A Unicre enviou uma carta aos seus clientes, que foi hoje noticiada pelo Público e a que a Lusa também teve acesso, em que argumenta a decisão com a “alteração à redação da verba 17.3.4 da Tabela Geral do Imposto do Selo”, que entrou em vigor com o Orçamento do Estado para 2016, considerando que com esta alteração “as taxas relativas a operações baseadas em cartões passam a ser sujeitas a Imposto do Selo”.
A Unicre esclarece na carta de 21 de novembro que, concluídos “os desenvolvimentos técnicos” necessários, iniciará a cobrança do imposto “a partir de 01 de dezembro de 2016″, e inclui um exemplo da aplicação desta verba do Imposto de Selo.
Quando um cliente paga com cartão uma compra de 25 euros, esse comerciante paga uma comissão de 1% (0,24 euros) pelo processamento do pagamento. A isto soma-se agora o Imposto de Selo à taxa de 4% (que incide sobre o valor monetário da comissão, ou seja, 0,01 euros), sendo o custo total para o comerciante de 0,26 euros.
As associações empresariais lamentam mais este encargo e algumas contestam mesmo a legalidade do entendimento da Unicre, uma situação que o fiscalista da SRS Advogados José Pedroso de Melo afasta.
A Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED) defende que estes encargos “devem ser imputados ao setor bancário, tal como foi definido pelo Governo, e não ao comércio e ao consumidor”.
À Lusa, a diretora-geral da APED, Ana Isabel Trigo Morais, disse ainda que a associação vai “continuar a desenvolver esforços para que exista justiça na aplicação destas medidas e que não seja o comércio, nem os portugueses, a suportarem este imposto criado especificamente para o setor bancário”.
Também a Associação de Restauração e Similares de Portugal (AHRESP) lamenta que o encargo com o Imposto do Selo seja agora transferido para os comerciantes e está a “tomar as devidas diligências” para reverter a decisão comunicada pela Unicre.
“As nossas empresas não podem ser obrigadas a pagar este encargo quando este imposto recai sobre as receitas de quem cobra as comissões. As nossas empresas não têm receita, têm um custo sempre que há pagamentos feitos com cartão porque já pagam uma comissão à operadora para terem esse meio de pagamento disponível”, disse à Lusa o diretor do departamento de planeamento da AHRESP, Pedro Carvalho.
O responsável afirmou que as empresas associadas da AHRESP estão “indignadas com esta situação” e que a associação “está neste momento a averiguar, por intermédio de especialista, a legalidade da efetiva aplicação deste imposto”, mas reitera que “é impensável que recaia sobre quem opera diariamente na economia”, defendendo que “tem de recair sobre quem tem receitas por ter este serviço”.
Já o presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), João Vieira Lopes, considera que a alteração introduzida em 2016 “é mais um bom exemplo de que pequenos ajustamentos de redação em diplomas ao nível fiscal podem conduzir a novas taxas”.
Para o dirigente, “não estará em causa uma ilegalidade na aplicação da taxa, mas sim mais um exemplo do aumento da carga fiscal” das empresas, considerando que esta situação “é especialmente gravosa porque incide sobre operações (operações com cartões) já de si muito onerosas e que decorrem das comissões cobradas pela banca e organizações interbancárias”.
Contactado pela Lusa, o fiscalista da SRS Advogados José Pedroso de Melo explicou que “a repercussão do encargo com o imposto nos clientes é normal e permitida pela lei”.
“É a própria lei que determina que, no caso do imposto referente a operações financeiras realizadas por instituições de crédito, sociedades ou outras instituições financeiras, o encargo deva recair sobre os clientes destas”, afirmou o advogado do Departamento Fiscal daquela sociedade.
Para José Pedroso de Melo, é “uma situação semelhante ao imposto que os clientes dos bancos pagam quando lhes é emprestado dinheiro ou cobrada qualquer comissão”.
O Ministério das Finanças, por seu lado, escusou-se a comentar casos concretos, referindo que este imposto “já era devido anteriormente” e que o OE2016 “apenas clarificou a sua exigibilidade”.
A tutela disse ainda que o Imposto do Selo “é devido pela entidade que cobre as taxas relativas a operações de pagamento baseadas em cartões”, pelo que “será devido pelas instituições financeiras mesmo que não tenha sido repercutido nos comerciantes”.
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