O alerta foi deixado num artigo publicado hoje no ‘site’ “Project Syndicate” pelo ex-presidente da Comissão Europeia e antigo primeiro-ministro português, que lidera agora a Aliança Global das Vacinas (GAVI).

“Para evitar que a história se repita, a nossa preparação deve refletir a verdadeira extensão do problema. Temos de reconhecer que as pandemias representam agora uma das maiores — e mais prováveis — ameaças à segurança global”, escreve Durão Barroso.

No artigo intitulado “O teste de preparação para a pandemia”, o responsável compara a atual crise pandémica à proliferação nuclear, ao terrorismo e às alterações climáticas no seu impacto à estabilidade social e ao bem-estar económico.

Referindo que anteriormente as doenças infecciosas não constavam sequer da agenda da segurança global, Durão Barroso defende que a covid-19 não só mudou isso, como demonstrou também a urgência de medidas globais para a prevenir futuras pandemias, ao mesmo nível de outras ameaças à segurança, mas com alguma especificidade.

Como exemplo, referiu a crise financeira de 2008 e a crise climática: “O denominador comum em cada caso é que a crise exige soluções que nenhum governo individual consegue dar sozinho”.

“Uma doença infecciosa não pode ser combatida com contramedidas de segurança habituais, como sanções económicas, o recurso à diplomacia bilateral ou uma postura militar. Exige a colaboração científica, sistemas de saúde resilientes e investimentos de longo prazo nas redes de saúde globais”, defendeu, acrescentando a necessidade de colaboração global, multilateralismo estratégico e compaixão transnacional.

Estas recomendações, porém, não são apenas para o futuro, uma vez que a pandemia de covid-19 ainda não foi ultrapassada. E Durão Barroso responsabiliza, sobretudo, a falta de uma resposta global coordenada.

“Em vez de encontrarem formas de trabalhar em conjunto com vista a soluções comuns para responder a uma crise sem precedentes, os principais governos continuam a colocar os seus interesses nacionais à frente, às custas da resposta global de que precisamos”, acusou.

Como exceção a essa regra, Durão Barroso referiu como bom exemplo a iniciativa Covax, criada em 2020 com o objetivo de assegurar ao acesso global às vacinas da covid-19, e coliderada pela própria GAVI, pela Organização Mundial da Saúde e pela Coligação para a Inovação na Preparação para Epidemias.

“Ao assegurar o igual acesso às vacinas das pessoas nos países mais pobres, o Covax ajuda não só a salvar milhões de vidas, mas também oferece o melhor caminho para a recuperação”, defende o presidente da GAVI.

De acordo com números citados no artigo, todos os meses são produzidas mais de 1,5 mil milhões de vacinas e prevê-se que, até ao final do ano, venham a ser produzidas mais de 12 mil milhões.

“É um feito surpreendente”, reconhece Durão Barroso, que ressalva que, ainda assim, não é suficiente para vacinar todos os adultos do planeta. E acrescentou: “Ainda estamos longe desse objetivo, porque a distribuição é tão desigual”.

Partindo do problema do acesso às vacinas, Durão Barroso reiterou que os países desenvolvidos, e em particular os membros do G20, têm o poder para liderar o caminho em direção ao fim da pandemia da covid-19 se promoverem a distribuição de vacinas aos países mais pobres.

A medida é urgente, acrescentou, admitindo que é, contudo, um “penso rápido” para resolver uma crise dentro de outra crise.

“Para evitar a repetição da covid-19, precisamos de mecanismos mais dispendiosos de preparação para pandemias, construídos em torno de um modelo de recursos globalizados. Não podemos esperar que o próximo surto se torne uma ameaça à segurança global. Por essa altura, será demasiado tarde”, concluiu.