Elon Musk, criador de várias empresas tecnológicas, acredita que o ser humano pode estar a viver num ambiente de videojogo, numa criação virtual que pouco se diferencia do que entendemos por realidade "real". Musk está entre as 70 pessoas mais ricas dos EUA, sendo fundador, CEO e CTO da SpaceX (colonização de Marte e viagens a alta velocidade no sistema Hyperloop), co-fundador, CEO e responsável de produto da Tesla Motors (carros eléctricos); co-fundador e presidente da SolarCity, co-presidente da OpenAI (desenvolvimento de inteligência artificial benéfica para a humanidade); co-fundador da Zip2 - comprada pela Compaq em 1999, numa operação que o tornou multimilionário e lhe permitiu lançar a empresa de pagamentos online PayPal, adquirida em 2002 pela eBay.
O argumento de Musk é o de uma sociedade recente, olhando para os videojogos e outras tecnologias. Diz, para sustentar a sua posição: há 40 anos, tivemos o jogo Pong, mas actualmente "temos simulações foto-realistas, em 3D, com milhões de pessoas a jogar ao mesmo tempo, e está a ficar melhor a cada ano. Em breve, teremos a realidade virtual, a realidade aumentada". Perante estes avanços tecnológicos, e assumindo que a qualidade gráfica dos jogos se vai tornar indistinguível da realidade, e avançando para o futuro ("10 mil anos no futuro não é nada na escala da evolução" humana, diz Musk), porque não considerar este cenário? "Diga-me o que está errado neste argumento", questiona, "existe alguma falha nesta argumentação?"
O tema já foi retratado em filmes como "They Live", de John Carpenter em 1988, ou nos três episódios da série Matrix, dos irmãos Wachowski, lançados entre 1999 e 2003. Neles, o ser humano vive num cenário criado por entidades externas (ou extraterrestres), que o conduzem a uma existência de escravo laboral sem se dar conta disso. Segundo Kevin Kelly, "o primeiro a colocar no papel a ideia ultrajante de um computador de todo o universo foi o escritor de ficção científica Isaac Asimov.
No seu pequeno conto "The Last Question", em 2061, "o ser humano cria um computador inteligente o suficiente para lançar novos computadores mais inteligentes". Em cada uma das fases de desenvolvimento, os seres humanos perguntam à máquina "se sabe como reverter a entropia". E, de cada vez, ela responde: "dados insuficientes para uma resposta significativa". E a "história termina quando as mentes humanas se fundem na mente do computador, que agrega toda a massa e energia do universo. Depois, o computador universal descobre como reverter a entropia e criar um universo".
Escravos das máquinas
Esse universo está criado e existem pelo menos 16 sinais de como somos "escravos da Matrix", exista ela ou não, segundo um artigo da Waking Times. Entre eles, contam o pagar impostos a pessoas que se querem ver na prisão, ir ao médico mas continuar doente, trabalhar muito para se receber pouco, assumir créditos para uma vida orientada ao consumo, viver para conversar com pessoas sobre o que se vê na televisão (com menor interesse local mas mais nacional, mais desporto ou outras "distrações sem sentido"), assumir que o governo torna a sociedade mais segura com mais armas, depender da sociedade farmacêutica para a gestão da vida mental ou na alimentação processada ("sinal de que a matrix o programou para dar menor valor à saúde e seu futuro do que à gratificação imediata").
Musk aparenta estar mais próximo de pensadores como Nick Bostrom que, em "Are You Living in a Computer Simulation?" apontava como hipótese que "quase de certeza vivemos numa simulação de computador", para demonstrar ser possível a crença de nos tornarmos "pós-humanos" com a "falsa" possibilidade de criar simulações de antepassados, "a menos que estejamos vivendo actualmente numa simulação".
Bostrom, professor da Oxford University, aponta a ficção científica e a crescente capacidade informática para sustentar as simulações futuras de que "nós" não seremos "seres biológicos originais" mas podemos ser "mentes simuladas". E, "portanto, se nós não pensamos que estamos a viver actualmente numa simulação de computador, não temos direito a acreditar que vamos ter descendentes que irão executar muitas dessas simulações dos seus antepassados". Para Bostrom, há uma hipótese de um número reduzido de pessoas viver numa simulação (muito perto de apenas uma). Mas se isso for verdade, "então quase de certeza vivemos numa simulação".
Em Novembro de 2013, um artigo na revista Discover colocava a mesma questão: "vivemos na Matrix"? A resposta era dada de uma forma bastante explícita: "tão fantasiosa quanto possa parecer, alguns filósofos têm sustentado que estamos realmente mais provavelmente como inteligências artificiais presas num universo falso do que como mentes orgânicas" no mundo real. No entanto, "se isso fosse verdade, as próprias leis da física que nos permitem conceber tal tecnologia de verificação da realidade podem ter pouco a ver com as regras fundamentais que regem o meta-universo habitado pelos nossos simuladores. Para nós, esses programadores seriam deuses, capazes de mudar a realidade por um capricho".
Criacionista, evolucionista ou trans-humanista?
Elon Musk não parece caber nesse discurso, que até pode ser visto como um apoio ao criacionismo. Ou seja, se vivemos numa realidade virtual, alguém a teve de conceber, um criador universal ou, de forma mais fácil, um deus. Perante o evolucionismo do século XIX e a publicação do livro "A Origem das Espécies", de Charles Darwin, o criacionismo aponta Deus como criador de todas as coisas. Em síntese, "será que a vida moderna na Terra evoluiu ao longo de milhões de anos ou foi criada num piscar de olhos por Deus?"
No livro "The Engineer - Follow Elon Musk on a journey from South Africa to Mars", o autor Erik Nordeus descreve como Musk deve ser pouco religioso e nunca rezou quando esteve quase a morrer devido à malária. Nordeus também nota que, quando questionado pela existência de uma "inteligência maior", Musk disse não acreditar, porque então teria de se questionar de "onde veio essa inteligência maior"?
Musk parece mais adepto dos trans-humanistas, "uma classe de filosofias de vida que procura a continuação e a aceleração da evolução da vida inteligente além das suas limitações de forma e limitações humanas actuais através da ciência e da tecnologia, guiada por princípios e valores de promoção da vida". Num apanhado das suas ideias, explica que "não se vê alguém com 90 anos de idade e que seja super-rápido mas a sua visão é má. Todo o sistema está a ser desligado. Para mudar isso de forma séria, é preciso reprogramar a genética ou substituir todas as células do corpo".
Se há uma realidade virtual em que o ser humano existe ao longo da sua vida, ela foi criada por alguém "num piscar de olhos" ou por uma evolução tecnológica? Há uma "metafísica da realidade virtual" em que vivemos?
Estamos mesmo numa realidade virtual? Uma resposta sobre a possibilidade de vivermos num universo virtual surgiu em 2001, quando se tentou calcular os recursos necessários para uma simulação desse tipo e o resultado pareceu "impossível".
Seth Lloyd, engenheiro de mecânica quântica no MIT, calculou o número de "operações em computador" que o "nosso universo realizou desde o Big Bang - basicamente, todos os eventos que já aconteceram. Repeti-los, e gerar uma cópia perfeita da realidade até ao último átomo, necessitaria de mais energia do que o universo tem". Seria preciso um computador "maior do que o universo", explicou Lloyd.
Quanto ao futuro, "podemos ser capazes de encaixar seres humanos nas nossas caixas de simulação dentro de um século", antecipa Silas Beane, físico nuclear da Universidade de Washington (Seattle).
A geração da realidade que conhecemos como simulação informática gera igualmente dúvidas sobre a qualidade tecnológica dos artefactos da mesma. Em 2007, John Barrow, da Cambridge University, apontou que uma "simulação de realidade imperfeita teria falhas detectáveis". De forma simplificada, seriam necessárias actualizações ao sistema operativo da realidade para ela continuar a funcionar sem problemas.
Já alguém fez "reset" à sua realidade?
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