As leis sobre blasfémia no Paquistão violam as obrigações do país no campo dos direitos humanos e abrem caminho para outros abusos, incluindo ameaças de morte e execuções, considera a Amnistia Internacional (AI), na apresentação do caso de Shagufta Kausar e Shafqat Emmanuel.
Este casal de cristãos precisa de uma acção urgente dos defensores de direitos humanos, para que não se tornem “nas próximas vítimas destas leis injustas”. É isso que a Amnistia Internacional se propõe lançar e divulgar a partir da próxima quinta-feira, soube o 7MARGENS, mas o texto com toda a história foi já colocado na página da Amnistia Internacional-Portugal.
O caso conta-se rapidamente, de acordo com o resumo que dele faz a AI: em 2013, alguém comprou um cartão telefónico no Paquistão, registando-o em nome de Shagufta Kausar e instalando-o num telemóvel. Desse número, alguém enviou, ao imã de uma mesquita, várias mensagens insultuosas sobre o profeta Maomé.
Shagufta, em nome de quem foi feita a compra, e o seu marido garantem que não mandaram quaisquer mensagens. Alguém terá usado o documento de identidade de Shagufta, sem a sua autorização, para comprar o cartão SIM e, com ele, agir em seu nome – alegam ambos. Certo é que, à conta das mensagens, a mulher e o marido, Shafqat Emmanuel, foram acusados de “blasfémia”. Daí até à prisão e, em abril de 2014, à condenação à morte, foi um passo curto, apesar de continuarem a negar todas as acusações.
No Paquistão, o crime de blasfémia é punido com a morte, recorda a Amnistia – o que viola, aliás, as convenções internacionais segundo as quais a pena capital não deve abranger crimes que não implicaram a morte de alguém. “As condenações de Shagufta e Shafqat, ambos cristãos, são um claro exemplo dos perigos que as minorias religiosas enfrentam” naquele país, considera a Amnistia. E várias organizações de defesa de direitos humanos têm alegado que a lei em vigor é por vezes utilizada para vinganças pessoais, temendo os juízes serem vítimas de represálias se não impuserem condenações severas.
Um apelo pronto a assinar
Desde 2014, ambos os membros do casal aguardam a apreciação de um recurso que apresentaram. Esta chegou a estar prevista para abril de 2020, mas foi adiada por causa da pandemia. Já em 2021, nas duas últimas audiências, os juízes abandonaram a sala no momento em que iria ser analisado o recurso contra as condenações, alegando que o horário laboral tinha terminado, conta ainda a Amnistia.
Para Emmanuel, as últimas semanas agravaram a situação: a sua saúde deteriorou-se, tem as pernas paralisadas e, para se movimentar, precisa de ajuda dos guardas prisionais – “que nem sempre estão disponíveis”. De acordo com o advogado, Shafqat tem várias feridas que não estão a ser devidamente tratadas e as dores pioram diariamente. E a família conta que o acusado esteve três dias em coma em março, sem ter sido levado ao hospital.
A Amnistia considera que a condenação à morte por blasfémia “viola as obrigações do Paquistão em respeitar e proteger os direitos à vida, a liberdade de pensamento, consciência e religião ou crença, a liberdade de expressão ou até a igualdade de todas as pessoas perante a lei”.
Por isso, a organização tem pronto um apelo que pode ser assinado por qualquer pessoa interessada, pedindo a libertação imediata e incondicional do casal de cristãos e a revogação urgente da lei da blasfémia. A carta diz mesmo que todos os recursos foram negados ao casal, que deve ser libertado e colocado em segurança depois da libertação. “As leis sobre blasfémia no Paquistão vão continuar a colocar minorias religiosas em perigo e mais vidas em risco se não forem revogadas.”
No último relatório sobre a Liberdade Religiosa no Mundo, publicado na semana passada pela Ajuda à Igreja que Sofre, o Paquistão é colocado entre os 26 países com mais violações à liberdade religiosa, como o 7MARGENS referiu.
Ao mesmo tempo, o nacionalismo étnico-religioso do país é também apontado como factor que agrava a situação das minorias religiosas.
Um dos mais mediáticos casos de condenação à morte por blasfémia, no Paquistão, foi o de Asia Bibi, uma mulher cristã que foi libertada há dois anos e vive agora com a família no Canadá.
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