Com uma elevada taxa de empregabilidade durante o verão, associada ao turismo, a população do Algarve só deverá começar a sentir na época baixa os verdadeiros efeitos da crise económica, iniciada durante a pandemia de covid-19 e agora agravada pela crise energética e aumento do custo de vida devido à inflação.
Em declarações à Lusa, o presidente do Movimento de Apoio à Problemática da Sida (MAPS), Fábio Simão, classificou de “sufocante” a situação causada pelo aumento do nível dos preços, que tem levado algumas das pessoas apoiadas pela instituição a pedir “um reforço do cabaz que recebem antes do fim do mês”.
“Estamos a sentir devagar algumas pessoas a voltarem a pedir apoio, mas ainda não temos o grande embate que o verão está a mascarar”, disse o responsável, prevendo que “o pior está para vir” com a inflação a aumentar e o inverno a aproximar-se.
Apesar de estimar que haja um aumento das solicitações de ajuda nos próximos meses, devido ao provável agravamento das condições de vida, Fábio Simão não consegue ainda antecipar se a situação vai ser mais difícil do que em invernos anteriores.
A instituição apoia meia centena de pessoas com cabazes alimentares doados pelo Banco Alimentar e outras entidades, cerca de 160 através de um programa do Governo de apoio a famílias carenciadas e aproximadamente 70 com refeições confecionadas, no quadro de um apoio excecional criado durante a pandemia.
Também a coordenadora da Refood em Faro, instituição que combate o desperdício alimentar e reencaminha esses bens para famílias desfavorecidas, mostrou-se convencida de que “a situação vai complicar-se” à medida que termina o verão e o inverno se aproxima.
“Penso que em meados de setembro vamos ter novamente muitos pedidos de ajuda. Mais do que em anos anteriores”, previu Paula Matias, apontando como uma das principais razões para este aumento a diminuição do nível de vida provocado pela inflação e o fim das moratórias de ajuda criadas durante a pandemia de covid-19.
Segundo a responsável, cerca de 70% das famílias que procuram a instituição fazem-no, sobretudo, devido às rendas de habitação elevadas que pagam no Algarve e que fazem com que pouco ou nada sobre no fim do mês para as restantes despesas.
“As famílias têm de pagar uma série de serviços, sobretudo a renda, e o que fica para o fim é a alimentação”, constatou, acrescentando que há cada vez mais famílias de classe média a pedir ajuda num universo de “mais de 500 pessoas” que a instituição ajuda, o que corresponde a cerca de 200 famílias.
Segundo Paula Matias, nas últimas semanas de agosto aumentou a procura por apoio alimentar, principalmente por famílias que tinham suspendido esses pedidos, por terem arranjado um trabalho precário durante o verão, que agora terminou.
Por seu turno, uma responsável da Cáritas Diocesana do Algarve disse à Lusa que ainda não se verifica um aumento da procura por apoios na região, à semelhança do que já acontece noutras regiões do país, devido ao bom ano que o turismo está a registar e ao facto de muitas pessoas ainda estarem a trabalhar.
“O retrato do atendimento social aqui do Algarve pode divergir um pouco do que se está a passar no resto do país, no sentido em que nós ainda não notamos uma maior afluência de pessoas […] que já se começa a notar no resto do país. Nós aqui, na Cáritas Diocesana do Algarve, ainda não notamos”, afirmou Ana Sofia Pereira, do departamento de Ação Social da instituição.
A responsável justificou esta diferença com a sazonalidade e com o “facto de o Algarve, em termos de hotelaria, ter tido uma procura enorme” e isso fazer “com que as pessoas estejam, na sua grande maioria, ocupadas”.
“Como estão a ter rendimentos, ainda não estão a sentir a crise, que é expectável e que sabemos que vai acontecer, porque esta procura vai ser igual à do resto do país, mas em ‘timings’ diferentes. Possivelmente, aqui vamos começar a senti-la na segunda quinzena de setembro ou no início de outubro, mas para já ainda não temos essa procura”, estimou.
Ana Sofia Pereira assinalou que a situação atual do atendimento obedece “à realidade de todos os anos no Algarve”, onde, “mesmo em anos de pandemia se notou isso” e, “de junho até meados de setembro ou início de outubro, as coisas abrandam um pouco” em termos de apoio social “porque a maioria das pessoas consegue trabalho”.
“É um trabalho precário, porque é um trabalho por vezes sem contrato e que não tem continuidade quando termina a época alta, mas neste momento temos conhecimento, através também de outras Cáritas diocesanas do país que já existe uma procura grande de novas pessoas a pedir ajuda”, reconheceu.
Sobre um eventual reforço da capacidade de resposta antevendo um aumento da procura, Ana Pereira respondeu que a Cáritas Diocesana do Algarve – que apoia 534 pessoas, num total de 197 famílias -, tem “sempre presente em situações destas que tem de reforçar a capacidade de resposta”.
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