De acordo com os dados para 2018 do “Observatório da Discriminação contra as Pessoas LGBTI+”, a que a Lusa teve acesso, houve 186 denúncias feitas no ano passado, menos duas do que em 2017, das quais quase um terço são crimes motivados pelo ódio contra estas pessoas.
Segundo os dados da ILGA, houve registo de 59 situações configuradas como crime, entre as quais violência física extrema, ameaças, agressões e violência psicológica, além de outros 74 casos que se perceberam ser incidentes discriminatório, nomeadamente casos de discursos de ódio.
Especificamente em relação aos 59 casos de crime, a ILGA identificou um caso de homicídio, oito de violência física extrema, quatro de violência sexual, outras quatro agressões, bem como três denuncias por dano de propriedade e 44 casos de situações de ameaça ou violência psicológica.
O caso do homicídio aconteceu “num cenário de crime passional entre duas pessoas do mesmo sexo”, tendo existido “fortes evidências de motivação homofóbica por trás do ato criminoso”, lê-se no relatório.
Foram também identificadas mais 74 situações que configuram como incidentes discriminatórios motivados pelo ódio contra pessoas LGBTI, nos quais se incluem 27 casos de discursos de ódio, mais 17 do que em 2017, estando em causa textos de opinião, insultos ou outras manifestações de desprezo contra a comunidade.
Em declarações à agência Lusa, o responsável pelo relatório frisou que em 2018 foi visível o aumento do número de denúncias feitas pelas próprias vítimas, o que pode apontar para uma maior consciência da realidade da discriminação.
De acordo com Telmo Fernandes, há, atualmente, uma maior consciência dos direitos, depois de um período de “obscurantismo” em relação a estas questões e à violência de que eram alvo as pessoas LGBTI, sublinhando que a divulgação destes dados é feita precisamente no dia em que se comemoram os 50 anos da marcha de Stonewall, nos Estados Unidos.
“De facto muita coisa mudou e uma dessas mudanças mais assinalável é essa tomada de consciência por parte das próprias pessoas visadas e alvo dessa discriminação (…), mas o facto de o número de denúncias não ter aumentado ainda parece indicar, no nosso entender, que ainda há muito trabalho a ser feito”, defendeu.
Acrescentou que a ILGA olha para estes números como a “ponta do icebergue” e de uma “realidade que está, em grande medida, por ser tornada pública e visível”.
“Há muitas situações que não chegam à luz do dia, que não chegam a ser denunciadas às organizações da sociedade civil e a percentagem dessas situações que depois chegam de facto às entidades responsáveis e forças de autoridade é diminuta”, destacou.
Os números do Observatório revelam que em apenas 13,75% dos casos denunciados, as vítimas optaram por fazer queixas às autoridades, o que representa uma quebra em relação aos 29,13% de 2017.
“Essa ausência [de queixas] resulta da consciência de que as pessoas não vivem em ambientes seguros e há uma expectativa de discriminação por parte dos serviços, que muitas vezes não é contrariada”, justificou Telmo Fernandes.
Nesse sentido, defendeu que é preciso envolver todos os agentes sociais na definição de medidas concretas e que todos os serviços, e especificamente as forças de segurança, invistam em formação e façam campanha para contrariar a expectativa de que as denúncias vão ser desvalorizadas.
Questionado sobre a sociedade portuguesa é homofóbica, o responsável da ILGA recusou fazer generalizações e defendeu que tem havido muitas mudanças, que se têm traduzido numa nova mentalidade por parte das gerações mais novas, que encaram a liberdade e a igualdade como valores inquestionáveis.
Ainda assim, Telmo Fernandes admitiu que a homofobia e transfobia ainda existe, nomeadamente nas escolas e que, por isso, é preciso um trabalho permanente e transversal em áreas como a educação e a formação.
“Isso já está a acontecer, mas temos ainda um longo caminho a percorrer para que aquilo que é o nosso enquadramento legal se reflita no quotidiano das pessoas”, rematou.
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