Fernando Brito tinha mais de 70 anos quando a sua carpintaria ficou reduzida a cinzas. Ainda assim, nunca pensou em desistir, continuando a trabalhar afincadamente porque “as encomendas precisam de sair e o dinheiro de entrar”.
A Carpintaria Brito&Brito, localizada na Zona Industrial de Oliveira do Hospital, foi umas das muitas empresas que não escapou à fúria das chamas, no dia 15 de outubro de 2017, que consumiram toda uma vida de trabalho.
Na altura, Fernando Brito estava a passar o fim de semana em Lisboa e, mal soube que o incêndio se aproximava dos seus bens, decidiu regressar a Oliveira do Hospital.
Acabaria por conseguir chegar a Oliveira do Hospital apenas no dia seguinte, depois de ter ficado retido em Penacova, onde passou a noite, porque a polícia já não permitiu que seguisse viagem.
Durante a madrugada recebeu a chamada que confirmou que o seu pavilhão, “com boa maquinaria, matéria-prima e carros carregados de mercadoria”, tinha ardido. No total, o prejuízo rondava os dois milhões de euros.
“Quando cá cheguei encontrei uma desgraça… Mas logo nesse mesmo dia abracei-me à minha filha e disse-lhe que não íamos parar: tínhamos de reconstruir”, recordou.
Na altura, com 73 anos, arregaçou as mangas, candidatou-se às ajudas disponíveis, acionou os seguros e, com algum dinheiro que tinha amealhado, voltou a investir perto de três milhões de euros, na arte em que começou a trabalhar com 15 anos.
“Foi muito difícil recomeçar do zero, não tenha dúvidas de que foi ‘complicadito’! Mas nunca pensei em desistir”, assegurou.
Pouco depois do incêndio, a carpintaria voltou a trabalhar provisoriamente num pavilhão disponibilizado por um vizinho e, em abril de 2019, regressaram às instalações reerguidas no mesmo local.
Aos 78 anos, continua a trabalhar afincadamente para pagar “qualquer coisita” que ainda deve à banca, porque não é de ficar a dever nada a ninguém.
“Tenho vontade de trabalhar e, com esta idade, como vê, não paro. As encomendas precisam de sair e o dinheiro de entrar. Por isso, temos de trabalhar todos”, justificou.
A menos de 500 metros, também a J. Guerra, que fabrica sirgaria e passamanarias há mais de 50 anos, ficou reduzida a nada, em outubro de 2017.
“O prejuízo foi na ordem dos 15 milhões de euros, não aproveitámos absolutamente nada. Foi demolir as instalações à cota zero e voltar a reconstruir tudo”, referiu Paulo Guerra.
À agência Lusa, o sócio-gerente desta fábrica, que produz todo o tipo de fitas de cortinado, franjas ou galões, lembrou que três ou quatro meses depois do incêndio estavam a laborar em instalações provisórias, para “não perder o mercado e os clientes”.
“Só há cerca de um mês passámos para as novas instalações e foi um processo doloroso para todos. Reinvestimos com capital do nosso pai, que foi o fundador da empresa, para podermos recuperar o mais rápido possível e, só mais tarde, começámos a receber apoio do IAPMEI”, indicou.
De acordo com Paulo Guerra, a fábrica ainda precisa de um investimento na ordem de um milhão de euros, para recuperar a capacidade de produzirem artigos mais técnicos na parte das fitas.
“Temos o ‘handicap’ de não dar resposta a um nicho de mercado de produtos, em que ainda nos falta investir, mas que pretendemos repor assim que seja possível”, alegou.
O objetivo é continuar a crescer e recuperar a capacidade de produção, que atualmente ronda os 80%, comparativamente com 2017.
“Cá estamos, a continuar a nossa ‘guerra'”, gracejou.
A alguns quilómetros, em Vila Franca da Beira, a agência Lusa encontrou a queijeira Paula Lameiras, para quem, cinco anos depois, ainda é muito difícil recordar o dia em que perdeu a casa e o negócio da família.
“Não é fácil continuar-se depois disso. Ponderei muitas vezes desistir. Mas é uma tradição familiar, tínhamos investido muito em terrenos e é difícil virar as costas a tudo isto”, partilhou.
A reconstrução da queijaria demorou cerca de um ano e foi necessário procurar outro produtor de leite, depois do seu pai ter perdido todo o seu rebanho, e garantir novos pastos.
“Tivemos algum apoio financeiro para o projeto e foi preciso recorrer a empréstimos bancários, que tenho de pagar a 10 anos pela queijaria e a 15 anos pela casa. Ficámos com o futuro penhorado, se é que se pode dizer desta forma”, lamentou.
Atualmente, na renovada Queijaria Lameiras, produzem-se cerca de 20 queijos por dia, com muito sacrifício e força de vontade para vencer o desânimo trazido pelas contrariedades.
Ao incêndio seguiu-se a pandemia, a seca e a consequente escassez de pastagens.
“Apesar de tudo, este ano estou com mais ânimo, pois estou a vender mais ou menos o que se produz. Estou com muita esperança no futuro”, concluiu.
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