A 28.ª Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (COP28), começa na próxima quinta-feira no Dubai e vai prolongar-se até 12 de dezembro. à semelhança da cimeira do ano passado, em Sharm el-Sheik, no Egito, a COP28 não é das que mais expectativas está a criar, com alguns setores a olharem com desconfiança a ambição climática dos Emirados Árabes Unidos e do presidente indigitado da conferência, o empresário dos petróleos e ministro da Indústria, Sultan Al Jaber.
A COP é a Conferência das Partes (países) da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas e é o órgão supremo da tomada de decisões dessa Convenção da ONU.
Além de dirigentes, a cimeira vai juntar dezenas de milhares de participantes, entre representantes de governos, empresas ou organizações da sociedade civil.
É a primeira após o Acordo de Paris em que se faz um balanço global da situação no mundo em termos de mitigação das alterações climáticas. Na COP21 em Paris, em dezembro de 2015, surgiu o chamado Acordo de Paris, no qual a quase totalidade dos países do mundo se comprometeram a limitar o aumento da temperatura média global a dois graus celsius (2ºC) acima dos valores da época pré-industrial, e de preferência não ultrapassar 1,5ºC. Está provado que a temperatura no planeta tem vindo a aumentar e que tal se deve em grande parte à ação humana. O acordo prevê um mecanismo de compensação de emissões, o mercado de carbono. E prevê que cada país apresente as suas contribuições para baixar as emissões.
A redução de de emissões de gases com efeito de estufa (GEE) é o grande objetivo das reuniões da ONU, onde ganha também cada vez mais espaço a discussão sobre adaptação às alterações climáticas, que estão a acontecer e que são especialmente provocadas pela ação humana, nomeadamente pela queima de combustíveis fósseis, que provoca a emissão de gases como o dióxido de carbono (CO2).
Da reunião do Dubai são esperados avanços nestas áreas, mas também o concluir do mecanismo de “perdas e danos”, aprovado na cimeira do ano passado no Egito mas ainda não operacional. Nem consensual ainda. É um apoio que os países mais pobres pedem para fazer face aos prejuízos provocados pelas alterações climáticas, provocadas essencialmente pelos países ricos.
São questões aparentemente fáceis mas sobre as quais não há consenso. Há mais de uma década que os países pobres pedem um apoio, estimado em 100 mil milhões de dólares anuais, para a transição para um mundo com menos emissões de GEE. Nunca foi atingido esse valor.
Mas o mais difícil tem sido a redução das emissões de GEE, que contra os apelos da comunidade científica e dos alertas constantes têm vindo a aumentar todos os anos, o que já levou a ONU a afirmar que o mundo continua a ir por um caminho errado.
Segundo um relatório da ONU, com os atuais compromissos de redução de GEE haverá até 2030 uma redução de 2% nas emissões (em relação a 2019) em vez de 43%, o valor recomendado para limitar o aquecimento global a 1,5 graus celsius (°C) acima dos valores médios da era pré-industrial.
A temperatura global já subiu desde essa época pelo menos 1,1 °C e os efeitos já se fazem sentir com eventos climáticos extremos, que segundo o Programa Alimentar Mundial (PAM) da ONU, num relatório de há uma semana, empurraram 56,8 milhões de pessoas para uma “grave insegurança alimentar” só em 2022.
Especialistas alertaram também num relatório publicado na revista Lancet há poucos dias que as mortes relacionadas com o calor deverão aumentar 370% até 2050.
Acordo final no Dubai será “uma tarefa árdua”
Ainda assim, como disse há poucos dias o Comissário Europeu para o Clima, Wopke Hoekstra, um acordo final no Dubai será “uma tarefa árdua”, alertando também para o aumento de produção de eletricidade a partir do carvão por parte nomeadamente da China. Na COP26, em Glasgow em 2021, os países concordaram em reduzir progressivamente a produção de eletricidade a partir do carvão, o único progresso em 30 anos sobre o fim dos combustíveis fósseis.
Wopke Hoekstra, que anunciou que a UE está a preparar uma contribuição financeira substancial para o fundo de perdas e danos, também já salientou a importância de sair da COP28 uma exigência de eliminação progressiva dos combustíveis fósseis, até porque a oportunidade para travar o aquecimento global está a terminar.
Este mês, uma coligação internacional de mais de 100 organizações não-governamentais apelou para uma decisão formal e não compromissos voluntários sobre a eliminação progressiva de combustíveis fósseis.
Outros dois temas que deverão estar em destaque na COP28 serão o combate às emissões de metano, e outros GEE que não o CO2, e o aumento da produção de energia nuclear, uma proposta liderada pela França.
Mas nas quase duas semanas de reuniões serão também debatidos temas relacionados com a saúde, a água, o hidrogénio, as cidades, transportes, uso da terra ou agricultura e alimentação.
Uma cimeira do clima presidida pelo presidente da companhia petrolífera nacional dos Emirados Árabes Unidos e com a presença do Papa Francisco
Muitas organizações não-governamentais têm manifestado dúvidas sobre o sucesso da COP28, desde logo por ser presidida por Sultan Al Jaber, presidente da companhia petrolífera nacional dos Emirados Árabes Unidos e ministro da Indústria.
Um relatório divulgado este mês indicava que os 20 países mais industrializados (G20) mais do que duplicaram o apoio aos combustíveis fósseis no ano passado, com os principais produtores de petróleo, gás e carvão a prepararem a expansão da produção, ainda que a maioria se tenha comprometido em alcançar a neutralidade carbónica em meados do século.
Em 21 de novembro o Parlamento Europeu pediu o fim das ajudas aos combustíveis fósseis o mais rápido possível e no máximo até 2025, e que os objetivos de triplicar a capacidade de energia renovável e duplicar a eficiência energética em 2030 façam parte da posição europeia na COP28.
Sem metas para anunciar mas com a força da sua presença o Papa Francisco anunciou que participará na COP28, a primeira vez que um Papa está numa cimeira do clima, um tema ao qual dedicou uma encíclica, “Laudato si”. Mais recentemente, no texto “Laudate Deum” apela às grandes potencias para que abandonem os combustíveis fósseis.
Este mês, cerca de 30 líderes religiosos de todo o mundo assinaram uma declaração inter-religiosa pedindo medidas concretas sobre a crise climática. Mas, ao invés dessa direção, o plano dos governos de todo o mundo é produzir em 2030 mais do dobro do máximo de combustíveis fósseis que permitiriam manter as temperaturas abaixo do limite de 1,5ºC.
Enquanto isso o mundo caminha para mais um recorde, com 2023 a ser, “quase de certeza” o ano mais quente de sempre, depois de, em comparação homóloga, os últimos cinco meses terem sido os mais quentes alguma vez registados, segundo o observatório europeu Copernicus.
Desde a última COP, em Sharm-el-Sheik, o mundo conheceu novos recordes de temperatura (os últimos meses foram os mais quentes de sempre), conheceu eventos climáticos extremos, que provocaram milhares de mortes, e novos avisos da ONU, sempre a dizer o mesmo, que o mundo caminha na direção errada.
No ano passado por esta altura anunciava-se que em 2021 as emissões de dióxido de carbono atingiram novos recordes. Este ano, na semana passada, a ONU anunciava novos recordes em 2022, e dizia que se não se mudar a direção o planeta pode atingir um aquecimento de três graus celsius (ºC) acima dos valores médios em relação à época pré-industrial.
Os grandes temas
- Aquecimento Global
O aquecimento global designa o aumento da temperatura sentido no planeta, seja na atmosfera seja nos oceanos, devido à atividade humana, especialmente pela queima de combustíveis fósseis. Substituir os combustíveis fósseis por energia limpa, como a eólica ou solar, diminui substancialmente a emissão de GEE, que têm mais de 2.000 variantes. O dióxido de carbono (CO2) é o mais conhecido, mas são GEE outros como os óxidos de nitrogénio, o ozono, o metano ou os clorofluorcarbonetos
Muitos países, entre eles Portugal, já anunciaram medidas de transição e eficiência energética para as próximas décadas.
O aquecimento global provoca o degelo das calotes polares, a subida do nível do mar, a acidificação dos oceanos, a destruição de ecossistemas e a diminuição e extinção de espécies, e provoca fenómenos meteorológicos extremos cada vez mais intensos e frequentes.
2. Redução de emissões
As emissões de GEE, nomeadamente de CO2, em consequência da ação humana têm vindo a aumentar apesar das provas científicas de que provocam o aquecimento do planeta. Na última década as emissões aumentaram 20%.
No passado dia 15 a Organização Meteorológica Mundial (OMM) anunciou que a concentração de GEE atingiu um novo recorde em 2022. Pela primeira vez as concentrações de CO2 foram 50% mais elevadas do que na época pré-industrial e continuaram a aumentar este ano.
Com estes valores as temperaturas irão aumentar muito acima dos 1,5 ºC, diz a OMM, que alerta para fenómenos meteorológicos mais extremos, degelo, subida e acidificação dos oceanos.
Segundo a ONU, era preciso que as emissões baixassem 7,6% ao ano entre 2020 e 2030 para se conseguir um aumento de temperaturas que não ultrapasse os 1,5 ºC.
Mas as previsões indicam que em 2030 os países estão a produzir mais do dobro do valor de combustíveis fósseis que deviam para atingir esse objetivo.
A ONU alertou que há um milhão de espécies de animais de plantas em ameaça de extinção, pela ação do Homem.
3. Assistência a países pobres
Em 2009, os países mais desenvolvidos prometeram trabalhar para angariar 100 mil milhões de dólares por ano, até 2020, para ajudar os países mais pobres a enfrentarem as alterações climáticas. Essa meta nunca foi atingida.
Nas últimas cimeiras do clima, de Katowice, na Polónia, a Sharm-el-Sheik, no Egito, passando por Madrid ou por Glasgow, a questão do financiamento tem sido referida mas nunca concretizada.
No Egito voltou a ser prometida uma assistência de 100 mil milhões de dólares para os países mais pobre enfrentarem o aquecimento global mas a promessa não foi cumprida. E decidiu-se criar um fundo para perdas e danos. Esse fundo devia ser operacionalizado na COP28 mas ainda não há um acordo.
O que vai ser discutido
A COP28 é a primeira após o Acordo de Paris em que os países fazem um balanço global das reduções de emissões de GEE, previsto no Acordo de Paris.
Embora não seja ano de revisão das contribuições nacionais a COP é sempre um momento de alguns países anunciarem novas metas, especialmente de redução da produção de energia a partir de combustíveis fósseis.
A adaptação às alterações climáticas, que já existem e que vão continuar mesmo com uma redução da emissão de gases com efeito de estufa, será outro dos temas em debate. As COP pretendem sempre levar os países a aumentar a proteção e restauro de ecossistemas, e a tornar mais resistentes a essas alterações seja infraestruturas (como as casas) seja a produção agrícola.
A COP28 vai também insistir na necessidade de serem cumpridas as promessas de mobilizar anualmente 100 mil milhões de dólares, para ajudar os países pobres no combate e adaptação às alterações climáticas.
O presidente da COP28 já disse que é preciso duplicar o financiamento da adaptação até 2025. E vai debater um plano para diminuir as emissões de metano e o eventual aumento da energia nuclear.
Os protagonistas da COP28
Os grandes emissores de gases com efeito de estufa, como a China, a Índia, a União Europeia e os Estados Unidos, são sempre protagonistas, com o são os pequenos estados insulares, como as Maldivas, Samoa, as Ilhas Salomão, Kiribati e Vanuatu, que correm o risco de desaparecer com a subida do nível do mar.
Na COP28 outro dos protagonistas será o presidente indigitado da cimeira da ONU, Sultan Al Jaber, um empresário do setor dos hidrocarbonetos, ministro da Indústria dos Emirados Árabes Unido, que abre a COP às empresas e pede aos países mais ricos para que impulsionem a ação climática, porque muitos indicadores estão a ir na direção errada.
Os jovens e os povos indígenas e as centenas de empresas privadas serão também protagonistas. E será protagonista o Papa Francisco, o primeiro Papa a participar numa cimeira do clima.
Como decorre a COP28
A cimeira do clima decorre em dois locais - a zona azul e a zona verde. Na primeira estarão os participantes acreditados para a cimeira, como meios de comunicação social, membros das delegações dos diversos países ou elementos da ONU. É onde decorrem as negociações e reuniões, os eventos da presidência e centenas de eventos paralelos. A zona verde é aberta ao público em geral, empresas e associações e é onde decorrem eventos paralelos, como ‘workshops’, exposições e atividades culturais.
A cimeira terá sete centros temáticos e mais de 300 palestras sobre alterações climáticas e sustentabilidade.
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