O protesto prendeu-se com o facto de esse espaço estar reconhecido por autoridades autárquicas e policiais como ilegal, aguardando há mais de um ano os resultados de processos em curso no Ministério Público. Entretanto a lotação do recinto já passou de 150 animais para apenas “65 cães e alguns gatos”, segundo fonte da Câmara da Feira, mas o espaço continua a exibir fracas condições, no meio de um pinhal de acesso difícil e, portanto, mais sujeito a incêndios como o que ocorreu este fim-de-semana em Santo Tirso.
No portão do canil da DGZ, manteve-se toda a tarde um dispositivo com cerca de 10 agentes da GNR, dos quais nenhum se prestou a esclarecer se o único motivo para a sua presença no local era proteger a propriedade privada da DGZ ou verificar o estado dos animais e a conduta dos manifestantes, remetendo declarações para o comando nacional, em Lisboa.
Já entre os manifestantes, o que mais se ouvia eram os insultos que, na maioria dos casos, se dirigiam à proprietária do canil – “assassina” e “criminosa”, entre outros menos educados. Havia também quem se limitasse a acicatar ainda mais a agressividade dominante – como aconteceu por parte de um homem que gritava “mentirosos”, mas, quando questionado sobre a quem se dirigia, se limitou a rir, encolher os ombros e afirmar que a acusação se aplicava “a quem quer que fosse, desde que esteja a mentir”.
Beatriz Loureiro incluía-se no grupo mais restrito dos que sempre mantiveram a calma. Sem usar calão, linguagem obscena ou ameaças de violência física, chegou a dizer a algumas pessoas que “com os insultos só perdem a razão”, mas acabou por desistir de lições de civismo, aguardando com a sua transportadora pela possibilidade de adotar um cão pequeno.
Quando soube que hoje o canil só tinha para adoção cães de médio e grande porte, confessou: “Não sei se vou conseguir levar algum desses tamanhos. Mas, se eu puder fazer a diferença e saber que levo algum para uma vida melhor, vou tentar”.
Filipa Sousa foi quem organizou as tropas: não representa nenhuma associação de animais, mas, elevando a voz acima da multidão, pediu que se identificassem os disponíveis para adoção e organizou uma lista de cerca de 30 candidatos. Depois de combinar as operações com os proprietários da DGZ, que se mantiveram longe do protesto, veio aos portões e anunciou: “Há 10 animais para adotar hoje. Mas é para se adotar um cão! Não é para se vir para aqui pedir um ‘rottweiller’, um labrador, etc. É para se adotar o que há!”.
Dezenas de pessoas aproveitaram então a deixa para abandonar o local. Alguns ainda ficaram sentados sobre toalhas, no alcatrão, a saborear bebidas sob a sombra escassa dos eucaliptos, mas pelas 19:30 já só umas 50 pessoas permaneciam no local, a aplaudir as primeiras que entraram sozinhas no canil para de lá saírem pouco depois com um cão nos braços, assinando o devido termo de responsabilidade.
Pela mesma altura, 10 animais foram transportados por carrinha para um centro veterinário em Canedo, nas imediações. Só esses foram encontrados com saúde débil no canil, após a vistoria desta tarde ao local, com elementos da GNR, representantes de algumas associações de animais e o veterinário municipal de Santa Maria da Feira, Rui Jardim.
Este admitiu que as condições do local “não são as ideais”, mas garantiu que a generalidade dos cães e gatos aí alojados se encontrava “bem” e num espaço “muito melhor” do que aquele com que as autoridades aí se depararam há um ano, quando surgiram as primeiras denúncias sobre o mau estado da estrutura.
Também a associação IRA – Intervenção de Resgate Animal confirmou essa impressão após visitar o recinto: “Contrariamente às denúncias do passado, com vídeos de cães acorrentados e infestado de parasitas, malnutridos e num espaço sem condições, aquilo que encontrámos [hoje] era totalmente diferente”.
Em comunicado tornado público pouco depois da vistoria, os responsáveis dessa organização descreviam “‘boxes amplas e limpas, água e comida disponíveis e cerca de 3/4 dos cães em espaços em cimento com cerca de 10 metros quadrados” de área, abrigados sob telhado entre redes de malha metálica.
“Não encontrámos nenhum animal acorrentado, ferido ou a carecer de resgate imediato. Encontrámos um único animal malnutrido, que havia sido resgatado de uma situação de maus-tratos e dado entrada no abrigo há cerca de uma semana”.
O veterinário municipal realçaria ainda que a maioria dos animais à guarda da DGZ tem chip de identificação. Por isso mesmo, fez a leitura desses dispositivos durante a tarde, mas só na quarta-feira, “com calma”, irá localizar os seus proprietários originais, para descobrir se os respetivos cães e gatos foram alguma vez dados como perdidos ou roubados.
Por: Alexandra Couto da Agência Lusa
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