A presidente do Comité Nobel Norueguês anunciou esta sexta-feira a atribuição do Prémio Nobel da Paz 2023 à iraniana Narges Mohammadi.
“O lema adotado pelos manifestantes – “Mulher-Vida-Liberdade” – expressa adequadamente a dedicação e o trabalho de Narges Mohammadi”, explicou a presidente do Comité Norueguês, Berit Reiss-Andersen, que anunciou o prémio em Oslo.
Esta é a quinta vez, nos seus 122 anos de história, que o Prémio Nobel da Paz é atribuído a alguém que está preso ou em prisão domiciliária.
E foi a partir do cativeiro que Narges Mohammadi teve conhecimento que seria umas das nomeadas ao Prémio Nobel da Paz de 2023. Uma declaração emitida em 2022, pelo tribunal, dizia que “a ativista civil Narges Mohammadi, condenada a oito anos e dois meses de prisão e 74 chicotadas num novo caso, mencionou numa carta da prisão de Qarchak que foi considerada culpada porque foi 'nomeada para o Prémio Nobel da Paz'".
Declaração que Mohammadi refutou, escrevendo que “não reconhecia a decisão do Tribunal Revolucionário neste caso” e denunciou que esteve presa 64 dias em Evin sem acusação formal, privada do direito de fazer chamadas telefónicas ou ter acesso a um advogado.
A lutar contra a opressão das mulheres desde finais dos anos 1990, a ativista tornou-se uma das vozes de defesa dos direitos humanos no Irão.
Em 2003, integrou o Centro de Defensores dos Direitos Humanos em Teerão, uma organização fundada por Shirin Ebadi, ex-advogada iraniana que recebeu o Prémio Nobel da Paz há, precisamente, 20 anos.
Em 2011, Mohammadi foi detida pela primeira vez e condenada a vários anos de prisão pelos seus esforços para ajudar ativistas encarcerados e as suas famílias.
Em 2015, direcionou os seus protestos contra a pena de morte, o que a levou novamente à prisão. Aí começou a opor-se ao recurso sistemático do regime à tortura e à violência sexual contra as mulheres, enquanto prisioneiras politicas, prática recorrente nas prisões iranianas. Ela própria viria a ser alvo de tortura.
Em junho de 2022, numa carta enviada ao chefe do poder judicial do Irão, a Amnistia Internacional (AI) protestou contra a “tortura e maus-tratos” a Narges Mohammadi na prisão e exigiu a sua libertação imediata.
Nessa carta, a AI denunciou ao poder judicial iraniano que Mohammadi era alvo constante de “tortura e maus-tratos” na prisão de Qarchak Varamin, e era “deliberadamente” privada de serviços de tratamento de saúde, incluindo medicamentos essenciais.
Em março desse ano, Mohammadi foi libertada para ser submetida a uma cirurgia cardíaca, mas teve de regressar à prisão de Qarchak logo após, para cumprir o resto da pena.
Taghi Rahmani, activista político e marido de Narges Mohammadi, relatou à Rádio Farda, que a sua mulher precisava de mais tempo de recuperação, salientando a opinião dos médicos que defendiam um “período de recuperação mais longo”, antes de regressar à prisão.
De acordo com Rahmani, a sua mulher viria a sofrer outras doenças, como paralisia e espasmos musculares, enquanto estava presa. “Doenças que não sofria antes”, declara o ativista político, acrescentando que a paragem cardíaca que a levou ao hospital foi “uma doença imposta”. A ativista não vê há oito anos os filhos, que estão em Paris com o pai, e passou longos períodos em confinamento solitário
A vaga de protestos desencadeada pela morte de Mahsa Amini, no ano passado, tornou-se conhecida pelas mulheres feitas prisioneiras políticas detidas na célebre prisão de Evin, em Teerão. Mais uma vez, Mohammadi assumiu a liderança. Desde a prisão, manifestou o seu apoio aos manifestantes e organizou acções de solidariedade entre os seus companheiros de prisão. As autoridades prisionais responderam, proibindo Mohammadi de receber telefonemas e visitas.
No entanto, a ativista conseguiu passar clandestinamente um artigo que o New York Times publicou no dia do aniversário de um ano da morte de Mahsa Amini. A mensagem era a seguinte:
"Quantos mais de nós forem presas, mais fortes nos tornamos."
Narges Mohammadi, 54 anos, autora do livro "Tortura Branca" apreendido pelos serviços de segurança iranianos por conter uma série de conversas entre a autora e 12 mulheres presas políticas, como Atna Daemi, Nazanin Zaghari, Reihaneh Tabatabai, Hengameh Shahidi, Shokoofeh Yadolahi e outras que foram encarceradas em prisões iranianas, recebeu o Prémio Nobel da Paz 2023.
Presa pelo regime de Teerão 13 vezes e condenada cinco vezes, Mohammadi cumpre uma sentença acumulada de 31 anos de prisão e 154 chicotadas, a última das quais é de 16 anos.
“O comité do Nobel espera que o Irão liberte a ativista iraniana de direitos humanos para receber o seu prémio em dezembro”, disse ainda a presidente do comité, sublinhando que essa será “a decisão certa”.
Mas, a avaliar pela reação do governo do Irão, que condenou hoje a atribuição do Nobel da Paz descrevendo a decisão "como um ato político" e uma forma de pressão do Ocidente, tal não deverá acontecer.
*com Radio Farda e Lusa
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