Terminada a sua intervenção na quarta Conferência Nacional do PCP, que decorre no pavilhão do Alto do Moinho, no Seixal, distrito de Setúbal, Jerónimo de Sousa deslocou-se para junto dos seus ‘camaradas’ e foi fortemente aplaudido pelos delegados presentes.
A Conferência Nacional do PCP, a quarta em 100 anos, foi organizada com o objetivo de reenquadrar a ação do partido em contexto de maioria absoluta do PS, aumento da inflação e consequente degradação das condições de vida da generalidade da população, e também de incerteza em relação ao redesenho do mapa geopolítico internacional.
A maioria absoluta do PS
Jerónimo de Sousa acusou a governação de maioria absoluta de mostrar "um PS cada vez mais inclinado para a direita" e considerou que os socialistas, PSD, CDS e IL e Chega encenam e empolam divergências.
“Hoje está muito claro qual é o sentido da governação do PS maioritário e quão verdadeira era a palavra do PCP quando afirmava que o PS não queria resolver os problemas nacionais, mas tão só romper com a política de defesa, reposição e conquista de direitos e criar condições para retomar na plenitude a política de direita que sempre teve como sua”, acusou Jerónimo de Sousa, na abertura dos trabalhos da Conferência Nacional do PCP, em Corroios, concelho do Seixal.
Para Jerónimo de Sousa, a governação socialista "mostra um PS cada vez mais inclinado para a direita", ao fazer opções de política económica e orçamental que conduzirão ao "perigo de uma nova fase de definhamento económico e e degradação social".
“As recentes alterações do quadro político”, continuou o líder cessante do PCP, vão “replicar, senão aprofundar a evolução negativa do país que décadas de política de direita impuseram”.
E a maioria absoluta que António Costa alcançou nas eleições legislativas de janeiro só foi alcançada com uma “operação de chantagem e mistificação”.
As "forças reacionárias" e o anticomunismo
Segundo o secretário-geral comunista, a alteração no quadro político decorrente das eleições traduziu uma "ampla promoção" das forças reacionárias num quadro em que PS e os partidos de direita "empolam e encenam" uma oposição entre si quando na verdade tem uma "ação convergente" em aspetos essenciais.
Jerónimo de Sousa mostrou-se preocupado com "a nova situação da expressão institucional e ampla promoção das forças e projetos reacionários, designadamente PSD, CDS, IL e Chega, com agendas de natureza retrógrada, demagógica, neoliberal ou fascizante”.
O dirigente comunista alertou para uma “intensificação da campanha antidemocrática, de forte pendor anticomunista, que tende a recrudescer”, na qual “sobressai a ação revanchista do grande capital, que julga ter chegado o momento de subir o nível de confrontação de classe e levar mais longe o ajuste de contas com os valores e as conquistas de Abril”.
“Evidente nos mais recentes desenvolvimentos é o explícito e crescente confronto com a Constituição da República por parte das forças reacionárias, com o objetivo da sua revisão e subversão, a par da promoção de alterações de sentido antidemocrático às leis eleitorais e à legislação laboral. O início do processo de revisão constitucional agora avançado e a olhar para a experiência passada de concertação entre o PS e o conjunto das forças reacionárias, inimigas da Constituição de Abril, não nos pode deixar descansados”, avisou.
A palavra aos militantes
O secretário-geral cessante do PCP, Jerónimo de Sousa, reconheceu que o partido tem dificuldades e insuficiências que “importa superar” e apelou à resistência dos comunistas contra a “brutal ofensiva” em curso.
“Sabemos dos impactos negativos nos planos eleitorais, de expressão institucional, das nossas dificuldades, das nossas insuficiências e atrasos que estão identificados e importa superar”, disse Jerónimo de Sousa, na abertura dos trabalhos da Conferência Nacional do PCP, em Corroios, concelho do Seixal.
Numa parta da intervenção virada para dentro, o líder cessante, que hoje fez a sua última intervenção, reconheceu que “o caminho é duro”.
“Sabemos quanto pesa a brutal ofensiva que se desenvolve contra o PCP, porque é o que é e não abdica de o ser, com os interesses de classe que assume, os objetivos por que luta e o projeto transformador de emancipação social de que é portador”, completou.
Ao longo dos últimos anos, continuou Jerónimo de Sousa, o PCP foi alvo de “campanhas de deturpação das suas posições, das calúnias e das tentativas de chantagem”, assim como de tentativas de “condicionamento e silenciamento”, em resultado da “sua corajosa intervenção”.
Jerónimo de Sousa apontou o dedo à “classe dominante, os senhores do mando no país”, que perante esta “ofensiva” queria que o PCP tivesse “abdicado de princípios e objetivos, se submetesse à sua agenda” e 'fechasse os olhos' às “opções de classe do PS, os projetos das forças reacionárias, a natureza da NATO, a guerra e as sanções”.
O caderno de encargos para a sucessão
E continuando a falar para dentro, o secretário-geral cessante descansou os militantes que receavam uma mudança de rumo do PCP e falou para a "classe dominante": “Enganaram-se e vão continuar enganados!”
“Sabemos igualmente que a ação do Partido, as condições de intervenção e luta resultam não apenas das decisões e opções próprias, mas também da ação dos seus adversários e do quadro mais geral – nacional e internacional – em que intervém”, completou.
Entre o "caderno de encargos que Jerónimo deixou ao seu sucessor, no plano da organização interna, está o desenvolvimento da ligação e do trabalho com outros democratas e patriotas" "seja no âmbito da CDU seja num plano mais largo" assumindo a realização de contactos regulares a partir de cada uma das organizações com aqueles que se destacam na vida coletiva".
O PCP terá como tarefas prioritárias, disse, aumentar a responsabilização e formação de quadros, novos mil quadros até final de 2024, reforçar as estruturas de direção e recrutar e integrar novos militantes. Ainda a nível interno, estabeleceu o objetivo de uma "grande ação nacional" para criar mais "células" nos locais de trabalho, para além das 100 que, disse, foram criadas recentemente.
O fortalecimento das organizações e "movimentos de massas", a "sindicalização e a organização sindical nas empresas, os sindicatos, a CGTP-IN e as comissões de trabalhadores" são outras linhas de ação do PCP nos próximos tempos.
A defesa da juventude, dos direitos dos trabalhadores, da valorização das reformas, da produção nacional, o direito à habitação, e a promoção e o aumento geral dos salários, à cabeça, são as prioridades de intervenção política do PCP, inscritas na Resolução que a Conferência aprovará e que Jerónimo de Sousa elencou.
Os ventos que sopram
Jerónimo de Sousa sustentou hoje, na despedida enquanto secretário-geral do PCP, que o “vento está duro e muito forte”, mas os comunistas vão enfrentá-lo “sempre virados para a frente”.
Na última intervenção que fez enquanto secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa não fugiu muitas vezes ao guião, mas acabou com um improviso: “O vento está duro e muito forte, fustiga-nos o rosto, mas nunca hão de ver-nos levar com ele de costas, porque estaremos sempre virados para a frente, em todo o nosso projeto, do nosso ideal, do nosso partido!”
Na abertura dos trabalhos, Jerónimo de Sousa falou de passar “o testemunho”, que vai acontecer hoje à noite quando o Comité Central votar o nome de Paulo Raimundo para seu sucessor.
“Aqui estamos, transportando o testemunho que gerações de comunistas nos legaram e que as atuais e novas gerações conduzirão com a mesma confiança na justeza da nossa luta e do nosso Partido em demanda da sociedade nova”, referiu, arrancando fortes aplausos dos delegados e militantes que preenchem o pavilhão do Alto do Moinho.
E finalizou com entusiasmo e fitando os “camaradas” que o escutavam: “Viva o partido comunista! Viva o partido comunista português”.
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