O estudo, com o nome "Aprendizagens perdidas devido à pandemia: Uma proposta de recuperação", recorda que "a evidência científica disponível" demonstra que as perdas de aprendizagens dos alunos foram "muito significativas" — em particular para "os mais jovens e de famílias mais desfavorecidas". Tal foi o resultado da interrupção do ensino presencial e da sua substituição pelo ensino à distância no primeiro ciclo durante três meses em 2020 e, até à data, cinco semanas em 2021.

Ao SAPO24, Pedro Freitas, investigador da Nova School of Business and Economics e um dos coautores do estudo, explica que o objetivo foi "encontrar duas medidas que tenham já sido testadas e adotadas noutros países anteriormente" pois já existe "uma série de diretrizes sobre como se pode aplicar e maximizar o seu impacto sobre os alunos".

A escolha dos investigadores — a equipa é completada por Bruno P. Carvalho, Susana Peralta e Ana Balcão Reis, também investigadores da Nova School of Business and Economics, e por Miguel Herdade, do Ambition Institute mas participando a título individual — recaiu nos programas de tutoria e escolas de verão, isto numa fase em que "ainda não foi tornado público nenhum plano de recuperação de aprendizagens" por parte do Governo.

O grupo é o mesmo que já tinha publicado um relatório no início de fevereiro a apontar para o agravamento das desigualdades entre crianças provocado pelo ensino à distância e os seus membros subscreveram a carta aberta a pedir ao Governo para reabrir as creches e escolas do país já perto do final desse mesmo mês.

No que diz respeito aos programas de tutoria, estes foram pensados em particular para as disciplinas de Português e Matemática — apesar de poderem ser aplicados a outras áreas — e estão destinados aos alunos do ensino básico, envolvendo "duas sessões semanais, integradas em horário escolar e em pequenos grupos de três a cinco alunos". Já as escolas de verão teriam "duração de quatro semanas" e incluiriam "atividades lúdicas e de recuperação de aprendizagens".

Segundo o estudo, ambas as medidas são "programas exequíveis e passíveis de serem implementados rapidamente", tendo como objetivo "desenhar uma política imediata, efetiva e temporária que permita recuperar as aprendizagens perdidas durante os anos letivos corrente e passado".

Medidas implicam investimento, mas custo de perder aprendizagens "é muito maior"

Os cálculos feitos pela equipa de investigadores estabelecem vários cenários consoante seja a disponibilidade que o Governo tenha para investir nestas medidas, assim como mediante o número de alunos que determine necessitado de recuperar aprendizagens.

Um dos critérios usado pelos investigadores foi "a média da percentagem de alunos que nas provas de aferição dos 2.º, 5.º e 8.º anos (para o 1.º, 2.º e 3.º ciclo, respetivamente), obtiveram a classificação de 'Não conseguiram' ou 'Não responderam' nos anos letivos 2016/2017 e 2017/2018", sendo estes os alunos que provavelmente têm tido "mais dificuldade em acompanhar o ensino a distância".

Tomando este valor como o "cenário base", o estudo cria ainda mais três cenários, cada um abrangendo mais alunos do que o anterior. Seguindo esta lógica, no caso das tutorias para Português, "estima-se que entre 125 e 380 mil alunos possam estar envolvidos" e, para Matemática, o número deverá variar "entre 273 e 528 mil".

O documento determina então quais os custos envolvidos consoante cada um dos cenários na contratação de tutores, recordando os autores que, caso se opte por grupos de três alunos, será necessário contratar mais profissionais do que se se optar por grupos de cinco estudantes.

Assim, em Português, caso seja preciso auxiliar 125 mil alunos, serão necessários cerca de três mil tutores para grupos de três alunos e perto de dois mil tutores para grupos de cinco, o que obrigaria a um investimento de 88 ou 53 milhões de euros, respetivamente. Já se for o cenário dos 380 mil alunos, o custo máximo variará entre os 267 e os 160 milhões de euros.

Quanto à matemática, seguindo o mesmo modelo, o número de alunos necessitados é maior, aumentando o custo da medida também. No cenário base, estando envolvidos 273 mil alunos, seriam precisos 7,5 mil tutores para grupos de três alunos e 4,5 mil tutores para grupos de cinco alunos, custando respetivamente 192 ou 115 milhões de euros. No pior cenário, sendo preciso ajudar 528 mil, os custos variam entre os 222 e os 370 milhões de euros.

Ao todo, os autores do estudo indicam que "os custos totais destes programas variam entre 168 e 639 milhões de euros", sendo que "os custos anuais por aluno e por disciplina são de 422 ou 704 euros, dependendo do tamanho dos grupos".

Já quanto às escolas de verão, "podem envolver entre 251 e 331 mil alunos do 1.º e 2.º ciclo, com um custo total de 42 a 55 milhões de euros e um custo por aluno de 166 euros", refere o documento.

No total, todo este investimento projetado pode abranger 3 a 10% do orçamento da educação em 2021, mas os autores do estudo defendem a necessidade de fazê-lo dados os riscos da inação. Segundo Pedro Freitas, foi feita uma "perspetiva de custos para o país, para saber quanto seria necessário investir, mas, mais do que isso, para saber se este investimento vale a pena".

Para tal, a equipa serviu-se das contas da OCDE, que projetam "uma perda entre os 2 e os 3% no rendimento ao longo da vida" para os alunos com aprendizagens em atraso. "Considerámos o ordenado mediano português [14 mil euros anuais] e que as pessoas têm uma carreira de 40 anos. Se pegarmos nos rendimentos que estes alunos vão ter no futuro e se tirarmos esta perda de 3% acumulada, ela é muito maior do que aquilo que vamos investir agora", avisou o investigador. 

Por isso é que as medidas defendidas no projeto "obviamente custam, são uma fatia importante do orçamento e isso é relevante, mas é investimento com um retorno futuro", continua Pedro Freitas.

A inação, conta o investigador ao SAPO24, tem várias consequências, a começar pela "incerteza", porque "nós sabemos que este impacto negativo existe, não temos é certeza da sua magnitude". "Não fazer nada é arriscar vir a ter um grande impacto em Portugal que ainda nem sequer medimos, mas que, quando tal acontecer, vamos assustar-nos", alerta.

Se não houver medidas concretas a serem tomadas agora, continua Pedro Freitas, "estes alunos vão perder aprendizagens, terão piores resultados escolares, pode haver mais abandono escolar — e tudo isso significa que temos uma população menos escolarizada e que vai chegar nessas condições ao mercado de trabalho". Haverá assim "uma geração que terá um nível de aprendizagens menor do que a anterior e que entrará no mercado de trabalho menos qualificada", o que "é um risco demasiado sério para se deixar passar", sublinha o investigador.

Para além disso, conforme menciona o estudo, esta situação poderá agravar um atraso que Portugal já sofria em relação à restante União Europeia, pois o nosso país é aquele com a maior percentagem de população sem educação secundária: 47,8% da população residente com idades entre os 25 e os 64 anos não concluiu o ensino secundário, mais do dobro da média da UE.

Dados precisam-se

Todo este plano, todavia, arquiteta-se num pressuposto que, referem os seu autores, ainda não foi cumprido por parte do Governo, já que "em Portugal não foram ainda disponibilizados dados que nos permitam aferir atrasos ou perdas de aprendizagens".

O reparo é feito numa fase em que se aguardam os resultados da "recolha efectuada pelo Ministério da Educação, durante o mês de janeiro de 2021, relativa ao fecho de escolas em 2020" e é revelado no mesmo dia em que o ministro Tiago Brandão Rodrigues anunciou que serão feitos testes de diagnóstico no final do ano letivo para avaliar efeitos do ensino à distância.

Para Pedro Freitas, ter estes dados disponíveis é fundamental para "identificar quem é que está pior", porque "quando pegarmos neste bolo orçamental, ele tem de ser distribuído para quem mais precisa, quais os alunos que mais perderam com a pandemia".

Além deste esforço inicial, será necessário manter o acompanhamento mesmo pós-pandemia. "Não basta aferir hoje, há aqui uma geração em que vão precisar de ir aferindo com alguma assiduidade para perceber se os investimentos que estamos a fazer estão a resultar ou não e para perceber se as aprendizagens estão a ser recuperadas", conclui.