Na sexta-feira, a urgência e a enfermaria de cuidados intermédios eram espaços relativamente tranquilos, confirmando a redução da procura que se tem verificado nas últimas semanas, depois de um pico de afluência, em abril, que não chegou a lotar a capacidade instalada.
Numa visita à urgência dos Covões, na qual os procedimentos de atendimento e circuitos estão muito bem definidos, o médico João Gonçalves disse à equipa de reportagem da agência Lusa que a “transformação” daquele serviço exclusivamente para doentes de covid-19 foi fundamental para que o combate à pandemia “desse frutos”.
Na resposta à pandemia, o Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC) adaptou a urgência e o bloco central do Hospital dos Covões para tratamento da covid-19, alargando também o horário para atendimento 24 horas.
“No fundo, conseguimos que os doentes não se misturassem e, portanto, que houvesse menor risco para profissionais e para doentes que ocorriam à Urgência e, nesse sentido, foi uma aposta ganha”, sublinhou João Gonçalves.
Mas, no início, nem tudo foi fácil na preparação e organização da área dedicada para a covid-19 e na integração de outros profissionais que vieram reforçar as equipas de medicina e de enfermagem.
“Primeiro, houve dificuldade na organização, de perceber qual a melhor forma de criar circuitos que permitissem ter zonas limpas, zonas sujas, e isso veio revolucionar a forma de trabalhar na Urgência, disposição das salas e de áreas de trabalho”.
Depois, continuou João Gonçalves, “teve-se de integrar enfermeiros auxiliares, que vieram de outros serviços que, entretanto, foram desativados, e teve-se de fazer essa integração, que foi outro momento de dificuldade e de desafio”.
A equipa médica, que funcionava com especialistas de Medicina Interna, foi também reforçada com médicos internistas, pneumologistas e infeciologistas.
Para João Gonçalves, “tudo isto foi um desafio acrescido superado nestes dois últimos meses”.
“Temos uma equipa que envolveu enfermeiros, auxiliares, médicos, funcionários da limpeza, seguranças, técnicos de radiologia, o laboratório, secretariado, toda a equipa funcionou de forma muito sólida, os procedimentos foram ficando cada vez mais oleados e foi cada vez mais fácil trabalhar na Urgência e o resultado é muito gratificante”, sublinhou.
No piso -1 do Hospital dos Covões, dois cima da urgência, foi instalada a enfermaria F, uma unidade de cuidados intermédios, que trata os doentes que já passaram pelos cuidados intensivos ou que precisam de outros cuidados.
João Rua, responsável pela unidade, explicou à agência Lusa que “as condições não são as que se encontram habitualmente numa unidade de Intermédios”.
Naquela enfermaria, existe um espaço aberto “em que se pode ver todos os doentes, o que motiva uma vigilância um bocadinho diferente, complementada com outro tipo de monitorização vídeo, além da monitorização contínua dos sinais vitais”.
O responsável destacou ainda a necessidade de “adaptação do pessoal a uma doença nova que ninguém conhecia” e a evolução nos cuidados médicos prestados ao longo do tempo.
A enfermaria tem uma capacidade máxima de 16 pessoas, mas na sexta-feira tinha apenas sete pessoas internadas, ainda positivas para a covid-19, mas já em situação estável, naquele que é o número mais baixo desde 22 de março.
Quando surgiram os primeiros casos na região de Coimbra, o serviço de Doenças Infectocontagiosas do polo principal do CHUC (Hospitais da Universidade de Coimbra) constituiu a linha da frente de combate à infeção pelo novo coronavírus Sars-Cov2.
“Numa fase inicial, o serviço entrou apenas com cinco quartos de isolamento, quando ainda tínhamos poucos doentes, mas rapidamente esta capacidade esgotou e tivemos que alocar todo o serviço ao seguimento destes doentes”, revelou à agência Lusa o diretor da unidade, Saraiva Cunha.
A entrada em funcionamento da urgência e do bloco central do Hospital dos Covões só para covid-19 acabou por libertar a pressão nos HUC e no serviço de doenças infectocontagiosas.
Neste momento, segundo Saraiva Cunha, o serviço recebe fundamentalmente doentes “que ainda são identificados esporadicamente no serviço de urgência e também doentes que são identificados já depois de estarem internados na enfermaria deste hospital, quando fazem os testes de rastreio e são identificados como positivos”.
O serviço de doenças infectocontagiosas é uma unidade de retaguarda para o Hospital dos Covões, mas está na linha da frente dos HUC, “porque os doentes que são identificados neste polo são internados no nosso serviço”.
“Agora são bastante menos do que em determinada altura. Já chegámos a ter o serviço totalmente lotado com doentes, mas naturalmente que a abertura do Hospital dos Covões para esta patologia aliviou muito a pressão e, neste momento, temos oito doentes internados”, sublinhou.
Hospitais de Coimbra realçam que disponibilidade dos profissionais ajudou aos bons resultados
Um responsável pelo gabinete de crise do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC) considera que o planeamento e a disponibilidade dos profissionais de saúde foram fatores essenciais no combate à pandemia da covid-19.
Em declarações à agência Lusa, o enfermeiro Jacinto Oliveira disse que, na gestão da pandemia, foi essencial "o planeamento proativo que se foi capaz de fazer", para que os Hospitais de Coimbra não fossem colocados à prova "sem se ter um dispositivo preparado para responder".
"Saliento dois aspetos que são muito importantes no meu ponto de vista: a humildade de termos presente que estávamos perante uma situação incerta que a todo o momento se alterava, em que foi preciso aprender sistematicamente com as novas variáveis que eram introduzidas no processo e, por outro lado, a generosidade que os profissionais demonstraram, que é de enaltecer".
Jacinto Oliveira realça que os profissionais "souberam responder aos enormes desafios que a montagem de um dispositivo completamente novo obriga e estiveram sempre disponíveis para se envolverem a cada novo nível e empenharem-se em cada novo serviço".
Este enfermeiro, que teve a responsabilidade de elaborar o Plano de Contingência, não esquece que os profissionais de saúde "estiveram sempre presentes" e destaca a sua colaboração no "planeamento atempado, rigoroso e inteligente".
"De facto, quando os profissionais são chamados em situação limite a responder, estão sempre presentes. Sem profissionais de saúde resilientes, a resposta não teria sido certamente tão eficaz", sublinha o enfermeiro, para quem "uma vez mais ficou provada a resiliência do Serviço Nacional de Saúde (SNS)".
Nem tudo foram "rosas" e o gabinete de crise também passou por momentos críticos, sobretudo com a escassez de equipamentos de proteção individual.
Segundo Jacinto Oliveira, houve momentos em que os equipamentos de proteção individual "não abundaram e, nessa altura, de facto, viveram-se situações complexas".
Mas, salienta, "em nenhum momento" a proteção individual esteve em causa, embora com criticas relativamente à tipologia de alguns dispositivos, num momento em que o mercado não conseguia responder às encomendas.
O transporte de doentes entre o polo principal e o Hospital dos Covões e a falta de ventiladores para todas as camas reservadas para os doentes constituíram, de acordo com Jacinto Oliveira, fatores críticos que foram solucionados.
"Reconvertemos ventiladores que já se encontravam fora de uso e rapidamente também conseguimos que as 34 camas [em cuidados intensivos] tivessem o número de ventiladores adequados para responder caso fosse necessário", frisou.
O presidente do conselho de administração do CHUC também destaca a entrega dos profissionais de saúde no combate à pandemia da covid-19, que, até à data, provocou cerca de 70 mortes naquela unidade.
Segundo Fernando Regateiro, com os profissionais "foi possível, com a prontidão com que sempre responderam, montar respostas antecipadas e planeadas nos mais diversos patamares da sua diferenciação e áreas, que depois dão esta sensação de naturalidade com que o CHUC responde a uma situação de pandemia, de uma exigência, de um rigor e com momentos críticos bastantes difíceis".
"Na verdade, foi notável a sua prontidão, disponibilidade, capacidade e abnegação para esta resposta [à pandemia]", sublinhou à agência Lusa.
Apesar do número de infetados estar a baixar, com apenas sete doentes testados como positivos entre 12 e 21 de maio, o presidente do CHUC apela à população para que "não baixe a guarda".
No início do mês, entre os dias 06 e 12, não se registaram pessoas infetadas em cerca de 240 testes efetuados, o que para Fernando Regateiro "mostra que as regras e os cuidados adotados pela população protegem".
Na resposta à pandemia, o CHUC adaptou a urgência e o bloco central do Hospital dos Covões (Hospital Geral) para tratamento da covid-19, alargando também o horário para atendimento 24 horas.
Naquela unidade, situada na margem esquerda do rio Mondego, o CHUC construiu uma resposta de 34 camas em cuidados intensivos, quando só existiam 10, mas "felizmente não foi preciso utilizar a expansão, pois nunca se ultrapassou os 10 doentes ao mesmo tempo".
Além daquelas 34 camas de cuidados intensivos, os HUC tinham de reserva mais 15.
A resposta à covid-19 não se esgotou no Hospital dos Covões e também contava com o serviço de doenças infecciosas dos HUC, que tem 22 camas, cinco delas com pressão negativa em quartos individuais.
A administração procedeu ainda a uma alteração na urgência dos HUC, com a mudança da urgência cirúrgica e a localização nessa área da resposta a doentes com patologias pulmonares ou queixas respiratórias, mantendo, com zonas tampão, em funcionamento a urgência geral.
Logo no início de março, foi instalado no Hospital Pediátrico um laboratório especificamente dedicado a testes da covid-19.
Aquela unidade foi também preparada com a criação de uma sala na urgência com pressão negativa, a adaptação de uma sala operatória com pressão negativa e alocados espaços e quartos de isolamento para covid-19, e os circuitos internos desenhados.
Comentários