“Além do abuso de violência policial que causou esta tragédia, estamos agora a verificar outro abuso do Estado, que é não permitir aos deputados e ativistas que façam o seu trabalho no terreno”, disse Pedro Neto, diretor-executivo da Amnistia Internacional Portugal, em declarações à Lusa.
Ativistas disseram que a polícia angolana deteve, esta madrugada, André Candala, catequista e morador em Cafunfo, que denunciou a “morte de inocentes” na semana passada durante uma tentativa de manifestação que o Governo classificou como “ato de rebelião”.
Em declarações à Lusa, os ativistas referiram que o filho de André Candala, Paulo André Candala, foi também detido e ambos foram espancados.
Entretanto, fonte familiar disse que os dois ativistas já foram libertados, mas acrescentou que pelo menos André Candala foi espancado pela polícia.
Pedro Neto avançou à Lusa que a Amnistia Portugal já tinha conhecimento de que as pessoas que estavam na aldeia de Cafunfo “não podiam falar para fora, para o mundo, sobre o que estava a acontecer”, lembrando que o facto de alguns testemunhos serem feitos sob anonimato revela “uma prova de demonstração real do medo”.
“Um senhor catequista, André Candala, de 72 anos, idoso é catequista, foi detido, juntamente com o filho e foram torturados, algemados com fita cola nas mãos e nos pés e foram espancados porque denunciaram o que estava a acontecer”, explicou.
O responsável lamentou também que a Assembleia Nacional tenha dito haver uma regra que diz que os deputados não podem circular ou fazer viagens de trabalho sem autorização do presidente da Assembleia Nacional, afirmando que não é verdade o que está a ser avançado.
“Esta regra é falsa, eu desminto completamente. Trata-se de um tique de autoritarismo inaceitável”, reconheceu o responsável, sublinhando que os deputados “gozam de livre transito, mesmo em lugares públicos de acesso condicionado”.
Pedro Neto condenou ainda que “nem o Governo, nem a Assembleia Nacional ao seu mais alto nível” se preocupem em perceber o que aconteceu, parando com “estes abusos e violações de direitos humanos que a polícia, em nome próprio do Estado, está a cometer”.
“Estão a partidarizar o assunto e a chutar para campo”, reconheceu.
O responsável espera que quer ao nível da CPLP, quer das Nações Unidas e da União Africana venha a existir uma “posição condenatória sobre aquilo que está a acontecer”, sendo exigido “a nível internacional investigações completas ao que aconteceu”.
Desde sábado, dia 30 de janeiro, que Cafunfo está fortemente militarizada, sendo visível o patrulhamento das ruas pela polícia e Forças Armadas Angolanas (FAA).
A Lusa testemunhou no local que são frequentes os disparos durante a madrugada.
Vários moradores fugiram para as matas e encontram-se escondidos desde a semana passada. Há também um número indeterminado de detidos.
Organizações Não-Governamentais, bispos católicos e a oposição angolana condenaram o que dizem ter sido “um massacre” e pediram um inquérito independente sobre os acontecimentos.
Uma delegação da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), que integra os deputados Alberto Ngalanela, Joaquim Nafoia, Domingos Oliveira, Sindiagani Bimbi e Rebeca Muaca, foi barrada à entrada de Cafunfo e aí se mantém desde quarta-feira.
O líder do maior partido da oposição angolana, Adalberto da Costa Júnior, afirmou na sexta-feira que a retenção de cinco deputados à entrada de Cafunfo é “a confissão clara do massacre praticado” na vila mineira, rica em diamantes, da Lunda Norte e da ocorrência de “operações de limpeza” na zona.
O presidente da Assembleia Nacional angolana, Fernando da Piedade Dias dos Santos, recusou no sábado qualquer responsabilidade sobre a missão de cinco deputados da UNITA, alegando que “a deslocação não foi feita no quadro de uma comissão parlamentar multipartidária, como seria recomendável”.
Segundo Fernando da Piedade Dias dos Santos, “é regra que os deputados não se podem deslocar sem autorização do presidente da Assembleia Nacional”.
O Movimento Protetorado da Lunda Tchokwe luta pela autonomia da região das Lundas, no Leste-Norte de Angola.
A autonomia da região das Lundas (Lunda Norte e Lunda Sul, no leste angolano), rica em diamantes, é reivindicada por este movimento que se baseia num Acordo de Protetorado celebrado entre nativos Lunda-Tchokwe e Portugal nos anos 1885 e 1894, que daria ao território um estatuto internacionalmente reconhecido.
Portugal teria ignorado a condição do reino quando negociou a independência de Angola entre 1974/1975 apenas com os movimentos de libertação, segundo o movimento.
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