus, introduzindo apenas “ligeiras modificações como alterações para conformação com o novo acordo ortográfico, substituição de verbos por expressões nominais, alterações de géneros gramaticais de palavras ou substituição de verbos, alteração da ordem das palavras e supressões de partes dos textos originais”.
“O arguido disfarçava as semelhanças com os textos originais, com o propósito conseguido de fazer crer que o seu trabalho tinha originalidade e identidade próprias”, refere.
Além de outras investigações, estão em causa neste caso estudos do próprio coorientador da tese, Carlos Guardado da Silva, documentos de entidades oficiais, como o Plano Estratégico Nacional do Turismo 2013-2015, “A paisagem na revisão do PDM”, da Direção-Geral do Ordenamento do Território, ou textos da Associação para o Desenvolvimento Turístico e Patrimonial das Linhas de Torres Vedras, que congrega vários municípios, entre os quais o de Torres Vedras (distrito de Lisboa).
Na acusação, o MP refere que “o crime foi praticado com elevada ilicitude e dolo direto” e que o “arguido não interiorizou a prática do crime e se opôs à aplicação da suspensão provisória do processo, negando os factos”.
As suspeitas de alegado plágio, que foram primeiro denunciadas num artigo de opinião pelo ex-vereador da câmara Jorge Ralha no jornal Badaladas, foram comunicadas por três pessoas ao MP, que, em fevereiro de 2017, abriu um inquérito.
(Notícia atualizada às 15:56)
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