Atualmente, através de aplicações móveis ou plataformas online, rapidamente consegue aceder à sua conta bancária, gerir as suas finanças pessoais ou planear o seu futuro financeiro, de forma rápida, conveniente e barata. A pandemia de Covid-19 acelerou este processo de digitalização, e com o distanciamento social e o confinamento, as pessoas serviram-se ainda mais destas ferramentas digitais.

Mas, ao mesmo tempo que estas aplicações se tornam mais apelativas, também se levantaram novos desafios e riscos. Por um lado, "aumentou a exposição dos consumidores a fraudes e burlas online, como esquemas de phishing, e também a riscos de segurança digital, como a pirataria informática ou o roubo de dados", como explica o Banco de Portugal. Por outro lado, também pode resultar em "novos tipos de exclusão para determinados grupos da população", nomeadamente pessoas com poucas competências ou sem acesso a ferramentas digitais, e a rapidez de acesso aos produtos e serviços financeiros pode levar as pessoas a tomar "decisões impulsivas", e acabar, por exemplo, num maior endividamento.

Surge, assim, a necessidade de capacitar a população portuguesa para a utilização dos serviços financeiros digitais e reduzir a exclusão financeira online. Estes são, precisamente, os objetivos da Estratégia de Literacia Financeira Digital para Portugal, projeto financiado pela Comissão Europeia, e desenhado com o apoio técnico da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), hoje apresentado. Esta Estratégia parte das conclusões de um relatório da OCDE, elaborado durante 2022-2023 e publicado o mês passado.

De acordo com este relatório, metade das pessoas em Portugal que não utiliza internet considera a sua utilização demasiado complicada. O principal motivo para não fazer compras online ou utilizar serviços de homebanking é uma preferência pelo contacto pessoal, e um dos principais motivos para não interagir com outros serviços financeiros digitais (como transferências ou carteiras digitais, por exemplo) é a falta de conhecimento.

No que toca a práticas básicas de segurança online, embora a maior parte da população pareça seguir alguns passos de segurança - definindo palavras-passe ou utilizando software antivírus adequado, por exemplo - algumas medidas de segurança, como atualizar regularmente as palavras-passe, verificar as autorizações de acesso quando instala uma nova aplicação, ou verificar se esta provém de uma fonte fidedigna, já são adotadas de forma limitada.

Na proteção dos seus dados pessoais, um quarto das pessoas que utilizam a internet em Portugal "não lê nem se certifica de que compreende as políticas de privacidade antes de fornecer dados pessoais". E, mais de metade dos utilizadores "nunca solicita aos administradores de sítios Web que eliminem os seus dados pessoais quando deixam de ter intenção de utilizar esse sítios Web".

Relativamente aos conhecimentos financeiros digitais, menos de metade consegue responder corretamente à maioria das perguntas deste tema e apenas um pouco mais de um terço dos utilizadores sabe que pode cancelar uma compra online efectuada na União Europeia no prazo de 14 dias. Além disso, 60% desconhece que a regulação de algumas entidades que prestam serviços financeiros online pode não ser conduzida por autoridades de supervisão financeira portuguesas, e menos de um terço sabe que os seus dados pessoais, nomeadamente os publicados nas redes sociais, podem ser utilizados pelas instituições financeiras.

Partindo deste quadro, os objetivos da Estratégia são "reconhecer a importância da literacia financeira digital e garantir a todas as pessoas o acesso a formação financeira digital de qualidade", garantir informação e conhecimentos adequados, promover uma utilização segura desses serviços, e melhorar a eficácia das iniciativas com recurso a evidência, avaliação e coordenação.

Uma vez que o relatório concluiu que os adultos mais velhos, nomeadamente com idade igual ou superior a 70 anos, e as pessoas com baixos rendimentos ou baixo nível de escolaridade, usam menos ferramentas digitais diariamente ou para interagir com serviços financeiros, estes serão grupos prioritários.

O grupo dos séniores, em particular pessoas com idade igual ou superior a 70 anos, utiliza a internet e as ferramentas digitais de forma limitada, e quando não utiliza, é principalmente por uma questão de complexidade. Este grupo tem maior probabilidade de exclusão digital do que a restante população, ao utilizar a internet está mais exposto aos seus riscos, por ser menos propenso a conhecer e aplicar procedimentos básicos de segurança, e também parece ser mais vulnerável na proteção de dados pessoais.

Outro grupo prioritário é o dos jovens, em especial com idades entre os 16 e os 24 anos, que participam não só em atividades financeiras digitais relativamente básicas, mas também compras online, homebanking, e atividades de maior risco como aquisição e negociação de criptoativos. Deste modo, embora seja considerado mais proficiente em tecnologia, enfrenta vulnerabilidades específicas, por vezes não tem perceção dos ricos associados, e comparativamente a pessoas de meia-idade tem menor probabilidade de aplicar determinadas medidas de proteção de dados, especialmente quando utiliza redes sociais, e de denunciar casos de fraude financeira online.

Quanto aos indivíduos com baixos rendimentos e/ou baixo nível de escolaridade, ambos os grupos apresentam baixos níveis de inclusão financeira digital, sendo a complexidade apresentada como uma das principais razões para não utilizarem ferramentas digitais, e existe a tendência para não aplicarem procedimentos básicos de segurança online. O grupo dos desempregados, por sua vez, tem a percentagem mais elevada de vítimas de fraude online.

No relatório de mais de 50 páginas são apresentados programas de formação, ações de esclarecimento e desenvolvimento de iniciativas e parcerias com entidades ou programas envolvidos na inclusão digital ou no desenvolvimento de competências digitais. Estas ações serão monitorizadas pelo Banco de Portugal, de modo a aferir os progressos e propor melhorias.

*Pesquisa e texto pela jornalista estagiária Raquel Almeida. Edição pela jornalista Ana Maria Pimentel